domingo, 24 de novembro de 2013

Para saber!

Destaco parte de um comentário do leitor Fernando Caldeira pelo facto de ele recordar o "valor intrínseco" do conhecimento, o "valor em si" que o "conhecimento com valor" tem, o valor que não depende de nada mais por ser da ordem do absoluto. Esse valor que (quase) desapareceu do horizonte da investigação e da escola, tão preocupados estamos com o valor instrumental - com carácter social e, agora, sobretudo económico - do que se investiga e do que se ensina. O valor instrumental é fundamental, sim, mas não podemos, com a sua invocação justificável, negar, negligenciar ou, sequer, obscurecer o primeiro.

– Porque é que eu tenho de saber isso? – Foi uma pergunta que, como professor, ouvi centenas ou milhares de vezes. Sempre que isso acontecia lembrava-me desta passagem, que conhecia desde os meus 18 ou 19 anos, e apetecia invariavelmente responder:
– Para saber!..
"Triste por ver que não lhe ligavam nenhuma, o alcatraz soltou um doloroso gemido. Olívia lembrou-se de repente porque é que tinha subido ao passadiço e virou-se para o pobre ferido.
– Posso apanhá-lo capitão? – perguntou ela.
– Com certeza, se não tens medo que ele te morda! - disse o capitão.
– Mas os pássaros não mordem – disse Olívia.
– Ah! Ah! Ah! é que esse pássaro não é um pássaro vulgar.
– Então o que é? – perguntou Didi.
– Não sei – disse o capitão – o que prova claramente que não é um pássaro vulgar, porque esses conheço-os eu: temos a pega, a bugigansa, o escorvém, o paneiro de xadrêz, a moedura, o gaviãozito, o cardume, a abetarda e o cantropo, o verdete das praias, o marcha-a-olho e o sempre-em-concha; além destes, podemos citar a gaivota e a galinha vulgar, que eles chamam em latim cocota deconans.
– Bolas!... o capitão sabe imenso! – murmurou Didi.
– Foi para isso que aprendi – disse o capitão. (...)" 
Boris Vian, O Outono em Pequim. Tradução de Luísa Neto Jorge. Publicações D. Quixote (1989). 
Fernando Caldeira

NO AUGE DA CRISE

Por A. Galopim de Carvalho Julgo ser evidente que Portugal atravessa uma deplorável crise, não do foro económico, financeiro ou social, mas...