quarta-feira, 1 de junho de 2011

Abel Salazar e a Falência da Metafísica – 3


Continuação dos posts de António Mota de Aguiar sobre Abel Salazar:

Abel Salazar defendeu as suas ideias em vários jornais da época: A Ideia Livre, de Anadia (1928-1944), A Voz da Justiça, da Figueira da Foz (1904-1937), O Trabalho, de Viseu (1933-1940), O Diabo, de Lisboa (1934-1940), Sol Nascente, do Porto (1937-1940), Síntese, de Coimbra (1939-1941), Pensamento, do Porto (1930-1940), Vida Contemporânea, de Lisboa (1934-1936), A Foz do Guadiana, de Vila Real de Santo António (1935-1936), Democracia do Sul, de Évora (1907-1951), Cadernos da Juventude, de Coimbra (1937) Seara Nova, de Lisboa (1921-1979), A Esfera, do Rio de Janeiro (1938-1940), e outros.

Este grande leque de jornais dá conta do interesse que havia pela cultura na primeira metade do século XX e, mostra-nos a energia de um homem solitário defendendo a divulgação cultural e a renovação mental e moral da sociedade portuguesa, a golpe de artigos, por vezes contra tudo e contra todos, mesmo contra o lado que lhe era ideologicamente afim.

De 1935 até à sua morte, em 1946, Abel Salazar escreveu dezenas de artigos nos jornais mencionados, defendendo a microfísica (Bohr, Heisenberg, etc.), a relatividade einsteiniana e as geometrias não euclidianas, enfim os grandes pilares da revolução da física no século XX, suportes do empirismo na luta contra o idealismo.

Foi necessária uma enorme convicção na justeza das suas ideias para travar uma batalha tão desigual. Para isso, empenhou-se numa cruzada virulenta e implacável contra a metafísica e os seus sequazes, quer internos, como Leonardo Coimbra, quer externos, como Heidegger, Bergson, Driesch, e outros.

Abel Salazar bateu-se contra todos: em primeiro lugar contra os cerca de 75% de analfabetos existentes na sociedade portuguesa desta época. Esse vasto número de portugueses era, sem dúvida, o inimigo número um de quem queria passar uma mensagem, apoiada no empirismo lógico da Escola de Viena, aliás, de tão difícil apreensão.

No campo conservador, por exemplo, o jornal Acção de Águeda, em vários artigos, contestou Abel Salazar por este apresentar – dizia - os seus artigos de forma dogmática, não fundamentando a sua opinião em argumentos sólidos. Era, portanto, uma atitude desonesta servir-se do seu prestígio como professor universitário para fazer passar dados controversos, falando para pessoas que nunca tinham ouvido falar de metafísica, acrescentava o jornalista.

O autor destes artigos, perguntava-se quais seriam os objectivos de Abel Salazar fazendo a apologia da falência da metafísica? Teria objectivos políticos em vez de filosóficos, “uma intenção política, escondida e subjacente” ao afirmar “a impossibilidade do homem atingir o absoluto, Deus”? Perguntava se Abel Salazar não estaria a defender a via do materialismo histórico, fomentando ideias “anti-familiares, anti-nacionais e anti-religiosas”, sob a roupagem de um pretenso artigo de divulgação científica.

O Diário da Manhã, de Lisboa, chamou a Abel Salazar “malfeitor”, um “doente à procura de um psiquiatra” , um “filósofo destrambelhado. Quanto à Revista Católica, de Viseu, ela via nos artigos de Abel Salazar uma subversão política, nada mais nada menos do que uma divulgação do comunismo.

A Censura foi outro dos obstáculos que Abel Salazar também teve de enfrentar. O oficial censor considerava os seus artigos ofensivos do plano de morigeração; nalguns casos era cortada parte do texto, desfigurando-o, noutros, todo o texto era simplesmente eliminado.

Possivelmente, para Abel Salazar o mais duro foi a polémica que manteve com os intelectuais do mesmo lado político que o seu, pessoas como Adolfo Casais Monteiro (1908-1972), republicano, poeta, crítico e novelista, director, de 1931 a 1938, da prestigiada revista literária Presença (1927-1940). Professor de liceu no Porto, de onde era natural, afastado da carreira docente por razões políticas, teve de emigrar para o Brasil para ganhar a vida, já que o Estado Novo lhe fechara as portas à carreira docente.

Maior e mais grave foi a polémica com António Sérgio (1883-1969), filósofo, político, e homem de elevado carisma moral na sociedade portuguesa, lutador intelectual anti-fascista, por isso várias vezes preso, intelectual do grupo seareiro, da prestigiada revista Seara Nova (1921-1979), onde ao longo dos anos desenvolveu uma notável acção pedagógica e cultural, marcadamente voltada para a problemática da educação.

O confronto entre estes dois homens e Abel Salazar começou em 1937, tendo como fundo um artigo que este último escrevera no jornal Sol Nascente de 2 de Março de 1937, intitulado: Kretschener e os plotinozinhos, onde o autor atacava os “vaporosos aristocratas da quintessência”, incluindo-os no tipo dos “espiritualistas”, partidários duma concepção metafísica do homem e da vida.

Casais Monteiro, do grupo Presença, foi o primeiro a responder a Abel Salazar, pondo em destaque o modo como Abel Salazar efectuava a vulgarização cultural. Não estava em causa o fundo, não era pois o neo-positivismo do Círculo de Viena que estava em discussão, mas a falta de rigor crítico e de verdadeiro método científico que, segundo Casais Monteiro, Abel Salazar utilizava, acusando-o de fazer uma crítica simplista e dogmática à metafísica, e de não identificar os adversários, os quais não existiam, sendo tudo uma fantasia de Abel Salazar. E escrevia o seguinte:

Não basta espalhar a Ciência – é preciso, é o mais importante, espalhar o espírito científico. Num país que sofre tradicionalmente de incontinência verbal, é perigoso, quando se tem nome e discípulos, dar largas a certas fraquezas como as reveladas no (seu) artigo (…).

É triste ver um homem de grandes responsabilidades intelectuais, a título de defender a Ciência, incorrer nas mais manifestas atitudes anti-científicas enganando os leitores ignorantes que amanhã irão repetir as (suas) graças”.

Abel Salazar respondeu, identificando os seus adversários, acrescentando que não se dirigia só a estes, mas também a todos aqueles – a grande maioria -

“que neste país viviam intoxicados de filosofismo, ou seja, dum pensamento inquinado pela plétora verbal, pela retórica oca, pelo pedantismo e pela autoridade magistral, onde o sentimento se sobrepunha à reflexão e o espírito metafísico ao científico”.

A polémica com António Sérgio foi muito mais fundo, por isso mais dura...

António Mota de Aguiar

(continua)

4 comentários:

Luís disse...

Isto é de quem não sabe do que está a falar:

"Abel Salazar escreveu dezenas de artigos nos jornais mencionados, defendendo a microfísica (Bohr, Heisenberg, etc.), a revolução einsteiniana e as geometrias não euclidianas, enfim os grandes pilares da revolução científica do século XX, suportes do empirismo na luta contra o idealismo"

O Abel Salazar defendeu a Mecânica Quântica, a relatividade e as geometrias não-euclidianas??? Mas, a sério, alguém acha mesmo que elas não se defendem por si mesmas? E ele defendeu-as contra quem? E depois, grandes pilares da revolução científica do século XX?? Que "revolução científica" é esta?? E haverá outras "revoluções" ciência durante o século XX? E as geometrias não-euclidianas agora pertencem ao século XX?? Para além do mais, uma coisa é haver revoluções na Física e na Matemática, outra é falar em "revolução científica". Isto pelo menos para quem conhece o que a expressão "revolução científica".

E, por fim, a pérola: "suportes do empirismo contra o idealismo". Como?? As geometrias não-euclidianas fazem parte dessa pretensa luta entre o empirismo e o idealismo? E a Mecânica Quântica está a favor do empirismo?? Já alguma se deu conta do problema do realismo que a Mecânica Quântica levantou? Sabe o que é essa coisa do "espírito de Copenhaga"??

(e já agora, que tipo de empirismo e idealismo estamos a falar? É que o Einstein, por exemplo, reconhecia-se no idealismo crítico. Isto para além de Bohr, que encaixa muito mal no "empirismo").

Tanta ignorância filosófica, científica e histórica que vai para aqui.

Carmen disse...

Ó Luis, a tua ciência está cada vez mais desfocada!

Tanto ódio a Abel Salazar que vai por aqui...

Luís disse...

ódio a Abel Salazar??? Nenhum. Nojo à ignorância aqui mostrada do Sr. António Mota de Aguiar, isso sim. Olhe leia lá com os olhos focados no que é dito e não em quem diz.

Belmiro Assunção disse...

Este assunto interessa-me e gostava de compreender mais qualquer coisa mas para haver debate o Luis tem que se identificar.

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