segunda-feira, 10 de janeiro de 2011
O piolho do corpo nu
Crónica publicada no "Diário de Coimbra":
Para além do incómodo que o piolho causa ao seu hospedeiro humano, existe nele um potencial único de informação sobre a evolução da nossa própria espécie.
Estes insectos parasitas sugadores de sangue e sem asas (da ordem Phthiraptera, sub-ordem Anoplura) são muito específicos ao seu hospedeiro e co-evoluem com ele. Assim, estudos sobre a evolução dos piolhos têm fornecido informação valiosa sobre a evolução da nossa espécie. De facto, há mais de uma década que antropólogos e geneticistas têm recorrido ao estudo do DNA (nuclear e mitocondrial) do piolho para nele recolherem informações não fossilizáveis.
Uma primeira abordagem geral sobre como os parasitas podem ser bons indicadores para o estudo da evolução humana pode ser consultada aqui.
O estabelecimento de árvores genealógicas (filogenéticas, para ser mais preciso) da evolução das diversas espécies de piolhos que parasitaram especificamente diferentes espécies humanas, antepassados hominídeos e actuais símios, tem fornecido informação complementar e independente da do hospedeiro, corroborando teorias migratórias em vagas sucessivas para fora de África do género homo, e questionando a eventual convivência directa entre espécies diferentes.
Há alguns anos (2004), num artigo publicado na PLOS Biology, David Reed mostrava a possibilidade de Homo sapiens modernos terem convivido com espécies mais “arcaicas” como o H. erectus e H. neanderthalensis pela co-divergência de espécies de piolhos que parasitaram aquelas espécies na mesma época.
Num artigo publicado no último número da revista Molecular Biology and Evolution (28(1):29–32. 2011), uma equipa de investigadores, do Museu de História Natural da Universidade da Florida, liderado por Reed, vem mostrar que humanos anatomicamente modernos começaram a usar vestuário ainda em África. O estudo indica que os nossos antepassados começaram a usar roupa para cobrir o corpo sem pelos há cerca de 170 mil anos, altura em que os piolhos do corpo (Pediculus humanus humanus) terão divergido dos piolhos da cabeça (Pediculus humanus capitis) e da pele coberta com pelos.
Refira-se, a propósito, que o genoma do Pediculus humanus humanus foi sequenciado em 2010 e publicado na revista PNAS.
O uso de vestuário terá facilitado aos nossos antepassados a migração para latitudes mais elevadas com climas mais rigorosos. Uma vez que as peças de vestuário raramente fossilizam, o estudo indirecto recorrendo ao nosso mais velho insecto parasita, vem reforçar a perspectiva do desenvolvimento cultural e tecnológico ocorrido em humanos modernos em África em períodos mais recentes da nossa evolução e antes de novas e últimas migrações por todo o planeta.
António Piedade
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3 comentários:
Quem diria que os piolhos repugnantes ainda haveriam de servir para alguma coisa! Ou, perdoe-se-me a piada fácil, que sorte para os investigadores o Quitoso ser recente.
agora que ninguém me ouve..achei mesmo piada a este post de piolhos enquadrado naquele da percepção extra sensorial..tivessem piolhos os que dizem ter pes é a gente sabia já se eram diferentes. e a ligação emocional que dizem ser precisa para essas coisas resultaria duma mera e natural e nada esotérica ligação biológica de adn e genes ( coisas de que não percebo nadinha). gostei mesmo de sapiens conviver com "espécies mais arcaicas".significa que pode conviver com espécies mais avançadas.
Muito Obrigada pela informação deste site... foi-me muito útil para os trabalhos pedidos, apesar de a imagem ser um pouco "pertubante", é o que acontece... Obrigada desde já e feliz ano novo e com menos piolhos aha xp <3 (;
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