quinta-feira, 30 de setembro de 2021

APRESENTAÇÃO DO CONCERTO MUSAS EM CONÍMBRIGA



PRIMEIRA PARTE 


Sejam muito bem-vindos ao concerto de encerramento da segunda edição do Musas –

Festival das Artes de Conímbriga organizado pela Orquestra Clássica do Centro EM parceria com o Museu Monográfico de Conímbriga, o POROS e a Câmara Municipal de Condeixa-a-Nova. A Dr.ª Emília Martins, que tem dirigido o projecto da Orquestra Clássica do Centro, deu-ma e honra de falar sobre “O Tempo e a Terra” num outro concerto deste Festival, que decorreu no impressionante cenário do Vale das Buracas do Casmilo. Foi uma maneira de ligar a música ao património natural.

 

Hoje vou procurar ligar a música ao património histórico. Como o tema do festival é o tempo, o cenário do concerto desta noite remonta não aos 170 milhões de anos do tempo geológico, mas aos dois mil anos do tempo histórico. Conímbriga é, parece inútil lembrá-lo, uma cidade, que embora tenha tido ocupação pré-histórica, pertenceu ao Império Romano. A sua grandeza justifica a sua classificação como monumento nacional e a sua candidatura a Património Mundial da Humanidade, que está em andamento. Os Romanos chegaram aqui em 138 a.C. comandados pelo general Décimo Júnio Bruto. Atingiu o seu apogeu na época do imperador Augusto, que viveu de 63 a. C a 14 d.C, portanto o tempo em que nasceu Jesus Cristo. O poder romano começou a decair na segunda metade do século III quando tribos ditas “bárbaras” invadiram a Península. Só mesmo no final do seculo XIX a cidade seria ressuscitada com o labor de arqueólogos, dos quais é justo destacar Virgílio Correia, um pioneiro da arqueologia romana, e Adília Alarcão, que esteve quase três décadas à frente das ruínas e do Museu (recordo que museu vem de musas!), criado em 1962. Estamos aqui bem no meio da cidade romana, um sítio musicalmente muito antigo: Embora não tenham sido tão criativos como os gregos, os Romanos cultivaram música (recordo que música também vem de musas!), facto que numerosas representações chegadas até nós bem documentam.

 

Hoje vamos desfrutar neste magnífico cenário do som da Orquestra Clássica do Centro, dirigida pelo maestro espanhol Sérgio Alapont. O nosso maestro estudou direcção de orquestra em Pescara, Itália, e em Nova Iorque, EUA, recebeu o prémio de melhor maestro dado pelo GBOSCAR, Itália, em 2016, e ganhou a 2.ª edição do prémio de maestros de Granada. Já dirigiu algumas das mais famosas orquestras do mundo, nalguns dos melhores palcos do globo.

 

Iremos ouvir música norte-americana do século XX – música de Copland e Gershwin, dois dos maiores compositores americanos novecentistas – e, recuando no tempo,  música russa do século XIX - Borodin e Tchaikovski, dois dos maiores compositores russos oitocentistas. Ouviremos também dois temas corais, um do século XX de Ennio Morricone, o famoso compositor italiano que fez numerosas músicas para filmes e que nos deixou no ano passado, e outro do século XIX, um grande clássico, do incomparável Giuseppe Verdi. Esses temas serão interpretados pelo Coro Coimbra Vocal, que actuou recentemente com Andrea Bocelli em Coimbra.

 

Passei também um tempo da minha vida nos Estados Unidos, no tempo em que ainda havia CDs. Não admira por isso que dois dos compositores que mais admiro sejam os norte-americanos Aaron Copland e George Gershwin, que foram contemporâneos. Têm semelhanças: são os dois judeus noviorquinos, ambos nascidos em Brooklyn, ambos com famílias oriundas do Nordeste da Europa: Copland da Lituânia e Gershwin da Ucrânia. Ambos sentiram necessidade de americanizar o nome. Copland começou por ser Koplan, com K, e Gershwin tinha um nome muito mais complicado,  Gershowitz. Os dois foram  exímios pianistas e os dois tiveram estadas em Paris. Os dois fizeram música para concertos e para filmes, tendo percebido que o século XX era o século da sétima arte. Os dois transmitiram retratos da vida americana. E os dois alcançaram enorme e merecido êxito. A grande diferença é que Copland morreu em idade avançada, com 90 anos, enquanto Gershwin morreu com apenas 38 anos.

 

Aaron Copland (1900-1990) actuou, ainda  criança, ao piano, no que são hoje os armazéns Macys, em Nova Iorque. Aos 15 anos depois de ouvir um concerto do pianista e compositor polaco Ignacy Paderewsky, resolveu tornar-se não só pianista como compositor. Estudou em Paris nos anos 20, com a famosa pianista Nadia Boulanger, e conheceu uma plêiade de artistas da época, não só da música como de outras artes. Paris fervilhava na época! Regressado a Nova Iorque em 1925, viveu durante mais de três décadas perto do Carnegie Hall, em 1925. Um dos seus maiores prémios foi o Pulitzer de Música atribuído em 1945, precisamente a meio da sua longa vida. No final dos anos 40 Copland regressaria a Europa para se encontrar com Pierre Boulez e Arnold Schoenberg, tendo adoptado o método deste último. Nos anos 50 foi vítima da caça às bruxas do senador McCarthy, tendo  sido obrigado a declarar que nunca tinha sido comunista. O mesmo sucedeu aliás ao físico Frank Oppenheimer,  também judeu, que foi um dos cérebros da bomba atómica. Copland era homossexual, uma palavra maldita nos seu tempo. Morreu de Alzheimer, uma doença infelizmente cada vez mais comum.

 

Um dos seus maiores sucessos é a Fanfarra para o Homem Comum, que vamos ouvir.  É um hino patriótico, escrito em 1942 quando os EUA já tinham entrado na Segunda Guerra Mundial. A Sinfonia n.º 3, escrita por Copland entre 1944 e 1946, retoma esse tema. A Fanfarra foi escrita para a Orquestra Sinfónica de Cincinatti, tendo o título encontrado inspiração num discurso de Henry Wallace, vice-presidente de Franklin Roosevelt, em que ele falava do “amanhecer do século do homem comum”. Foi uma resposta musical à entrada dos EUA na guerra, em Dezembro de 1941, como que chamando o homem comum para o esforço bélico. A estreia em Nova Iorque a 12 de Março de 1943, no dia final do prazo da entrega do IRS nos EUA: “Estou a homenagear o homem comum no dia dos impostos.” E os impostos iam para a guerra…

 

A música é intemporal: este hino conheceu em 1977 uma adaptação da banda de rock britânica Emerson, Lake and Palmer, quando a guerra era apenas fria. Mas foi usado depois em vários contextos. O compositor norte-americano John William inspirou-se nele para os filmes Superman e  Resgate do Soldado Ryan. Em 2012 foi tocado no aeroporto internacional de Los Angeles quando o space shuttle Endeavour aterrou pela última vez. Foi tocada em Filadélfia numa visita do Papa Francisco. Costuma ser tocado na véspera do Ano Novo em Times Square, em Nova Iorque, quando sobe a bola que há-se cair à meia-noite. Está portanto associada à passagem do tempo…

 

George Gershwin (1898-1937) também nasceu em Nova Iorque, mas, ao contrário de Copland, não morreu aí, mas sim em Hollywood, depois de lhe ter sido retirado um tumor cerebral. Escreveu tanto música ligeira como clássica, tendo os seus temas sido imortalizados por grandes artistas. As suas peças mais conhecidas são Rhapsody in Blue ou Rapsódia Azul (1925), que vamos ouvir, e O Americano em Paris (1928), além da ópera Porgy and Bess (1935), que inclui o clássico Summertime, que Ella Fitzgerald,e outros interpretaram. O Americano em Paris foi inspirado pela sua estada na cidade-luz: tal como Copland, Gershwin também rumou na sua juventude a Paris. Mas a professora Nadia Boulanger recusou-o  por recear  que uma formação demasiado clássica perturbasse a sua natural propensão para o jazz.  Quando Gershwin pediu para estudar com Maurice Ravel, este comentou que ele é que “devia ter lições dele”. Influenciado por Ravel e Debussy, Gershwin esteve sempre a meio caminho entre a música clássica e o jazz.

 

Rapsódia Azul combina jazz com música clássica. Começou a ser escrito para um piano solo e uma banda de jazz. Foi assim que foi estreado em 1924 em Nova Iorque, com Gershwin ao piano. Na altura, Gershwin ainda não sabia o suficiente de arranjo para orquestras e foi um seu amigo que desenvolveu a versão orquestral, que ficou pronta em 1942, quase na mesma altura da Fanfarra para o Homem Comum. A música ficou logo nos ouvidos. A sua abertura da Rapsódia Azul com o solo de clarinete é quase tão famosa como as notas iniciais da Quinta Sinfonia de Beethoven.

 

A peça é um retrato sonoro de Nova Iorque. O pianista chinês Lang Lang diz que quando a ouve, “vê o Empire State Building, o skyline de Nova Yorque e as lojas de Times Square.” Foi usada por Woody Allen no filme Manhattan e pela Disney em Fantasia 2000. Foi tocada por 84 pianistas na abertura dos Jogos Olímpicos de 1984 em Los Angeles. Lembro que foi nesse ano orwelliano que o atleta português Carlos Lopes obteve ouro na maratona olímpica. Acordaram-me de noite a dar a notícia quando estava de férias em Londres e passei rapidamente do susto ao contentamento.

 

Ouviremos a Rapsódia Azul de Gershwin, com a participação especial do pianista Miguel Borges Coelho.  Natural do Porto, em 1971, Miguel Borges Coelho mantém uma carreira de solista e músico de câmara, em paralelo com a sua carreira de professor de piano na Escola Superior de Música, Artes e Espetáculo, no Porto. É considerado um dos melhores pianistas portugueses da actualidade. Venceu vários concursos nacionais de piano e obteve o Prémio para a interpretação da obra contemporânea no XIV Concurso Internacional de Música do Porto. Em 1998 o Ministério da Cultura atribuiu-lhe o Prémio Revelação “Ribeiro da Fonte”. Tem gravações em várias editoras, alguns delas em discos premiados. Espero que ele não me leva a mal se acrescentar que é sobrinho de um famoso historiador português, que com 92 anos continua a escrever, e filho de um também famoso maestro coral.

 

O terceiro tema que vamos escutar esta noite será as Danças Polovtsianas, de Alexander Borodin (1833-1887), um compositor russo com que tenho particular afinidade pois ele, além de músico, era cientista: notabilizou-se como professor de Química na Academia Militar de São Petersburgo. Pertenceu a um grupo de cinco músicos de ideário nacionalista, o “Grupo dos Cinco”, dirigido por Mil Balakirev, onde pontificavam Mussorgsky e Rimsky-Korsakov. Mas, ao contrário dos seus amigos profissionais da música, considerava-se um “compositor dos domingos.”

 

Apesar de já ter noções de música, tendo inclusive escrito um dueto para piano aos nove anos, foi só ao conhecer Balakirev, em 1862, que passou a compor a sério. Foi ele que o convenceu a juntar-se o “Grupo dos Cinco”, com cujas ideias nacionalistas se identificava. Ajudou-o também a compor sua 1.ª Sinfonia, a qual o próprio Borodin dirigiu, na estreia, em 1869. No mesmo ano, começou a compor a sua 2.ª Sinfonia, que não foi bem recebida quando estreou oito anos depois. Após uma reorquestração, a nova estreia em 1879, dirigida por Rimsky-Korsakov, foi elogiada pelo público. Em 1880, na Alemanha, o húngaro Franz Liszt dirigiu esta mesma sinfonia, dando a Borodin fama fora da Rússia.

 

Em 1869 Borodin começou a compor a sua obra mais notável: a ópera Príncipe Igor. Trabalhou nela durante 18 anos até sua morte, deixando-a incompleta, e foi terminada por Nikolai Rimsky-Korsakov e Aleksandr Glazunov em 1890. As Danças Polovtsianas pertencem precisamente ao Príncipe Igor, embora possam ser executadas em separado como hoje vai acontecer. Estas danças, inspiradas pelo folclore russo,  são muitas vezes apresentadas com coros e, por vezes, são mesmo dançadas. Em 1909, no Théâtre du Châtelet, o empresário Sergei Diaghilev, dos famosos Ballet Russes, apresentou em Paris as Cenas e Danças Polovtsianas, consistindo no 2.º acto do Príncipe Igor, com orquestra completa e coro. Lembro que os Ballets Russes haveriam de visitar Portugal…

 

Borodin ficou conhecido do grande público pela adaptação de criações suas para a música popular. Foi o caso da adaptação feita pelos compositores norte-americanos Robert Wright e George Forrest, de uma de suas peças mais conhecidas, a "Dança Deslizante das Donzelas", do Príncipe Igor, e que se tornou a bem-sucedida canção "Stranger in Paradise", do musical Kismet, de 1953. A versão mais conhecida foi cantada por Tony Bennett, que há pouco deu por terminada a sua longa carreira.

 

Senhoras e Senhores, convosco a Orquestra Clássica do Centro com o maestro Sergio Alapont.

 

 

SEGUNDA PARTE

 

Nesta segunda parte do espectáculo de hoje vamos ouvir o coro “Va, pensiero”,  também conhecido como o “Coro dos Escravos Hebreus” da ópera Nabucco (1842), de Verdi.  Rossini, Donizetti, Puccini, Wagner e outros que me perdoem, mas, para mim. o maior compositor de ópera de todos os tempos é o italiano Giuseppe Verdi.

 

Giuseppe Verdi (1813-1901), nascido em Roncole, na Emília Romana, e falecido em Milão, foi um compositor de óperas do período romântico, sendo considerado no seu país o maior compositor nacionalista, tal qual foi Richard Wagner era na Alemanha. Cada um com o seu estilo, foram dois gigantes. As obras de Verdi continuam a ser executadas com frequência em casas de ópera de todo o mundo e alguns dos seus temas estão enraizados na cultura popular – como, além do "Va, Pensiero" de Nabucco, "Libiamo ne' lieti calici" (ou Valsa do Brinde) de La Traviata e a "Gloria all’ Egito e ad Iside" (ou Marcha Triunfal) de Aida.

 

Quando em 1901 estava hospedado no Grande Hotel de Milão, , Verdi sofreu um derrame cerebral. Faleceu seis dias depois, em 27 de janeiro. O maestro Arturo Toscanini dirigiu a vasta força de orquestras e coros reunidos de toda a Itália no funeral de Verdi, em Milão. O coro de mais de cem mil pessoas foi uma das maiores uniões da história musical.

 

Nabucco é uma das primeiras óperas de Verdi. Conta a história do rei Nabucodonosor  da Babilónia. Foi estreada a 9 de março de 1842, no Teatro Alla Scala de Milão. O “Coro dos Escravos Hebreus” surge no 3.º acto. A letra diz “Va, Pensiero, sull'ali dorate, "Vai, pensamento, sobre asas douradas". O coro tornou-se rapidamente um símbolo do nacionalismo italiano da época,

 

O tema seguinte provém de outro compositor italiano, este do século XX:  Enio Morricone (1928-2020), nascido e falecido, com 91 anos, em Roma. Morricone foi um compositor e maestro italiano que escreveu músicas em diversos estilos. Compôs mais de 400 partituras para cinema e televisão, além de mais de cem obras clássicas. A sua banda sonora para o filme O Bom, o Mau e o Vilão (1966), de Sergio Leone, entrou no Grammy Hall of Fame. A sua filmografia inclui mais de 70 filmes premiados, incluindo vários filmes de Sérgio Leone e de Giuseppe Tornatore, entre os quais Cinema Paraíso.

 

A canção Here’s to you, que escreveu em 1971 com a cantora norte-americana Joan Baez, fez parte da banda sonora do filme Saco e Vanzetti, dirigido por Giuliano Montado. A música é uma homenagem a dois anarquistas de origem italiana, Nicola Sacco e Bartolomeo Vanzetti, que foram condenados à morte por um tribunal dos EUA na década de 1920. Concluiu-se entretanto que a decisão foi baseada na aversão às suas crenças políticas anarquistas e não em qualquer prova de que eles cometeram o roubo e assassinatos dos quais foram acusados. A canção tornou-se num símbolo internacional para o movimento de direitos humanos da década de 1970. Vários cantores, como a francesa Mireille Matthieu e a grega Nana Mouskouri, as duas vivas, cantaram este tema.  A letra são apenas quatro linhas de texto, cantadas repetidamente.

 

“Para vocês, Nicola e Bart

Descansem para sempre nos nossos corações

O último e final momento é vosso.

A vossa agonia é o vosso triunfo.”

 

TERCEIRA PARTE

 

Para fechar com grande glória e estrondo escutaremos uma peça do extraordinário compositor russo Piotr Tchaikovski, que termina com sinos e tiros.

 

Nascido em Vótkins, bem no centro do Império Russo, e falecido em São Petersburgo, Piotr Ilitch Tchaikovski (1840-1893) foi um compositor russo do período romântico, cujas obras são muito populares. Primeiro compositor russo a conquistar fama internacional, a sua carreira foi impulsionada pela sua participação como maestro convidado noutros países da Europa e nos EUA. Foi homenageado em 1884 pelo imperador Alexandre III, passando a receber uma pensão vitalícia.

 

Aos quatro anos de idade começou a tocar piano. O relacionamento com a sua mãe foi complicado, já que aos dez anos foi para um internato e aos 14 anos viveu a morte da mãe, de cólera. Depois de formado em Direito. trabalhou como funcionário público. Foi encorajado por Nicolai Rubinstein, director no Conservatório de São Petersburgo, onde obteve emprego. Relacionou-se com o grupo dos cinco, onde estava Borodin. Casou com uma sua ex-aluna, mas foi uma união breve (dois meses e meio) e traumática. De facto, Tchaikovski era homossexual, tal como Copland.  Tendo gozado de ampla popularidade entre os anos 70 e 90 do século XIX,  recebeu o patrocínio da Sr.ª von Mekk, viúva de um magnata dos comboios. O dinheiro permitiu que ele se concentrasse na sua música. Houve uma forte relação emocional entre os dois por meio de cartas, mas as regras acordadas entre ambos impediam os encontros. A comunicação foi cortada em 1890 por decisão da senhora. Isso abalou o compositor que morreu passados três anos, aos 53 anos, possivelmente por suicídio ou por cólera, tal como a mãe. Isso aconteceu nove dias depois de ter regido a estreia da sua Sinfonia 6 ou Patética em São Petersburgo.. As suas obras mais famosas são os bailados O Quebra Nozes, A Bela Adormecida, O Lago de Cisnes, o Concerto para piano n.º 1, as Sinfonias nº 4, 5 e, claro, a  Patética.

 

A Abertura Solene Para o Ano de 1812 é uma obra orquestral que comemora o fracasso da invasão francesa à Rússia em 1812 e a subsequente devastação do exército de Napoleão. A Campanha da Rússia terminou com a retirada do exército francês: este passou em poucos meses de 600.000 homens a 40.000, uma  das maiores derrotas da história. A Abertura 1812 foi composta para a inauguração da Exposição Universal das Artes, realizada em Moscovo em 1882. A abertura da exposição coincidiu com a consagração de uma nova catedral, erigida para comemorar os 70 anos do fracasso da invasão de Napoleão à Rússia, em 1812, tendo servido também para assinalar o primeiro aniversário da coroação do czar Alexandre III.

 

Esta é uma obra de carácter fortemente nacionalista, tal como a Fanfarra para o Homem Comum de Copland ou o Va pensiero de Verdi. A composição baseia-se num antagonismo entre a inicial vitória francesa e a posterior revanche russa. A França é representada pelo tema da  Marselhesa, hino da Revolução Francesa e da França. E a vitória russa é representada pelo hino czarista Deus Salve o Czar. A obra contrapõe os dois hinos com peças do folclore russo e temas religiosos. A Abertura 1812 começa precisamente com uma melodia inspirada no hino “Deus ajude vosso povo’”, da Igreja Ortodoxa Russa. Após a Revolução Soviética e a consequente proibição do hino czarista, a obra sofreu modificações.

 

A obra é sobretudo conhecida pela sua sequência de tiros de canhão  no final que é, em alguns concertos ao ar livre, executada com canhões verdadeiros por artilheiros fardados a rigor. O concerto da estreia foi realizado na praça em frente ao Kremlin, com orquestra, banda de metais, coro e canhões, além dos sinos das torres do Kremlin  e  da nova catedral do Cristo Salvador, então quase concluída. Em 1891, o próprio Tchaikowski dirigiu a obra na inauguração, do Carnegie Hall em Nova Iorque. No Dia da Independência nos EUA, 4 de Julho, esta música costuma acompanhar o fogo de artifício, desmentindo as rivalidades americano-russas. Aqui os tiros vão ser simulados por instrumentos de percussão, pois a produção não teve meios para a artilharia pesada. É dos trechos de música mais conhecidos de todos os tempos pelo seu final empolgante. Tenho a certeza de que todos sairemos daqui empolgados.

 

Bom final de concerto, deixo-vos com a Orquestra Clássica do Centro!

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