O jornal O Figueirense é antigo (muitos parabéns pelos cem anos!), mas a
Física Quântica é ainda mais antiga. Nasceu em 1900 quando o físico alemão Max
Planck propôs, para interpretar as medidas da radiação vinda de uma fonte de
luz, que a luz de um certo comprimento de onda (no caso da luz visível, de uma
só cor) só podia ser emitida ou absorvida em certas quantidades ou pacotes de
energia, a que chamou quanta recorrendo
à raiz latina da palavra “quantidade”. A
proposta era revolucionária pois até então julgava-se que a luz podia ser
emitida ou absorvida de um modo contínuo. Passados cinco anos, o suíço Albert
Einstein, acrescentou que a luz não só é emitida e absorvida em certas
quantidades como também só existe em certas quantidades, os fotões ou “grãos de
luz”. Desde então o avanço da Física Quântica foi imparável: em 1913 o
dinamarquês Niels Bohr formulou o primeiro modelo quântico do átomo. Ele
percebeu que os fotões eram emitidos ou absorvidos por um átomo quando um
electrão passava de um certo estado energético para outro, fazendo “saltos
quânticos”. Quando O Figueirense
nasceu a aceitação do modelo atómico alargava-se, tendo sido por essa altura
que chegou a Portugal. O modelo de Bohr foi melhorado por volta de 1926 por
três jovens físicos, o alemão Werner Heisenberg, o austríaco Erwin Schroedinger
e o inglês Paul Dirac, que calcularam os níveis de energia de um átomo, a
começar pelo mais simples de todos que é o de hidrogénio (que consiste de um
único electrão, que orbita em torno do núcleo, constituído por um só protão).
Não tardou até se alcançar a compreensão do arranjo dos elementos químicos na
Tabela Periódica, que tinha sido criada pelo químico russo Dmitri Mendeleiev,
em 1869, há 150 anos.
A teoria quântica revelou-se de uma
eficácia extraordinária para explicar não só as propriedades dos átomos, mas
também as propriedades das combinações de átomos, as moléculas - explica as
ligações químicas. Explica, por isso, as propriedades de gases, líquidos e
sólidos. Mas não se fica por aí: explica ainda as propriedades dos núcleos atómicos
e das partículas que formam esses núcleos. A física quântica permite-nos
descrever o mundo do muito pequeno, o mundo que não vemos, mas que está na base
de tudo aquilo que vemos.
Uma das suas aplicações mais
importantes foi, em 1947, a invenção do transístor, um pequeno interruptor que
funciona com base num fenómeno quântico que ocorre em elementos ou compostos químicos
chamados semicondutores. O desenvolvimento extraordinário dos computadores
desde então deve-se, portanto, ao nosso conhecimento de física quântica.
A Física Quântica tem
particularidades difíceis de entender por nós, que somos feitos de muitos átomos.
Por exemplo, os sistemas quânticos podem existir num estado, ou noutro, ou numa
sobreposição de estados. Schroedinger imaginou um gato, que ficou famoso com o
nome de “gato de Schroedinger,” que podia estar meio vivo e meio morto, por a
sua vida depender de um dispositivo quântico. Porém, quando se observava o
gato, ele era visto vivo ou morto. A Física Quântica permite afirmar que, se
tivermos mil caixas com mil gatos de Schroedinger, estar meio vivo e meio morto
significa que, se abrirmos as caixas, encontraremos um gato vivo em cerca de
metade dos casos e um gato morto na outra metade, sem que possamos saber
antecipadamente qual é o estado do gato em cada caixa. Como tudo isso é muito
estranho, muitos físicos, incluindo Einstein e Schroedinger, recusaram-se a
acreditar nalgumas das consequências da teoria que eles próprios tinham criado.
Passou-se a falar de bizarrias quânticas, a do gato e outras, e procuraram-se
alternativas à teoria quântica convencional.
A busca não deu, porém, resultados.
A Física Quântica, por muito estranha que pareça, descreve bem o que se passa
no mundo natural. Está bem e recomenda-se. Apesar de já ter mais de cem anos,
está como nova, continuando a fornecer novos resultados. Nos últimos anos
passaram a ser intensamente procuradas aplicações tecnológicas baseadas nas bizarrias
quântica. Uma dá pelo nome de “computação quântica”. Com efeito, estão a ser
construídos novos computadores, ditos quânticos (de facto, os actuais, como o
que estou a usar para escrever este texto, já são quânticos por usarem
transístores…), que prometem revolucionar o mundo, por terem o potencial de ser
muito mais rápidos do que os actuais. Os componentes em que se baseiam existem numa
sobreposição de estados quânticos, tal como o gato de Schroedinger. Várias
questões permanecem por resolver, mas os protótipos já acessíveis, como por
exemplo a Q-Experience da IBM, um
computador quântico na “nuvem” que pode ser programado por quaisquer interessados,
revelam-se promissores. Computadores muito mais potentes permitirão resolver
problemas muito difíceis, que hoje nos desafiam. Utilidades fantásticas como a
concepção de novos medicamentos ou de novos materiais estão no horizonte. Vem aí o admirável mundo novo!
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