segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Uma coleção zoológica (re)encontrada numa antiga escola

Esta é uma história de acasos que levou à recente publicação de um artigo em história da ciência, intitulado Between republicans and freemasons: a lost zoological collection found in a very particular school, na revista Endeavour

Abreviando uma história longa: estava eu no início do programa doutoral, quando me pediram ajuda para classificar umas conchas encontradas numa antiga escola do Bairro da Graça (a Escola-Oficina nº1), em Lisboa, que se preparava para ter umas necessárias obras - alguns anos antes tinha trabalhado no Instituto Português de Malacologia onde dei início à catalogação da coleção do fundador, Ilídio Félix Alves, onde me tinha debruçado não só, mas principalmente, sobre conchas do género Conus e Oliva. Quando cheguei à tal escola, percebi que a grande maioria das conchas eram fósseis, o que escapava ao meu conhecimento. Mas antes de ir embora, explorei a sala, juntamente com os membros da Direção do espaço, e fomos gradualmente encontrando uma diversidade de espécimenes zoológicos. À medida que íamos tirando material para fora da sala onde tudo estava guardado há longos anos, entre material de laboratório e de ensino, fomos encontrando animais taxidermizados, esqueletos de animais e uma  rica coleção húmida dos mais variados grupos taxonómicos.

Coincidiu nesse mês que, para a cadeira de Património Científico, me fosse pedido que estudasse uma coleção de alguma instituição, pelo que me debrucei automaticamente sobre este espólio. Para esse estudo, tentei perceber que coleção era aquela, de que é que era constituída, como foi reunida, para que efeitos, e em que contexto. E esse resultado é o que agora foi publicado pela revista Endeavour

Escola-Oficina nº1, em Lisboa. Fonte: Filorbis

A Escola-Oficina nº1, pertence à Sociedade Promotora de Escolas, e foi criada por Republicanos e Maçons nos inícios do século XX para dar formação gratuita às crianças pobres, filhas dos operários, do Bairro da Graça, num período em que ainda não havia Estado-Social, pelo que iniciativas filantrópicas deste tipo eram essenciais. Era uma Escola-Oficina porque para além das disciplinas comuns, aprendia-se também um ofício para que as crianças pudessem quebrar o ciclo de pobreza: assim, aprenderiam a ler, a escrever e a contar, e, simultaneamente, aprenderiam um ofício que lhes permitisse ingressar no mercado de trabalho quando crescessem. O modelo de ensino era libertário e tinha várias particularidades, entre elas o ensino era centrado no aluno, os quadros estavam ao nível das crianças,  os professores não leccionavam em estrados mas sentados em cadeiras próximos dos alunos, o ensino era misto e os castigos corporais tinham sido abolidos.

Fonte: João Lourenço Monteiro, Between republicans and freemasons: a lost zoological collection found in a very particular school, Endeavour, 42 (4), 2018: 196-199  

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