quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

LIVROS PARA O NATAL


Meu artigo no Público de hoje: 

 Estamos numa época alta para o comércio de livros, um sector que entre nós já viveu melhores dias. Segundo dados da PORDATA, em 2017 o número de novos títulos no depósito legal foi 16058, abaixo dos 17778 depositados em 2008, ano em que se atingiu o pico. Mesmo assim ainda se publica cerca de um livro em cada meia hora. Como não se pode ler tudo, tem de se escolher. Quando Portugal acaba de fazer figura como convidado de honra da Feira do Livro de Guadalajara, no México, escolhi dois livros recentes de autores portugueses de cada uma da meia dúzia de áreas que privilegio na minha biblioteca.

 Ficção: Cinco Meninos, Cinco Ratos, de Gonçalo M. Tavares (Bertrand), e Princípio de Karenina, de Afonso Cruz (Alfaguara). Estes dois novos valores da literatura portuguesa, que foram pontas-de-lança na “selecção nacional” no México, caracterizam-se pela originalidade ficcional e pela clareza da escrita. Com eles esta selecção fez muito melhor do que a de futebol em 1986.

 Poesia: Obra Poética I, de António Ramos Rosa (Assírio & Alvim), e Poesia (1916-1940), de Vitorino Nemésio (Imprensa Nacional-Casa da Moeda). De dois clássicos do nosso século XX, estes volumes são o início das suas obras completas. Não podiam ir ao México por serem do “clube dos poetas mortos”, mas a sua poesia merece decerto ser lida em traduções castelhanas. Os poetas vivos que foram, como Nuno Júdice e Filipa Leal, ajudaram à boa prestação nacional.

 Ciências Exactas e Naturais: Visão, Olhos e Crenças, de Luís Miguel Bernardo (Gradiva), e Curvas Ideais, Relações Desconhecidas e Outras Histórias da Matemática, de Jorge Buescu (Gradiva). De um físico do Porto e de um matemático de Lisboa com obra feita, os dois são volumes da colecção “Ciência Aberta,” que tem mais de 25 anos. O primeiro trata da história do nosso conhecimento da visão, no mundo e em Portugal, não esquecendo as lendas que imperam no saber popular. O segundo delicia-nos com surpreendentes questões matemáticas. O químico e crítico de arte Jorge Calado escreveu um sedutor prefácio para a segunda destas obras. A “selecção nacional” no México não teve praticamente nomes das ciências, talvez porque a questão das “duas culturas” ainda persista.

 Ciências Sociais: O Século dos Prodígios. A Ciência no Portugal da Expansão, de Onésimo Teotónio Almeida (Quetzal), e Ética Aplicada, vol. XII, sobre investigação científica, coordenado por Maria do Céu Patrão Neves e Maria da Graça Carvalho (Edições 70). O professor da Universidade Brown não teme falar dos Descobrimentos lusos, defendendo a tese de que eles foram o prelúdio da Revolução Científica. Por sua vez a professora da Universidade dos Açores e a assessora da Comissão Europeia fazem neste volume colectivo uma introdução às questões éticas ligadas à ciência, o que interessa num mundo confrontado com desafios tremendos como os da inteligência artificial e da genómica. As ciências sociais também não tiveram a desejável representatividade na Feira do Livro americana.

 Banda Desenhada: Amadeo. A Vida e Obra entre Amarante e Paris, de Jorge Pinto e Eduardo Viana (Desassossego) e Watchers A, de Luís Louro (Asa). Nem o imaginativo enredo nem o traço original destes autores, os primeiros abordando o pintor modernista falecido há cem anos e o segundo fantasiando sobre Lisboa, lhes valeu o passaporte para o México. Ainda há quem pense que a BD é um género menor…

 Obras de referência: Dicionário dos Antis, coordenado pelo historiador José Eduardo Franco (Imprensa Nacional–Casa da Moeda), e Agenda Solidária IPO 2019 (Livros Horizonte). O primeiro é um original dicionário em dois espessos volumes em que todas as entradas começam por “anti.” Com um “antiprefácio” do jurista António Araújo, é, pela amplitude e qualidade da edição, um dos grandes lançamentos do ano. O segundo é uma obra de referência para o possuidor, pois cada um pode lá escrever o que quiser, com a certeza de ter contribuído para uma causa nobre. Declaração de interesses: sou um modesto contribuinte destas duas obras, assim como do volume sobre ética atrás referido.

 Boas leituras!

Sem comentários:

O QUE É FEITO DA CARTA DAS NAÇÕES UNIDAS?

Passaram mil dias - mil dias! - sobre o início de uma das maiores guerras que conferem ao presente esta tonalidade sinistra de que é impossí...