A dignidade, que encabeça esses valores e lhes dá sentido, de nada vale quando se trata de obter audiências. E assim as obtêm!
Isto diz muito sobre o modo como encaramos a nossa própria dignidade (a verdade é que facilmente nos vendemos e não interessa se é por muito ou se é por pouco) e como encaramos a dignidade do outro (quanto mais ela estiver em causa, mais nos divertimos).
Esses canais de televisão têm, pois, tanto mais espectadores/seguidores quanto mais atentarem contra a dignidade. E não é a escolaridade que muda alguma coisa: países com elevados índices de escolaridade parecem andar à frente nesse atentado, que é organizado e operacionalizado por gente com formação superior, altamente especializada.
Não foi, por certo, a escolaridade que a isso conduziu mas também não o conseguiu impedir, nem vejo como o poderá fazer. Também não vejo como poderão as instituições sociais responsáveis pela mencionada convivência proceder contra programas em que pessoas adultas decidem abastardar a sua própria dignidade e a dignidade de outras pessoas, crianças e adultos.
Questões como a censura não podem ser alheadas da discussão e, nesta matéria, não sabemos bem como nos situar, confundido frequentemente tudo o que pode ser confundido, incluindo o que é do domínio da ética.
Imagem recolhida aqui |
Neste cenário não será fácil o trabalho de entidades cuja vocação se situa nesse domínio, mas isso não significa que ele seja irrelevante. Em Portugal um esforço muito convergente de entidades dedicada à protecção de menores fez com que o tribunal suspendesse o programa Super Nanny Isso foi sem dúvida uma vitória contra a exposição da privacidade e intimidade a que as crianças têm direito,
Talvez esta decisão tenha feito com que a produtora de conteúdos para a mesma estação de televisão solicitasse parecer à Comissão de Ética da Ordem dos Psicólogos Portugueses para se pronunciar sobre a intervenção profissional no programa Casados à Primeira Vista, o qual, como o leitor deve saber, consiste no casamento (!?) de pessoas que não se conhecem, aconselhado por especialistas.
O resultado consta aqui e aqui e, apesar de serem apresentados princípios genéricos, não se pode dizer que sejam propriamente favoráveis à participação dos psicólogos no tipo de programas em causa. Esta é a ideia com que fiquei depois de ler os pareceres da Ordem, bem como declarações de representante da Ordem e de psicólogo da equipa de especialistas.
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Sobre o assunto vale a pena ler o artigo de Ana Bela Ferreira intitulado "Casados à Primeira Vista": psicólogos abrem polémica com Ordem, publicado no Diário de Notícias, de 17 de Novembro: aqui).
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