Meu artigo publicado hoje no “Diário as Beiras”:
Excelência:
Auferindo minha mulher uma pequena pensão da Segurança Social, de cerca de metade do ordenado mínimo nacional, após 12 anos contributivos, em ofício datado de 17 de Outubro de 2016 da ADSE é informada da inviabilização da respectiva manutenção de cônjuge de beneficiário titular, tendo como suporte a disposição do artº. 7.º do Decreto-Lei 118/83, de 25 de Fevereiro, na redacção do Decreto-Lei n.º 234/2005, de 30 de Dezembro.
Em 2 de Dezembro de 2016, “ipso facto”, endossei uma exposição à ADSE em que apresentei um relatório médico, emanado do Centro de Reabilitação Rovisco Pais, atestando a sua “necessidade de vigilância médica e tratamentos constantes por tetraplegia incompleta secundária a mielomalacia”. Reportava-se a essência da questão da supracitada exposição em saber se esta determinação se aplicava, apenas, a futuras inscrições sem efeitos retroactivos, não abrangendo, consequentemente, o caso de minha mulher inscrita na ADSE, desde o ano de 1975, na sua qualidade de cônjuge de benificiário titular.
Embora reconhecendo a minha falta de conhecimento “quantum satis” em evocar direitos adquiridos, por ausência de estudos académicos da área da jurisprudência, como tal, apenas como amador ( aquele que ama), em matéria tão complexa e controversa entre os próprios especialistas , mas, por outro lado, sentindo o desconforto de expectativas anteriores criadas e depois goradas numa altura da vida “com pesares que ralam na aridez e secura de uma desconsolada velhice”, em citação de Garrettt, recuso-me a cruzar os braços perante uma situação que mereceu da minha parte acerba crítica em quatro artigos de opinião publicados neste jornal, a saber: “A ADSE e as gorduras do Estado” (05/11/2016); “O Partido Socialista, a ADSE e a ‘praga cinzenta’” (14/09/2017); “A ADSE e o ‘soberaníssimo bom senso’ preconizado por Antero” (29/09/2017); “O ziguezaguear da ADSE” (17/10/2017).
Fazendo eu fé de que “o homem livre é aquele que não receia ir até ao fim da sua razão” (Jules Renand), predispus-me a escrever esta “Carta Aberta” a Vossa Excelência, com respaldo no vosso humanismo em defesa dos que sofrem, para lhe dar conhecimento público da injustiça representada pela impossibilidade de inscritos continuarem com o estatuto de cônjuges de beneficiários titulares na parte derradeira de suas vidas.
Desde a publicação desta legislação até à sua aplicação mediaram 33 anos, quiçá, pelo receio de ela poder vir a ter reflexos negativos em posteriores eleições nacionais, até que, em euforia do estado de graça do Partido Socialista, foi ela despertada do seu estado de letargia despejando para um Serviço Nacional de Saúde, a rebentar pelas costuras, nova “clientela” originária de vários subsistemas de saúde convencionados. E este “statu quo” é tanto mais insólito por não se tratar de acudir a fogos de uma ADSE em falência.
Uma auditoria anterior do Tribunal de Contas denunciou que o “Governo está a financiar à custa da ADSE por os funcionários públicos estarem a pagar mais 228 milhões de euros do que seria necessário” (“Expresso”, 17/07/2015). Tempos antes, noticiava o semanário Sol (18 de Julho de 2015 ) haver doentes que tem de recorrer a consultas privadas de Dermatologia por elas poderem levar anos a serem feitas no Serviço Nacional de Saúde.
O que constatamos nós, hoje? Com o título, “Tutela ‘falseou’ tempos de espera nos hospitais” é noticiado aí que o acesso a consultas e cirurgias piorou nos últimos três anos e que , entre 2014 e 2016, mais de 27 mil doentes ficaram em lista de espera por uma cirurgia e mais de 2600 morreram antes de serem operados (Público, 18/10/2017). “Ergo”, quantos ex-cônjuges de beneficiários titulares terão que entregar a alma ao Criador por passarem a ser novas vítimas deste calamitosa situação, numa altura em que o Conselho Geral de Supervisão da ADSE se limite a debitar publicamente, depois de demorados conciliábulos, o agravamento draconiano da idade de 65 para 60 anos, como data limite para inscrições de novos cônjuges, deixando em dúvida se a exclusão de inscritos, em data anterior à publicação da legislação em causa, é para se manter.
E se for esse o caso, responsabilizar os seus autores por depressões graves em velhos e doentes, em grande sofrimento por esta verdadeira epidemia do nosso tempo que reforça o conselho do médico psiquiatra brasileiro, Augusto Cury: “Nunca desprezes as pessoas deprimidas. A depressão é o último estágio da dor humana”.
Finalmente, por considerar que se trata de importantes questões de natureza social, por atingirem pessoas velhas e doentes, por vezes, em situações em que, como sói dizer-se, se vão os anéis para ficarem os dedos, “no uso da licença da liberdade de quem não pede favor senão justiça”, como foi hábito de vida do padre António Vieira, submeto-as , como “ultima ratio”, à consideração de Vossa Excelência.
Respeitosamente,
Rui Baptista
Excelência:
Auferindo minha mulher uma pequena pensão da Segurança Social, de cerca de metade do ordenado mínimo nacional, após 12 anos contributivos, em ofício datado de 17 de Outubro de 2016 da ADSE é informada da inviabilização da respectiva manutenção de cônjuge de beneficiário titular, tendo como suporte a disposição do artº. 7.º do Decreto-Lei 118/83, de 25 de Fevereiro, na redacção do Decreto-Lei n.º 234/2005, de 30 de Dezembro.
Em 2 de Dezembro de 2016, “ipso facto”, endossei uma exposição à ADSE em que apresentei um relatório médico, emanado do Centro de Reabilitação Rovisco Pais, atestando a sua “necessidade de vigilância médica e tratamentos constantes por tetraplegia incompleta secundária a mielomalacia”. Reportava-se a essência da questão da supracitada exposição em saber se esta determinação se aplicava, apenas, a futuras inscrições sem efeitos retroactivos, não abrangendo, consequentemente, o caso de minha mulher inscrita na ADSE, desde o ano de 1975, na sua qualidade de cônjuge de benificiário titular.
Embora reconhecendo a minha falta de conhecimento “quantum satis” em evocar direitos adquiridos, por ausência de estudos académicos da área da jurisprudência, como tal, apenas como amador ( aquele que ama), em matéria tão complexa e controversa entre os próprios especialistas , mas, por outro lado, sentindo o desconforto de expectativas anteriores criadas e depois goradas numa altura da vida “com pesares que ralam na aridez e secura de uma desconsolada velhice”, em citação de Garrettt, recuso-me a cruzar os braços perante uma situação que mereceu da minha parte acerba crítica em quatro artigos de opinião publicados neste jornal, a saber: “A ADSE e as gorduras do Estado” (05/11/2016); “O Partido Socialista, a ADSE e a ‘praga cinzenta’” (14/09/2017); “A ADSE e o ‘soberaníssimo bom senso’ preconizado por Antero” (29/09/2017); “O ziguezaguear da ADSE” (17/10/2017).
Fazendo eu fé de que “o homem livre é aquele que não receia ir até ao fim da sua razão” (Jules Renand), predispus-me a escrever esta “Carta Aberta” a Vossa Excelência, com respaldo no vosso humanismo em defesa dos que sofrem, para lhe dar conhecimento público da injustiça representada pela impossibilidade de inscritos continuarem com o estatuto de cônjuges de beneficiários titulares na parte derradeira de suas vidas.
Desde a publicação desta legislação até à sua aplicação mediaram 33 anos, quiçá, pelo receio de ela poder vir a ter reflexos negativos em posteriores eleições nacionais, até que, em euforia do estado de graça do Partido Socialista, foi ela despertada do seu estado de letargia despejando para um Serviço Nacional de Saúde, a rebentar pelas costuras, nova “clientela” originária de vários subsistemas de saúde convencionados. E este “statu quo” é tanto mais insólito por não se tratar de acudir a fogos de uma ADSE em falência.
Uma auditoria anterior do Tribunal de Contas denunciou que o “Governo está a financiar à custa da ADSE por os funcionários públicos estarem a pagar mais 228 milhões de euros do que seria necessário” (“Expresso”, 17/07/2015). Tempos antes, noticiava o semanário Sol (18 de Julho de 2015 ) haver doentes que tem de recorrer a consultas privadas de Dermatologia por elas poderem levar anos a serem feitas no Serviço Nacional de Saúde.
O que constatamos nós, hoje? Com o título, “Tutela ‘falseou’ tempos de espera nos hospitais” é noticiado aí que o acesso a consultas e cirurgias piorou nos últimos três anos e que , entre 2014 e 2016, mais de 27 mil doentes ficaram em lista de espera por uma cirurgia e mais de 2600 morreram antes de serem operados (Público, 18/10/2017). “Ergo”, quantos ex-cônjuges de beneficiários titulares terão que entregar a alma ao Criador por passarem a ser novas vítimas deste calamitosa situação, numa altura em que o Conselho Geral de Supervisão da ADSE se limite a debitar publicamente, depois de demorados conciliábulos, o agravamento draconiano da idade de 65 para 60 anos, como data limite para inscrições de novos cônjuges, deixando em dúvida se a exclusão de inscritos, em data anterior à publicação da legislação em causa, é para se manter.
E se for esse o caso, responsabilizar os seus autores por depressões graves em velhos e doentes, em grande sofrimento por esta verdadeira epidemia do nosso tempo que reforça o conselho do médico psiquiatra brasileiro, Augusto Cury: “Nunca desprezes as pessoas deprimidas. A depressão é o último estágio da dor humana”.
Finalmente, por considerar que se trata de importantes questões de natureza social, por atingirem pessoas velhas e doentes, por vezes, em situações em que, como sói dizer-se, se vão os anéis para ficarem os dedos, “no uso da licença da liberdade de quem não pede favor senão justiça”, como foi hábito de vida do padre António Vieira, submeto-as , como “ultima ratio”, à consideração de Vossa Excelência.
Respeitosamente,
Rui Baptista
2 comentários:
Senhor professor Rui Baptista, fez bem em escrever esta carta. A sua intervenção é também uma luta pela verdade "... a verdade de que a infelicidade não é a base imutável da vida, mas sim uma ignomínia que os homens devem e podem varrer para longe deles"
(Gorki).
Todos sofremos, das mais variadas formas, sabemos que o Presidente da República é sensível a muitas situações de natureza como a que apresenta - o Governo, (os boys), Não! Infelizmente.
Cumprimentos,
Meu Caro Engenheiro: Que bem me soube o lenitivo das suas palavras reconfortantes num mundo egoísta em que cada um vive isolado nas suas dores de tremendas injustiças sociais. Bem haja, meu Amigo!
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