Artigo meu e de José Eduardo Franco que acaba de sair na Revista Clube do Coleccionador dos CTT anunciando a saída próxima do livro, ricamente ilustrado, com o mesmo título.
A Companhia de Jesus, criada em 1534 pelo basco Inácio de Loiola (1491-1556), exerceu uma influência modeladora não só na Igreja como na sociedade em geral, incluindo a política, o comércio e a cultura, desde o alvorecer da modernidade. Portugal foi o primeiro país a acolher a nova ordem, logo no primeiro ano da sua aprovação pelo Papa Paulo III (1540), e a dar-lhe, ao mais alto nível, um apoio que se revelou decisivo para a sua afirmação na Europa e nos espaços ultramarinos abertos à missionação. Mas Portugal foi também o primeiro reino a expulsar de forma impiedosa os Jesuítas, em 1759 pela mão do Marquês de Pombal, processo que conduziu à sua extinção mundial pelo papa Clemente XIV (1773). Essa medida extrema veio a ser retomada outras duas vezes nos séculos seguintes: em 1834, no quadro da restauração do Liberalismo, e em 1910, pela 1.ª República. No entanto, a Companhia de Jesus conseguiu regressar sempre e reconstituir-se com notável rapidez e eficácia por cima das suas ruínas, deixando uma incontornável marca em importantes domínios da vida do país.
A Companhia de Jesus, criada em 1534 pelo basco Inácio de Loiola (1491-1556), exerceu uma influência modeladora não só na Igreja como na sociedade em geral, incluindo a política, o comércio e a cultura, desde o alvorecer da modernidade. Portugal foi o primeiro país a acolher a nova ordem, logo no primeiro ano da sua aprovação pelo Papa Paulo III (1540), e a dar-lhe, ao mais alto nível, um apoio que se revelou decisivo para a sua afirmação na Europa e nos espaços ultramarinos abertos à missionação. Mas Portugal foi também o primeiro reino a expulsar de forma impiedosa os Jesuítas, em 1759 pela mão do Marquês de Pombal, processo que conduziu à sua extinção mundial pelo papa Clemente XIV (1773). Essa medida extrema veio a ser retomada outras duas vezes nos séculos seguintes: em 1834, no quadro da restauração do Liberalismo, e em 1910, pela 1.ª República. No entanto, a Companhia de Jesus conseguiu regressar sempre e reconstituir-se com notável rapidez e eficácia por cima das suas ruínas, deixando uma incontornável marca em importantes domínios da vida do país.
Os
Jesuítas são uma das instituições mais fascinantes e também mais controversas da
história da Igreja e do mundo nos últimos 500 anos. Não admira por isso que se
tenha tornado uma das ordens religiosas mais estudadas em escolas ocidentais,
onde de resto muitos dos seus membros pontificaram. Esses estudos vão desde a
história religiosa até às ciências exactas e naturais (matemática, física,
biologia, etc.), passando pela antropologia, linguística e filosofia. Por outro
lado, são frequentes os romances, peças de teatro e filmes em cujo enredo
entram personagens ou eventos da Companhia de Jesus. Os Jesuítas têm inspirado
criações artísticas condimentadas com mistérios, onde entram tanto a figura do
herói e santo como a do conspirador e demónio.
De
facto, não se pode estudar a história da cultura, incluindo a religião, a
ciência, a filosofia, a literatura e a arte em geral, sem levar em conta os contributos
dos Jesuítas. Os padres da Companhia estiveram nos centros de muitas decisões, transformações
e recomposições sociais e políticas desde o início da modernidade. Eles foram
obreiros do primeiro processo de globalização, ao colocarem em contacto povos e
culturas até então afastados. Os religiosos da Companhia tornaram-se em poucas
décadas educadores de elites europeias e transeuropeias, exploradores de
regiões desconhecidas e missionários que levaram a doutrina cristã a paragens
longínquas. Foram conselheiros de reis e príncipes europeus, como ainda cientistas,
comerciantes, diplomatas e escritores ligados aos imperadores da China e do
Japão e a outros senhores gentios. Conheceram novas terras e novas gentes,
tanto nas selvas e montanhas americanas, como nas savanas e estepes africanas,
como ainda nos imensos territórios do sudoeste asiático, tendo sido os primeiros
europeus a chegar aos cumes do Tibete. Através de uma prática cuidadosa e persistente
de observação e escrita e de uma rede de correspondência que cobria todo o
mundo, ergueram aquela que pode ser considerada a primeira base de dados global
sobre povos, culturas, línguas, religiões, hábitos e costumes, minerais, fauna
e flora. Os Jesuítas participaram na dinâmica da globalização que os
Descobrimentos abriram e contribuíram, com as suas recolhas sistemáticas, para
a grande revolução do conhecimento que então se começou a operar.
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Foi
o rei D. João III que abriu aos Jesuítas as portas do mundo. Num século em que
Portugal detinha um império marítimo polvilhado de fortalezas e feitorias, foi
no nosso país que eles encontraram o adequado acolhimento para se lançarem na
sua aventura de evangelização planetária. Com efeito, o rei português ofereceu
à Companhia de Jesus uma plataforma de lançamento que lhe permitiu tornar-se na
ordem religiosa que melhor respondeu aos desafios das relações entre povos
distantes.
Em
Portugal, como por toda a Europa e mesmo fora dela, foi enorme a produção
escrita e iconográfica sobre os Jesuítas desde o século XVI. Semelhante
interesse e até, por vezes, obsessão em produzir conhecimento e opinião sobre estes
religiosos será apenas comparável ao que ocorreu em torno dos Judeus, cujo
processo de diáspora é bem conhecido. Aliás, Jesuítas e Judeus foram duas
elites que marcaram a história portuguesa e internacional e que acabaram por
experimentar crítica, perseguição e expulsão. Ainda hoje está por fazer uma avaliação
rigorosa das consequências para o nosso país da expulsão em tempos e em
circunstâncias diferentes, mas ambos cruciais na história tanto de Portugal
como da Europa, destes dois grupos qualificados e empreendedores.
Em
Portugal, a imagem construída pelos escritos sobre Jesuítas fizeram deles em
certos momentos meios de explicação do atraso do país após os Descobrimentos. O
poder de transformação sociocultural, política e religiosa atribuído a Jesuítas
originou, aliás, teorias da conspiração. De um lado da barricada, existe a
literatura dos apologistas, que valorizam a exemplaridade cristã e social da
Companhia. Do outro preponderou uma imagem negativa que, emergindo do tom negro
da literatura pombalina, passou para o discurso antijesuítico de liberais e
republicanos, que apresentaram os inacianos como causadores do obscurantismo e
da decadência nacionais.
Até
ao dealbar do século XX, enquanto não ganhou proeminência num conhecimento
desapaixonado dos Jesuítas, revelou-se difícil encontrar análises equilibradas
a respeito do seu papel na história dos últimos 500 anos. Mas hoje ninguém nega
que os padres da Companhia deixaram uma marca indelével na história, embora
naturalmente os vários autores divirjam, por vezes na avaliação da sua acção, a
começar logo pelos desígnios que estariam na base do seu protagonismo.
Não
faltam edições, algumas com a melhor qualidade, sobre os Jesuítas, em
particular, sobretudo nas últimas décadas, monografias sobre figuras, temas e
certos períodos da história da Companhia. Todavia, parece haver um certo pudor
em propor uma releitura geral da história destes religiosos que apareceram com
a modernidade. O livro Os Jesuítas:
Construtores da Globalização, agora editado pelos CTT, procura fazer um
resumo da sua acção mais proeminente. Inácio de Loiola tinha a intenção de
reformar a vida religiosa da velha cristandade, dando um impulso à Igreja que,
no início do século XVI, se debatia com a questão da rotura protestante. Mas,
ao mesmo tempo, confrontou-se com as oportunidades oferecidas pelas viagens
marítimas de portugueses e espanhóis. Fundados num tempo crucial da história
mundial, os Jesuítas procuraram com invulgar dinamismo invulgar novos
horizontes. Pesem embora todas as contradições, não há dúvida de que o conseguiram.
José Eduaqrdo Franco e Carlos Fiolhais
José Eduaqrdo Franco e Carlos Fiolhais
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