Meu artigo de opinião saído hoje no "Público:“Deve ou não o Ministério da Educação subsidiar escolas privadas que são frequentadas por meninos ricos, cujos pais têm dinheiro? Para que é que o Estado está a subsidiar?” (Maria Filomena Mónica, "Jornal i", 29. Agosto. 2015).
Tendo como pano de
fundo as duas perguntas formuladas, em
epígrafe, pela académica de Sociologia
Maria Filomena Mónica “que fez da
educação uma questão central do seu estudo por acreditar num mundo que se pode
abrir a partir da escola” (Anabela Mota Ribeiro, “DN”/2004), reporto-me a um artigo de Luís
Marinho, dirigente do “SOS Movimento
Educação”, em defesa estrénua (mas que
eu me atreveria a ter, como diria Fialho, “como espadeiradas na água”) das escolas
com contrato de associação com um trocadilho de mau gosto a servir de título: “A educação deu à Costa” (PÚBLICO,
30/08/2015).
Esta uma das
possíveis razões para que se discuta, a contrario sensu, a educação não superior dos nossos
jovens, segundo Luís Marinho, através “da liberdade de escolha da escola por ser talvez
a última das liberdades que há ainda para alcançar em Portugal”. E, segundo
ainda ele próprio, em “desrespeito pela
Constituição da República Portuguesa, que desde sempre reconheceu o seu valor e
defendeu a sua existência”. Pelo que se subentende, referindo-se à
existência de escolas privadas com contrato de associação.
Colhendo exemplo em Eça, “debutante de coxia” que me considero, desde já, confesso a minha dificuldade em me enredar na teia de complexos articulados constitucionais, e, ipso facto, discutíveis interpretações da Constituição da República Portuguesa remetendo-as, em consequência, para o seu lugar de eleição: o Tribunal Constitucional.
Colhendo exemplo em Eça, “debutante de coxia” que me considero, desde já, confesso a minha dificuldade em me enredar na teia de complexos articulados constitucionais, e, ipso facto, discutíveis interpretações da Constituição da República Portuguesa remetendo-as, em consequência, para o seu lugar de eleição: o Tribunal Constitucional.
Facto, todavia, não
impeditivo que me tenha debruçado sobre o nº 1 do respectivo artigo 75.º: “O Estado criará uma rede de
estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a
população”. Ou seja, hic opus labor est (aqui
é que começam os trabalhos e na linguagem popular “aqui é que a porca torce o rabo”!). O mesmo vale dizer que os
contratos de associação só encontram justificação em sítios em que o Estado não
tenha capacidade para fazer essa cobertura, nunca em sítios parede meias em que haja escolas
estatais. Isto é, em mera satisfação da doxomania de progenitores
com carteiras bem recheadas num país em
dificuldade para satisfazer necessidades da terceira idade com reformas baixas,
de pessoas desempregadas em busca desalentada de novo emprego ou de uma juventude à procura desesperada de
um primeiro emprego.
Na minha ignorância
em deambular por corredores percorridos profissionalmente por trajes talares
(becas), resta-me o dever de cidadania de discutir estes assuntos com as vestes
modestas da minha participação pública na discussão entre escolas estatais e
escolas privadas com contrato de associação. Apresento-me, como tal, com credenciais de dois artigos meus de opinião
saídos no “Público”: “Ensinos oficial, convencionado e privado” (13/11/2013) e “Suspeitas
sobre os colégios do grupo de ensino GPS” (11/02/2014). E, em acrescento,
uma reposta, que tenho como premonitória
(por ter sido publicada dias antes do artigo de Luís Marinho), a um comentário que me foi feito no blogue De Rerum Natura (25/08/2015). Transcrevo-a:
“Desde já, não posso deixar de lamentar que a frequência das escolas públicas tenha diminuído drasticamente, havendo nelas inúmeras vagas por preencher. Entretanto foram feitas obras faraónicas/socráticas em algumas escolas estando outras, as de maior tradição, a cair aos bocados. Um exemplo? O antigo Liceu Pedro Nunes (Lisboa) onde fez o ensino secundário o actual ministro da Educação e outras figuras de proa da política ou vida profissional portuguesas. Outro exemplo? O Liceu Camões (Lisboa) que, anos atrás, se viu obrigado a promover espectáculos públicos (salvo erro no Coliseu dos Recreios) para angariar fundos para evitar que continuasse a chover nas salas de aula e nos corredores. Outro exemplo, ainda? O antigo Liceu D. João III, actual Escola Secundária de José Falcão (Coimbra)”.Neste entreacto, vão-se construindo escolas privadas (com contrato de associação) pelo país fora. Por benemerência dos seus proprietários? À espera não de lucros, mas de uma comenda por altos serviços prestados aos seus semelhantes? A resposta pela negativa parece óbvia!
Não será altura de
dizer basta a escolas públicas com uma
frequência diminuída, por vezes, pela concorrência do ensino privado com
contrato de associação e diminuição da
natalidade, pese embora o actual alargamento da escolaridade obrigatória até ao
12.º ano? Não será altura, ainda, de
dizer basta a professores com horário zero em demanda, com a trouxa às costas e
longe da família, de uma colocação a
centenas de quilómetros de distância de casa?
No jeito bem
português de denegar o provérbio “em Roma
sê romano”, buscam-se exemplos de aparente sucesso em países escandinavos, bem mais ricos que este
ocidental canto ibérico, com escolas
privadas com contrato de associação. Mas também neles, particularizando o
exemplo da Suécia, o sistema encontra-se em evidente declínio. Segundo, Jonas
Sjöstedt, líder do Partido de Esquerda da Suécia, e potencial parceiro da
coligação num futuro governo de centro-esquerda, “os suecos acreditavam que a desregulação era a solução para tudo, da
gestão dos caminhos de ferro à educação dos filhos, mas isso acabou: há partes
da nossa vida que o mercado não pode preencher. E aponta o dedo às organizações
com fins lucrativos, considerando-as responsáveis pela crise que se abateu
sobre o país – a que os suecos chamam ‘o choque de Pisa’”. E maís
acrescentava: “Não estão nisto por
gostarem dos miúdos ou por estarem interessados na educação. Estão nisto porque
querem fazer dinheiro rapidamente” (“Diário Económico”, 06/09/2012).
Em resumo, a
concluir-se, ainda que ab absurdo, que as escolas com contrato de associação são
melhores que as escolas estatais corre-se o risco em defender um ensino diferenciado
(ou mesmo elitista) em função do estatuto sociocultural e económico dos
progenitores dos alunos e possibilidade
de sua selecção de entrada.
Diz o ditado que “nas costas dos outros lemos as nossas”. Mas há quem esteja mais interessado em ler o que serve os seus interesses de mercado pondo em cheque esperançosas palavras de Almeida-Negreiros: “Os dias terríveis são, afinal, as vésperas dos dias admiráveis”.
E se, como defendeu
Jean Jaurès, “atingir o ideal é
compreender o real”, torna-se urgente “um
debate sério sobre a educação em Portugal”, como defendeu no seu artigo, prenhe de razão, Luís Marinho. Justiça seja feita a este seu apelo público em que
eu, neste meu texto, embora concordante, não pude deixar de assumir papel
antitético pelo respeito que me merece o ensino público na formação de valiosas
gerações de camadas mais jovens de portugueses.
2 comentários:
Muito bom! Veja também este artigo que também responde ao de Luiz Marinho:
http://www.publico.pt/portugal/noticia/a-falacia-da-liberdade-de-escolha-na-educacao-deu-a-costa-1706487
Obrigado pelo seu comentário. Este meu artigo veio na sequência de dois outros meus publicados no Público(como aliás já referi) e outros saídos aqui no DRN.
Não posso tolerar que se esteja a destruir a Escola Pública para das suas cinzas florescer o negócio das escolas privadas com contrato de associação. Choca-me a passividade dos estabelecimentos de ensino público perante este ataque constante e insidioso que lhe é feito de baionetas caladas à luz do dia. Como escreveu alguém, não fazer é deixar que outros façam por nós.
Os impostos pagos por todos nós, cidadãos, deveriam ter aplicação que servisse os interesses nacionais, nunca os interesses mercantis de uns poucos. É com desgosto que o escrevo por me ter como um homem de direita que pouco-a-pouco se vai desiludindo...
Cordiais cumprimentos,
Cumprimentos
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