Meu artigo de opinião saído hoje no Público, adaptado do meu post, publicado no DRN (16/07/2015), titulado “Uma campanha (pouco) alegre para universitar os politécnicos”:
“Parece muito evidente ser um erro entender a transformação
histórica de institutos politécnicos em universidades, como se de uma promoção
se tratasse” (Adriano Moreira, Seminário
“Reflexos da Declaração de Bolonha”, 12/11/2004).
Nos dias de
hoje, assiste-se a uma campanha orquestrada pelos politécnicos de Coimbra,
Lisboa e Porto que tenta pôr em causa o sistema dual de ensino superior por os
seus dirigentes, em vez de dignificarem o estatuto de ensino politécnico que
representam, procurarem veredas esconsas que o conduzam a estatuto
universitário.
Em década anterior, Rui Antunes, ao tempo
vice-presidente do Instituto Politécnico de Coimbra, vestindo a beca de defensor
oficioso dos dinheiros públicos, argumentava que “a Universidade faz o mesmo que o Politécnico, embora este último com
bem menores meios financeiros” (“Diário de Coimbra”, 10/01/2005).
Deste jeito,
eram tecidas críticas a uma política em que
se gastava mais para ter o mesmo. A ser correcta esta análise económica, o
Tribunal de Contas teria, pela certa, chamado a atenção, ou mesmo emendado a
mão, dos perdulários responsáveis por um ruinoso statu quo de esbanjamento dos cofres do Estado, ainda que mesmo época de vacas gordas. Quanto
mais em época de vacas magras!
Recentemente, Joaquim Mourato, presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores
Politécnicos, declarou que a estratégia do órgão tutelar a que preside “tem sido no sentido de aprofundamento da
diferenciação de missões”. Em total discordância, Rui Antunes, quiçá, procurando retirar os institutos politécnicos do
anátema do nome da pia baptismal, em crisma purificadora que lhes dê o nome de
universidade, fez-se doutrinador do sistema de ensino superior das margens do
Mondego, propondo atribuir à actual
Universidade de Coimbra uma “vocação
internacional” e a uma futura universidade, resultante do Instituto
Politécnico de Coimbra, “ uma vocação
mais regional”.
E o que diz a
universidade a tudo isto?
O presidente de
Reitores das Universidades Portuguesas, António Cunha, não se exime em declarar: “Temos sempre defendido um aprofundamento
do sistema binário e uma maior diferenciação entre os sistemas” [universitário
e politécnico].
Entrementes, com
destaque de título a página inteira, era noticiada a posição do Ministério da
Educação e Ciência: ”MEC recusa acabar
com distinção entre universidades e politécnicos” (“Público”, 08/07/2015).
Apesar desta tomada
de posição em esferas governamentais, tomando em linha de conta a confusão constante
estabelecida entre democratização e mediocratização do ensino superior, a
instituição universitária deve continuar a assumir, sem quaisquer
tréguas, o papel de guardiã esforçada dos portões de um saber universal, em contexto
de elevada qualidade e numa tradição multissecular.
Devia ser assim,
mas nem sempre assim tem sido! A realidade é bem outra: uns tantos licenciados universitários
na docência politécnica, em apostasia à sua formação académica, mostram-se estrénuos
defensores, ou simplesmente solidários, com a intenção em transformar o ensino
superior politécnico em ensino universitário.
Porque, como li
algures, não fazer é deixar que outros façam por nós, este statu quo pede a vigilância constante e atenta da corporação
universitária em defesa da clarificação dos objectivos dos dois subsistemas do
ensino superior, hoje, deficientemente definidos em articulados legais sujeitos
a variadas interpretações no que respeita às finalidades de ambos. Situação esta
que me traz à lembrança um texto do escritor Bio Barojo em que um ministro
espanhol dirigia a seguinte advertência ao seu secretário: “Senhor Rodriguez, veja lá se a lei está redigida com a necessária
confusão!”
E porque, na vox populi, ”a esperança é a última a
morrer”, tenho esperança que, retirando a venda dos olhos, a Justiça, através do governo a sair das próximas
eleições legislativas, atribua à universidade o que é da universidade e ao politécnico o que
é do politécnico, não permitindo, consequentemente, qualquer tipo de ceifa do politécnico em seara
universitária. Ou seja, como estipulava
o princípio de Eneo Ulpiano, jurista da Roma
Antiga: Suum cuique tribuere (Dar a
cada um o que lhe pertence)!
2 comentários:
Nunca se deverá tirar a venda à Justiça. Veja, Professor, a Justiça só pode ser feita ao nível do abstrato. A venda simetriza o abstrato das partes envolventes obrigando-as a situarem-se na mesma plataforma imparcial e objetiva, condição indispensável ao justo juízo. Se tirarmos a venda à Justiça, ela verá tudo, em contexto real, ao mais ínfimo pormenor e confundir-se-á, subjetivamente, vendando o juízo com o tecido do olhar.
Neste caso, ser cego é ver melhor.
Obrigado pelo seu comentário. De futuro, não cometerei este erro interpretativo sobre a venda nos olhos da Justiça. Cumprimentos gratos.
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