Meu artigo no Público de hoje:
Escreveu-me em carta aberta neste jornal Telma de Gonçalves Pereira, a propósito do meu artigo “Ciência Diluída”. Começa por me informar
que a homeopatia é antiga. Bem, a crítica é tão antiga como ela. Camilo Castelo
Branco, que estudou medicina, escreveu com ironia: “Não duvidava assegurar-me que dez gotas de nux lançadas das Berlengas
ao mar podiam converter o oceano num remédio bom para dores de estômago, de
cabeça e outras.”
Diz que a homeopatia actualmente “é indicada” em vários
países, entre os quais Portugal. Não sei o que quer dizer com isso, há sempre
quem “indique” as coisas mais absurdas. Se, no caso do nosso país, se está a
referir às recentes portarias que regulamentam o exercício de terapias
alternativas, concedo que o efeito dos grupos de pressão fora da ciência não é
nada diluído. Sobre a cultura científica dos políticos portugueses e sobre a
sua permeabilidade a influências já todos nós sabemos. Mas nada disso substitui
as provas científicas, e estas mostram que os remédios homeopáticos são
belíssimos placebos, nada mais. Claro que há alguns ensaios clínicos enviesados
que podem dar a ideia contrária, pois há asneiras em todo o lado, até na
ciência. Se esses ensaios fossem credíveis, a homeopatia não era alternativa
mas sim mainstream. Ou acha que há
milhões de cientistas em todo o mundo que, de modo conspirativo, querem
esconder a enorme eficácia da homeopatia? De resto, vender remédios
homeopáticos é um óptimo negócio para as farmacêuticas e, se de facto
funcionassem, seria ainda melhor. Seria bom não só para elas mas também para
todos nós.
Fala-me no efeito de pequenas dose de radiação. O problema
da homeopatia é que não tem pequenas doses: não tem dose nenhuma. Como
porventura sabe, o efeito de menos do que um fotão é nenhum. O efeito de menos
do que uma molécula também é nenhum.
Termina oferecendo-me uma consulta e eu fiquei na dúvida se
será consigo. Estou bem, obrigado, mas se tiver algum problema não irei decerto
a um “médico homeopata”, que me parece uma contradição nos termos. Aliás, acho
muito estranho que a Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de
Lisboa, onde se formou e onde ensinou (e onde também se formou e ensina o
actual Presidente da Fundação para a Ciência e Tecnologia), albergue ideias ou
práticas homeopáticas. Não foi isso decerto o que aprendeu e ensinou na
Faculdade.
Desejo-lhe muita saúde, pelo menos tanto quanto a que vou
tendo,
Carlos Fiolhais
13 comentários:
"o efeito de menos do que um fotão é nenhum"
Homeopatia à parte, seria bom não dar pontapés na Física dos Quantas. Não existe o efeito de menos do que um fotão, pois o fotão é o agente mínimo (não existem fracções de fotão).
Penso que era precisamente essa a ideia...
Em primeiro lugar a frase surge como uma afirmação do próprio. Em segundo lugar uma diluição de um para mil (? é mais?) é diferente de menos de um fotão. É comparar duas coisas diferentes. Num caso o efeito prático de tal diluição, noutro a impossibilidade teórica de existir um agente. Por fim, o "efeito de menos de menos de uma molécula é também nenhum" é uma afirmação falsa. Atacar a homeopatia agredindo elementos basilares da física não parece ser grande via de argumentação. É simplesmente entrar no campo do adversário e deitar no lixo o rigor.
Toda a gente sabe que a Doutora Telma Gonçalves Pereira fez o doutoramento na Universidade Lusófona onde foi colega de estudos do Doutor Miguel Relvas.
Numa altura em que aparecem profissionais da prática e do próprio ensino da Medicina Académica ou Alopata a defenderem a Homeopatia, seria de interesse pronunciar-se a Ordem dos Médicos sobre esta controversa temática.
Adenda: "a defenderem a Homeopata", acrescento: "a defenderem e a praticarem a Homeopatia".
:) quando eu era criança havia quem usasse azeite morno para tratar as otites...
Claro, não havia dinheiro para médicos e muito menos para os medicamentos...
Era a alternativaà medicina
No entanto ela move-se.
Onde terá sido dito?
Em que condições?
A Homeopatia é.
Logo se existe terá de ser equacionada.
Mas reconheço a dificuldade em ser formulada a equação, de todas as partes envolvidas.
Factos são factos e devem merecer ponderação séria.
Não se entende tanta birra com a Homeopatia.
A questão até pode parecer interessante em provocar dialogo, mas não certamente com as "certezas" que cada parte defende.
Não é por ser "praticada por Médicos que a Homeopatia terá mais ou menos créditos.
Mas sim por ser Bem Praticada.
Como é possivel funcionar?
Sei lá, mas o CERNE também procura respostas.
Se funciona claro que sim e sem ser sugestão de forma alguma.
Não basta afirmar a impossibilidade para se ter a certeza do impossivel.
Att
Fernando Neves
Não se entende tanta birra contra Ptolomeu.
Pois, como diz o outro anónimo tudo tem um grão de verdade de Ptolomeu a Copérnico.
Não há birras com Ptolomeu. Ptolomeu é brilhante, talvez um génio ao nível de Newton.
O problema é que não é nada claro que funcione. O que há são relatos a dizer que funciona, mas isso não é nada. Há relatos do Adamastor e do chupa-cabras...
Foram tentadas várias experiências, a grande maior parte não confirma a hipótese. As poucos que suportam a hipótese da homeopatia funcionar nunca foram replicadas, ou seja têm pouco ou nenhum suporte científico.
Coloca-se sempre a hipótese académica de haver algo que ainda não foi descoberto, mas neste caso não há nada que sugira que haja um mecanismo novo a ser descoberto que permita a homeopatia.
Por fim, é intelectualmente pouco satisfatório o processo de trabalho das pessoas que defendem a homeopatia. Primeiro inventam as regras segundo as quais a homeopatia funciona (like cures like e quanto mais diluído melhor). Estas regras surgiram do nada, e agora tenta-se investigar para arranjar suporte para essas regras inventadas à sorte.
A homeopatia só será credível se e quando apresentar: 1 - a composição das moléculas das suas gotas milagrosas; 2 - o método utilizado para a dosagem aconselhada; 3 - a eficácia comprovada em casos suficientes (mil?) para ser aceite como tal. De outro modo, será um diálogo de surdos ou um "eu digo que sim, tu dizes que não".
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