Transcrevemos o artigo de opinião de Maria Regina Rocha, publicado no sítio do "Sol", e que surge na sequência de outro publicado no De Rerum Natura.
A solução: 12 verdades para um ensino de qualidade em Portugal
Estamos em 2008, no século XXI, e não nos idos anos 70 do século passado: a experiência de todos estes anos leva-nos a considerar que é preciso ter a coragem de dizer 12 verdades, se queremos realmente que se faça uma reforma na Educação, para que haja um ensino de qualidade.
1.ª – O ensino unificado (5.º ao 9.º ano) não serve. Deveriam existir, pelo menos, dois currículos (eventualmente três), um deles com uma maior componente técnica, currículos diferentes não só no que respeita ao número, natureza das disciplinas e carga horária das mesmas como aos respectivos programas.
2.ª –A ausência de reprovações não responsabiliza nem alunos, nem pais, nem professores e compromete negativamente toda a aprendizagem dos alunos com dificuldades, mas a reprovação por si só também não tem a desejada eficácia. Por isso, a partir do 4.º ano, as disciplinas deveriam ter os programas organizados por níveis de aprendizagem, progredindo o aluno em cada disciplina de ano para ano por níveis, não podendo aceder ao nível seguinte sem o domínio do que é essencial do nível anterior.
3.ª – A abolição dos exames foi um erro. A existência de exames (provas de avaliação externa) com um peso de 50% é essencial para a responsabilização de todos os intervenientes no processo educativo, desde o 4.º ano de escolaridade e a todas as disciplinas (no 4.º, no 6.º, no 9.º no Ensino Básico; em cada disciplina terminal no EnsinoSecundário).
4.ª – Os currículos estão desajustados. É necessário que tenham um número equilibrado de disciplinas, devendo desaparecer do mesmo disciplinas instrumentais como, por exemplo, «Área de Projecto» e «Estudo Acompanhado».
5.ª – Os programas são responsáveis por muitos dos problemas da falta de competência dos nossos alunos. Deveriam ser claros, com os conteúdos muito bem explicitados (nomeadamente quanto ao grau de aprofundamento) e os objectivos muito bem definidos, sendo referidos os graus mínimos de consecução em cada ano.
6.ª – A escala de classificação de níveis de 1 a 5 aplicada do 5.º ao 9.º ano é má, pois propicia o laxismo e não incentiva as realizações dos alunos. Na escala de 0 a 20, um aluno que tenha 10 valores esforça-se e vê o seu esforço recompensado, passando a sua nota, por exemplo, para 12 ou 13, mas, na escala de 1 a 5, o mesmo esforço num aluno que tenha obtido 3 não o faz mudar de nível (continua no 3), o que, naturalmente, o desmotiva.
7.ª – O número de alunos por turma é outro dos problemas: turmas de 24 a 28 alunos não são compatíveis com uma aprendizagem de qualidade no tempo presente. As turmas deveriam ter 20 alunos.
8.ª – Os tempos lectivos de 90 minutos e de 135 minutos não servem. É mais adequado cada aula de uma disciplina ter apenas 50 minutos, havendo um intervalo de 10 minutos entre a aula de uma disciplina e a de outra, para que os alunos possam vir até ao pátio de recreio, respirar fundo, falar à vontade, correr, brincar, ir à casa de banho, voltando para a aula seguinte com a capacidade de concentração e de trabalho renovada (exceptuam-se, naturalmente, as disciplinas de cariz laboratorial: 50 minutos + 50 minutos).
9.ª – O absentismo dos alunos e a indisciplina são factores que comprometem a sua aprendizagem. O recente estatuto do aluno não foi feliz nas soluções propostas. É fundamental a incidência da responsabilização nos alunos e nos pais e encarregados de educação.
10.ª – A formação inicial de natureza pedagógica e de natureza didáctica deveria obedecer a directrizes muito claras da responsabilidade do Ministério da Educação, nomeadamente a indicação das disciplinas de pedagogia, das de didáctica e seu conteúdo (por exemplo, em Português, como se ensina o aluno a desenvolver a competência de leitura ou a competência de escrita, entre outras), bem como dos aspectos a ter em conta no estágio, uniformemente em todo o país.
11.ª – A formação contínua tem sido muito heterogénea. Também aqui deveria haver uma intervenção directa do Ministério da Educação no que respeita aos objectivos e conteúdos, bem como à organização e à qualidade.
12.ª – A avaliação de professores deve ser feita tendo como referente um perfil de bom professor no quadro dos grandes objectivos do Sistema Educativo – definido pelo Ministério da Educação, e não deixado ao arbítrio de cada escola, com o pretexto da autonomia. A Educação é um desígnio nacional: a tutela não pode alhear-se desta responsabilidade.
Maria Regina Rocha
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
CARTA A UM JOVEM DECENTE
Face ao que diz ser a «normalização da indecência», a jornalista Mafalda Anjos publicou um livro com o título: Carta a um jovem decente . N...
-
Perguntaram-me da revista Visão Júnior: "Porque é que o lume é azul? Gostava mesmo de saber porque, quando a minha mãe está a cozinh...
-
Usa-se muitas vezes a expressão «argumento de autoridade» como sinónimo de «mau argumento de autoridade». Todavia, nem todos os argumentos d...
-
Cap. 43 do livro "Bibliotecas. Uma maratona de pessoas e livros", de Abílio Guimarães, publicado pela Entrefolhos , que vou apr...
6 comentários:
Concordadíssimo em quase tudo.
Refiro apenas ao ponto 7, em que o número de alunos deveria ser ainda mais reduzido. Pelo menos nas disciplinas técnicas (E. Tecnológica, E. Musical, Laboratórios, E. Dramática, e afins) o número máximo deveria ser 12 alunos.
No ponto 12 deixa-me dúvidas o que é um "perfil de bom professor". Pode-se ser bom professor de inúmeras maneiras diferentes, parece-me injusto tentar impor um modelo de professor que pode funcionar nuns casos e alunos e com outros pode não funcionar. A mesma pessoa, com a mesma matéria e com os mesmos métodos pode ver o seu trabalho resultar excepcionalmente ou falhar redondamente consoante o local, a hora e os alunos que tem.
Gostei, de modo geral, dos tópicos. A minha opinião passa por aqui então:
8) Se por um lado um aluno fica desmotivado, desinteressado, com aulas "gigantescas", uma aula de 50 minutos é ridícula. Toda a gente sabe, e quando digo toda a gente refiro-me a pessoas que já tiveram/deram aulas, que grande parte das vezes as pessoas chegam atrasadas, demoram tempo a entrar na aula e a organizar-se e ainda se é capaz de perder 10 a 15 minutos com conversa fiada. Resumindo de 50 minutos com quanto ficamos?
9) Este ponto é de suma importância. Porquê? Porque as pessoas pensam que é ter um filho, dar-lhe de comer e vestir e vê-lo a chegar a casa ao fim do dia. Quantos pais já eu vi ficarem chateados quando as férias chegam, porquê? Porque têm os filhos em casa. Pegam num filho e querem que seja um docente a educar, ensinar e mais o raio. Têm que ser feito algo em relação ao comportamento animalesco dos alunos. Tem que se compreender que uma coisa são brincadeiras de criança e outras são falta de educação. Começar a ter mão firme nestes casos, poderia facilitar em muito o professor a dar a aula e o próprio aluno a não repetir a faceta.
12) O Musicologo, neste ponto, falou muito bem. Mas que perfil é este? Criado por que génio? Algum ente superior guardado a sete chaves na cave do ME, com certeza.
Rui Peres
Completamente de acordo, em especial com as matérias organizadas por níveis. Na situação actual, em que se passa de ano com 2, 3 ou mesmo mais negativas, os alunos dão-se ao luxo de abandonar completamente uma ou duas disciplinas, com Matemática à cabeça. Porque sabem que não precisam dela para continuar alegremente a sua passagem pela escola. E de ano para ano as matérias "difíceis" vão acumulando peso morto que se arrasta até se livrarem da "coisa". Se não for de outro modo, será pelas Novas Oportunidades, que os alunos invocam amiúde para não fazerem esforço.
O que só demonstra que as "reformas" do ministério da educação incidiram apenas em aspectos superficiais e perfeitamente negligenciáveis em termos de melhoria do sistema.
Estas ideias são um óptimo estímulo para que se considere, com bom senso, o que é necessário fazer para melhorar o sistema de ensino.
Sublinho, particularmente, a importância dos tópicos relativos à duração dos tempos lectivos - que também julgo excessivos -, o desaparecimento de disciplinas que "atafulham" o currículo e, muito importante, a revalorização do papel dos exames nacionais. No fim de cada ciclo e no ano terminal de cada disciplina (secundário). Podem contribuir em muito para a responsabilização de todos os agentes do processo, o que é determinante.
Por fim, a formação dos docentes. É importante que se possa, discutindo este tópico, assinalar a injustiça da actual situação de vastas centenas de docentes (já profissionalizados) contratados (que já estão no sistema há uns anos, desempenharam inúmeras funções enquanto docentes e, segundo legislação desta equipa do ME, têm que fazer exame de acesso à carreira!!! Sendo que essa prova tem carácter eliminatório inaceitável, exemplo: três componentes da prova, o docente alcança 19/19/14 e... já não pode ser professor! Que já é há alguns anos...
Prossigamos a discussão. É urgente.
Saudações,
Luís Vilela.
A discussão é estimulante, mas é pena ser completamente inútil, porque estas questões não interessam minimamente a quem decide.
Veja-se a falta de honestidade do governo, quando veio fazer mais uma alteração ao regime de avaliação de professores, alegando que deram ouvidos às críticas construtivas. Mas demoraram quase 1 ano a ouvir essas críticas, a maioria delas que era já formuladas antes da promulgação do famigerado decreto? Se não querem admitir que foi uma alteração provocada por duas manifestações e uma greve, pelo menos podiam abster-se de alegar desculpas evidentemente desonestas.
Sobre esta temática ver aqui.
Enviar um comentário