sexta-feira, 30 de maio de 2008

Contra o Acordo Ortográfico

Os organizadores do Manifesto em Defesa da Língua Portuguesa entregaram hoje ao Presidente da República pareceres científicos contrários ao Acordo Ortográfico. Notícia aqui.

O Manifesto conta já quase com 50 mil assinaturas, ultrapassando em muito as 4 mil assinaturas necessárias para obrigar legalmente a Assembleia da República a discutir o Manifesto. Note-se que o Presidente da República pode ainda vetar o Acordo Ortográfico, aprovado pela Assembleia da República.

Há dois aspectos diferentes que estão em causa.

O primeiro é puramente linguístico: o acordo propõe mudanças ortográficas absurdas, que retiram poder expressivo à língua, como passar a escrever "veem" quer para dizer que as pessoas vêem os lírios do campo quer para dizer que as pessoas vêm juntas à festa. Quem usa a língua profissionalmente como eu para mais do que comprar batatas sabe que a língua portuguesa já está depauperada tal como está, dada a quase ausência de produção científica e cultural sofisticada em português. Este acordo torna a língua ainda mais pobre e ridícula. Não por causa do "ótimo", que não vejo problema algum em passar a escrever sem "p", mas por muitas outras palermices, como a referida.

O segundo é puramente político: o estado não deve legislar sobre a língua, a não ser que tenha razões muito fortes e claras para isso. Essas razões não existem neste caso. É falso que este acordo unifique a língua, que é o argumento usado pelos seus defensores; é falso que tal unificação, a existir, permitiria uma maior expansão internacional da língua; e é falso que tal unificação facilita a elaboração de documentos burocráticos internacionais. Tudo isto são mentiras políticas para justificar o injustificável.

As verdadeiras razões são outras: os linguistas portugueses que elaboraram este acordo sentem-se em dívida para com o Brasil por causa de todas as divergências que tiveram no passado com os colegas brasileiros. O Brasil, por seu lado, encara o Acordo como uma maneira simples de passar a legislar sobre a língua portuguesa tal como esta é usada em África, coisa que não acontecia até agora, porque os países africanos seguiam a norma portuguesa, e não a brasileira. Ou seja, o Brasil está a assumir-se como potência colonizadora face aos países africanos. No meu entender isto é absurdo: os países africanos devem elaborar as suas próprias normas gramaticais e ortográficas e tipográficas, tal como têm o seu próprio léxico. Isto é exactamente o que acontece com os muitos países que usam a língua inglesa, mas com léxicos, ortografias e normas tipográficas distintas (Inglaterra, EUA, Austrália, África do Sul, etc.). Mas, claro, estamos a falar de países com longas tradições de liberdade, coisa que não acontece no caso do Brasil nem de Portugal, países cujas ditaduras só muito recentemente foram abolidas. E a mentalidade dos linguistas destes países, assim como dos políticos e burocratas, continua ainda firmemente implantada nos tempos da outra senhora.

14 comentários:

Pedro Machado disse...

«passar a escrever "veem" quer para dizer que as pessoas vêem os lírios do campo quer para dizer que as pessoas vêm juntas à festa.»

Isso não é verdade. Continuaria, com o Acordo, a haver distinção. Passar-se-ia a escrever "veem" (os lírios) e "vêm" (à festa). Eu até acho que faz mais sentido "veem" do que "vêem", porque em geral as palavras graves não são acentuadas.

Preocupa-me mais quererem tirar o acento de "pára" que dá muito jeito para distinguir de "para".

A reforma, se fosse adoptada, prejudicaria a língua ao retirar-lhe ainda mais consistência etimológica. Por exemplo, passar-se-ia a escrever "Egito" e "egípcio". Este caminho foi encetado em 1911.

Quanto ao resto, já sabe que concordo inteiramente.

Um abraço
Pedro

Desidério Murcho disse...

Olá, Pedro, obrigado pela correcção! O género de inconsistências de que falas é gritante. No Brasil escreve-se "fato" mas... "factividade"! Isto só de broncos, claro. Na verdade, basta trabalhar com a língua intimamente e consultar vários dicionários para ver incongruências, tolices e disparates que resultam da falta de nível intelectual dos lexicógrafos, linguistas e gramáticos. A patranha que alguns linguistas portugueses andam a contar há décadas sobre o "por que" e o "porque" é puro delírio. Eu seria contra qualquer reforma ortográfica legislada, mesmo que fosse cientificamente sensata e bem pensada. Mas esta reforma ortográfica é a mais tola de todas. Outro exemplo interessante é o "por" e "pôr", em que o segundo desaparece sem deixar rastro... perdão, rasto. E "rastro" continuará no Brasil, ao passo que em Portugal continuará o "rasto", tal como continuamos nós com o "registo" e os brasileiros com o "registro".

Obrigado uma vez mais pela correcção, Pedro.

Graça disse...

Mas... a moda está a pegar... É só ver esta notícia publicada pela embaixada portuguesa no Brasil... (ipsis verbis). Quanto ao Malaca Casteleiro, ambos sabemos o que se diz e de que é acusado...


"Jornal português lança edição baseada no Acordo Ortográfico

O jornal semanário português Independente de Cantanhede ( região de Coimbra, centro de Portugal ) tem a sua última edição, agora nas bancas, redigida de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico.

"Todos os textos apresentam a nova grafia do português, com base nas regras apresentadas no livro "Atual - O novo Acordo Ortográfico", de João Malaca Casteleiro e Pedro Dinis Correia, publicado pela Texto Editora", afirmam os responsávesi do jornal em comunicado enviado à imprensa.

"É o primeiro jornal português, o primeiro documento escrito, redigido de acordo com as novas regras" - disse o director-adjunto da publicação.

Leia mais na Agência Lusa

Publicado pela Embaixada de Portugal - Brasília em 29.5.08"

Freire de Andrade disse...

Absolutamente de acordo. Aliás a minha assinatura também lá foi na petição.
Escrevi no meu blog:
Sou daqueles que acham que o acordo ortográfico foi mal acordado e deveria ainda ser parado. Não porque seja por princípio contra qualquer modificação da ortografia da língua portuguesa, já houve outras alterações ao longo dos séculos e a nossa língua só ganhou em clareza e simplicidade em quase todos as actualizações. Não me imagino a escrever "pharmacia" ou "chimica". Também não é por achar que a uniformização com o português tal como se escreve no Brasil seja um crime de lesa língua. Simplesmente acho que muitas das alterações propostas são disparatadas e nunca deveriam ter sido aprovadas, correspondam ou não à maneira como se escreve no Brasil.
Um dos aspectos que me deixa perplexo é a eliminação de assentos em palavras graves para evitar confusão com palavras homógrafas. Atente-se nas frases, não demasiado forçadas:
«O filho grita: “Pai, pára, pára para eu poder sair do carro.” O pai pára para deixar o filho na escola.»
«O dono passa a mão pelo pêlo do cão, que abana a cauda com prazer.»
Passarão a escrever-se:
«O filho grita: “Pai, para, para para eu poder sair do carro.” O pai para para deixar o filho na escola.»
«O dono passa a mão pelo pelo do cão, que abana a cauda com prazer.»
Acham bem?

Marta Bellini disse...

E pensar que aqui, no Brasil, muitos nem falam e nem escrevem nada. Concordo com os argumentos dos textos.

Marta Bellini
Maringa, Brasil

Malu, disse...

achei , a materia muito importante pois esse lado que mostra os contras do acordo não é mostrado, o acordo vai deixar a lingua com aspecto mais pobre,e essa mudança com certeza vai demorar a se adaptar na vida do falante e do escritor,pode se dizer que a lingua portuguesa vai perder muitos sons!pois ao tiras os tremas e determinados acentos esses sons vão começar a se extinguir,delimitando a variação linguistica.
Maria Luiza e Natalia cyreno. 1ºB

- disse...

Nós tambem nao concordo com a unificação porque uma lingua tao rica quanto a nossa nao pode perder suas regras para justificar algumas coisa que o governo diz ser necesario ate porque depois que uma populaçao ja esta acostumuda com uma lingua é muito difiil deixar suas regras para trás principalmente os mais idosos.

Matheus Brandt e Mariana 1ºB EM

Unknown disse...

A nossa opinião a respeito da unificação é neutra. Existem algumas regras que realmente são desnecessarias e que só usam aqueles que tem muito conhecimento sobre a lingua, mas algumas fariam com que as palavras perdessem seu sentido e sua fonética, tais como o trema do tranqüilo ou o acento de e vêem.
Como tudo, há beneficios e malefícios. A adaptação será, além de muito difícil, demorada. Por outro lado, a unificação tratá facilidade para o contato entre pessoas que falam o português, seja aqui ou em portugal, por exemplo..

laura antunes e renata peregrino - 1ºB

Anónimo disse...

A única regra decente é aquela que retira a trema do português. O resto não presta. Já juntaram mais de 100 mil assinaturas contra esse acordo idiota, e as autoridades não parecem ligar. Tudo porque ajuda a burocracia e os empresários que querem vender seus livros de novo. É uma droga. E eu não vou aderir. Além disso, de quem é a idéia de fazer isso no meio de uma crise mundial?

Unknown disse...

Acho errado isto de "acordo" Por que ACORDO? Quem acordou isto? Já nasceu errado, complicado e mais confuso.
Imaguinem a palavra "Freqüência", deveriamos pronunciar FRECUÊNCIA. Mas e "que" pronunciariamos CUE? A mesma escrita, duas pronuncias diferentes!?
Acho que fica mais complicada última flor do lacio!!!

Jorge Daniel.
Blumenau - SC. Brasil

Anónimo disse...

Pequeno poema em desacordo com o acordo

No passado minhas ideias eram mais acentuadas
Já não são agudas minhas heroicas empreitadas

As pessoas não mais leem de chapéu
Mas ainda se veem os sinais no céu

As arguições de outrora eram mais tônicas
Agora as plateias emudecem, ficam afônicas

A ausência de circunflexo me causa enjoo
A asa foi arrancada e cortada em pleno voo

Eu perdi o traçado da autoestrada
Mas ainda há risco no peixe-espada

Não há quem não trema em consequência
A língua camoniana nunca foi exata ciência

A paranoia me penetra pelos pelos
A escrita carece de frequentes zelos

A escola para para que se averigue e se ajuste
A regra é clara, e que a patuleia não se assuste

Anónimo disse...

Ainda estamos a tempo de parar o acordo, que não é ortográfico , é de hegemonia económica. Concordo que de tempos em tempos se façam adaptações ortográficas, mas não de absoluta sujeição à pronúncia brasileira. Estamos a perder as nossas raízes linguísticas... É HORA DE REAGIRMOS

Anónimo disse...

Esse acordo ortográfico é uma vergonha, que só revela falta de conhecimento de português, nomeadamente de etimologia. Todos os que não téem qualquer conhecimento etimológico, tendem a aceitar esse acordo de grafia corrupta. Os brasileiros, ou melhor, um pequeno grupo de brasileiros começou com essa obra de corromper o português, e agora estes continuam a levar essa obra infame avante. A verdade é esta: esta é uma grafia tortuosa, inventada por aqueles que evidentemente ignoram a origem e constituição das palavras portuguesas, para aqueles que, por falta de conhecimento, estão prontos a aceitar essa aberração. Rejeito esse acordo totalmente, e, comigo, muitos outros também.

LehMay disse...

Esse novo acordo ortográfico é ridículo. Nosso país precisa de várias mudanças, mas a nossa língua e escrita não é uma delas. Sou contra o novo acordo ortográfico, e estou torcendo para que não desanimem e continuem a lutar contra esse acordo enquanto ele ainda não é obrigatório.

"A escola pública está em apuros"

Por Isaltina Martins e Maria Helena Damião   Cristiana Gaspar, Professora de História no sistema de ensino público e doutoranda em educação,...