quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

HOMENAGEM A NUNO FERRAND NO DIA DO RÓMULO EM COIMBRA


 Minha alocução no Dia do Rómulo, 24 de de Novembro, no RÓMULO,  na Universidade de Coimbra, na homenagem a Nuno Ferrand, biólogo e divulgador de ciência.

Sejam bem vindos a esta casa de cultura científica. O RÓMULO - Centro Ciência Viva da Universidade de Coimbra abriu as suas portas no dia de 24 de Novembro de 2008, dia de aniversario de Rómulo de Carvalho, no edifício do Departamento de Física daquela Universidade. Hoje assinalam-se, portanto, os treze anos de funcionamento contínuo e em crescimento constante como centro de difusão da cultura científica na sociedade. Obrigado a todos os que o tornaram possível a  enorme ascensão do RÓMULO, em particular à Manuela, à Helena, à Joana e à Maria João, que trabalham aqui todos os dias, Muito obrigado ao Instituto de Investigação Interdisciplinar, III, aqui representado pela sua Directora e Vice-Reitora Prof.ª Dr.ª Cláudia Cavadas, onde o RÒMULO está integrado. 

 A Biblioteca do RÓMULO passou dos cerca de 3000 títulos iniciais para cerca de 40 000, sendo hoje, graças a importantes doações, a maior e mais notável colecção de livros, revistas, CD e DVD sobre  cultura científica, contemplando os mais variados tópicos da múltipla relação entre ciência e sociedade. Essa  colecção está à disposição de todos os interessados. O RÓMULO é vosso! 

 O RÓMULO, que integra com muita honra a rede de centros Ciência Viva espalhados pelo país, tem sido palco de numerosas actividades de divulgação da cultura científica e o seu labor, apesar dos tempos de pandemia, tem-se mantido muito viva, dirigindo-se a vários públicos, incluindo uma ampla colaboração com escolas de todo o tipo. Destaco a parceria da Universidade de Coimbra, no quadro da Escola Ciência Viva, com o município de Cantanhede, uma iniciativa consolidada que está a decorrer esta semana, tal como nas anteriores e vai decorrer nas próximas. 

Abriu hoje a exposição Posters com Ciência, uma exposição que resultou de uma colaboração entre o Centro Ciência Viva do Lousal - Mina de Ciência e o artista gráfico Edgar Ascensão e que propõe, cruzar o olhar único da arte com as grandes conquistas da ciência. Neste trabalho, para cada filme foi escolhido um acontecimento científico, contemporâneo com a mesma data, ao longo de sete décadas, mostrando o modo como a arte pode imitar a realidade e vice-versa. Desde O Marciano, passando por Parque Jurássico até A Guerra das Estrelas, são cerca de 25 filmes que contam uma história ímpar do conhecimento e desenvolvimento tecnológico. Cada poster, é uma visão acrescida ao mundo da sétima arte. Edgar Ascensão, licenciado em Artes da Imagem e repórter de imagem na SIC, encontrou no desenho de posters alternativos um modo de exprimir o seu amor pelo cinema. Tem um blogue e uma plataforma online onde publica os seus trabalhos, muitos dos quais já com reconhecimento mundial. 

Hoje, e porque o dia 24 de Novembro é o dia de Darwin -  o seu livro a Origem das Espécies foi publicado em 24 de Novembro de 1859, em Londres, pretendemos homenagear  um naturalista notável, o professor Nuno Miguel Ferrand, da Universidade do Porto. Ele é hoje o nosso convidado especial, indo brindar-nos com uma palestra intitulada “Reflexões de um Naturalista na era da genómica.” Depois, com um magusto no intervalo, terá lugar a palestra “Desenhar no Escuro” pelo artista António Jorge Gonçalves a que se seguirá o debate “Ciência e Arte”, moderado por mim próprio. 

O Professor Doutor Nuno Miguel dos Santos Ferrand de Almeida (Ferrand de Almeida é aliás um nome bem conhecidos em Coimbra, de académicos ilustres) é Coordenador Científico do CIBIO-Inbio,  Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos, situado em Vairão, perto do Porto. ´É Professor Catedrático do Departamento de Biologia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, onde lecciona genética e evolução. Ferrand interessa-se por biologia evolutiva, particularmente por padrões de diversidade genética de populações naturais, ecologia, conservação, domesticação e especiação. Tem desenvolvido numerosos projectos de investigação nestas áreas utilizando o coelho como principal espécie modelo. Ele já aqui nos encantou uma vez com a história dos coelhos de Porto Santo, sobre a qual ele poderá contar mais, porque como todas as boas histórias de ciência esta é uma história em evolução. Também estudou a evolução de muitas espécies de anfíbios e répteis na Península Ibérica e no Norte da África. Alcançou há pouco tempo o maior financiamento da investigação portuguesa, num concurso europeu: no total são quase cem milhões de euros. Esse financiamento permitirá dar escala internacional à investigação sobre biodiversidae e genómica que se faz em Portugal.

Ferrand publicou mais de 150 artigos, nomeadamente na Science, Nature Genetics, Molecular Biology and Evolution, PloS Genetics, Evolution, Biological Journal of the Linnean Society, Genetics, Molecular Ecology, Molecular Phylogenetics, e Evolution Heredity. Repare-se que h´+a aqui títulos de primeira linha, como a Science e a Nature. É autor de três livros e de onze capítulos de livros, e editor de quatro. É o Director do Programa de Doutoramento em Biodiversidade, Genética e Evolução organizado pelas Universidades do Porto e de Lisboa, financiado pela FCT. Orientou 19 teses de doutoramento, 21 teses de mestrado e 15 pós-doutorados. Actualmente, orienta 4 alunos de doutoramento e 11 pós-doutorandos. 

Mas quero também enfatizar o seu trabalho como Director do Museu de História Natural e Ciências da Universidade do Porto, onde tem liderado uma profunda reestruturação para a criação de um novo museu focado numa filosofia museográfica inovadora. Organizou aí várias exposições, incluindo a a muito concorrida «Evolução de Darwin», que tive a oportunidade de apreciar aquando da inauguração. Depois disso gostei sempre de volta à Casa Andresen, onde a par de uma mostra permanente onde se cruzam ciência e arte de um modo muito original, há sempre novidades, desde exposições da National Geographic até palestras e concertos. Louvo, em particular, a colecção de livros que tem feito sair, alguns deles do famoso naturalista britânico Desmond Morris. E louvo também o facto de ter conseguido trazer para Portugal a biblioteca e arquivo desse autor.  Neste momento, um dos projectos a que dedica mais atenção é a do pólo da Reitoria do Museu da Ciência da Universidade do Porto, que é um modelo de respeito pelo património e sua valorização. A Universidade de Coimbra bem pode aprender com exemplos como esse. E há ainda um belo projecto que valoriza o Aquário Dr. Augusto Nobre, na foz do Porto.

O Nuno sabe, tal como Rómulo-Gedeão, que «o sonho comanda a vida» e que «sempre que o homem sonha o mundo pula e avança». Conheço-o há muitos anos. Tendo trabalhado com ele no âmbito da Fundação Francisco Manuel dos Santos  (FFMS) conheço bem as suas capacidades do que podemos chamar   empreendedorismo científico. Pedi-lhe uma vez para organizar um projecto que produzisse  um relatório sobre o estado da ciência em Portugal ele, ao fim de algum tempo, completou um extraordinário trabalho, cujo resultado está à disposição de todos no site da FFMS. É o maior e melhor retrato até hoje realizado sobre a ciência em Portugal. Seria bom que os nossos gestores planeassem a nossa ciência com base em informação tão rica e pormenorizada como essa.

Eterno insatisfeito e sempre optimista e  generoso para com os outros, o Nuno tem sempre procurado fazer mais e melhor. Ainda há pouco tive conhecimento directo do seu projeto em Mértola com o estabelecimento de um novo polo científico num antigo silo cerealífero, bem no centro do  Parque Natural de Mértola, que será também de um novo espaço museológico e artístico. É uma iniciativa absolutamente notável que valorizara uma vila e uma região do interior profundo, que o poder central tem ignorado. Verifiquei, ao vivo, a sua alegria quando encontrava pássaros do qual sabia os nomes  e a sua ânsia quando procurava, no meio de um montado, a árvore mais bonita de Portugal. Sei que ele também tem outro projecto muito interessante em Arco de Valdevez, na Serra do Gerês. Assim os laboratórios do CIBIO cobrirão quer o norte atlântico quer o sul mediterrânico, tanto a grande pluviosidade como a grande seca.

Ele é também um cientista no mundo, uma espécie de David Attenborough português, só lhe faltando as câmaras de televisão atrás. Tem andado por África, sendo notável o seu trabalho de ajuda no campo da ciência  à comunidade de povos de língua portuguesa. Sendo o mundo  hoje global,  o Nuno tinha de ser cientista global. De facto, já andou com câmaras atrasos: o documentário «Viagens Filosóficas» passou na televisão e foi distribuído com o Público. Mas, na minha opinião, a televisão portuguesa poderia fazer muito mais pela ciência.

O RÓMULO - Centro Ciência Viva da Universidade de Coimbra presta hoje, no Dia Nacional da Cultura Científica, uma homenagem a um dos melhores cientistas portugueses e também a um dos nossos melhores comunicadores de ciência. Sei que ele tem recebido outras distinções, das quais a m ais recente é a de membro da Legião de Honra concedida pelo  governo francês, mas espero que o Nuno Ferrand aceite adicionar a essas esta modesta homenagem do RÓMULO, que mais não é do que  a expressão do nosso reconhecimento e do nosso afecto. 

Muito obrigado, Nuno, por todo o teu trabalho e pela tua presença hoje aqui no RÒMULO, no dia do Rómulo de Carvalho, para o partilhares connosco!

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