quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Do Instituto Nacional de Educação Física (INEF) à Faculdade de Motricidade Humana (FMH)


“Triste época! É mais fácil desintegrar um átomo do que um preconceito” (Albert Einstein).

Transcrevo do comentário de Paulo Costa, ao meu post aqui publicado, titulado “Da actual Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física à criação de uma Ordem dos Professores de Educação  Física (1)”, a referência ao  espinhoso processo de reconhecimento da academia pelo qual também passou a FMH (UTL)”. 

Indo ao cerne da questão, ou sejam o “mau olhado”, as descrenças e vicissitudes relacionadas  com o Corpo - segundo o Professor de Medicina Ernst Krestschmer, "o corpo é uma inteligência" - que pomposos “intelectuais”, falsos detentores do Saber, verdadeiras cabeças tontas ensopadas de dogmas, sopram em trompetas, que espalham, “urbi et orbi”,  que as escolas que formam, desde 1940, professores de Educação Física, são usinas de mentecaptos em que os músculos estão na razão inversa dos neurónios. Esta dedução “atrevidota” encontra contestação  em Ramalho Ortigão, escritor  de uma obra literária de grande vulto que, pela sua compleição atlética temperada com exercícios gimnicos, dizia ter nascido  para "Hércules de Feira"!

Extraio, agora, do professor universitário de Filosofia da Universidade de Coimbra e investigador  das Ciências da Educação, Sílvio Lima (1904-1993), um acervo de 97 artigos publicados no jornal portuense “O Primeiro de Janeiro”, nos anos de 39 a 43,  uns tantos títulos, como sejam: “Reflexões Críticas Sobre o  Desporto”, “Desporto e Sociedade”, “Desporto Mocidade e Velhice”, “Desporto e Ciência”, “Desporto e Medicina Desportiva, “O Desporto e a Beleza”. Em crítica aos detractores do Desporto disse este Professor ser ele “uma questão grave (quer dizer etimologicamente pesada) que só parece leve aos de cabeça leve como o sabugo e o algodão”.

E porque "a história é uma mediação entre o passado e o presente”(Paul Ricoeur), passo a abordar  o percurso temporal da FMH indo às suas raízes: INEF. Tempos atrás, faleceu um Mestre (no sentido mais nobre da palavra), grande e saudoso Amigo. Foi ele um homem que teve como “honoris causa” a defesa intransigente do INEF e dos seus diplomados. Sobre o Desporto publicou no seu livro “O Desporto e as Estruturas Sociais” (“Prelo Editora, 1.ª edição, 1967, a se seguiram outras edições) o seguinte: “Só há uma forma de entender o fenómeno desportivo: na perspectiva das estruturas sociais. O que há de característico e fundamental no desporto é, justamente, o que define e caracteriza a sociedade em que se realiza”.

Admirador incondicional de José Esteves, na sua complexidade, para mim a maior figura nacional da Educação Física e Desporto, em “A BOLA” (12.Dez.91), enderecei-lhe uma “Carta Aberta””, que transcrevo, dando relevo a um preâmbulo, da autoria de um dos seus jornalistas, que reza: “Esta é uma carta aberta a José Esteves, dirigida por um seu amigo, Rui Baptista, de Coimbra, professor de Educação Física, que no segundo Congresso de Educação, apresentou uma moção (aprovada) para que fosse concedida a José Esteves o doutoramento “honoris causa”. Eis a carta:

“Querido Amigo:

“Numa época em que tudo e todos são postos em causa, mas que, em contrapartida, se homenageia, a torto e a direito, muito imbecil e se galardoa a eito tanto incompetente, rogo-lhe que ponha à minha disposição a sua grandeza de espírito e a magnanimidade do coração.

Só assim, em sua modéstia, será José  Esteves capaz de perdoar-me estas  descoloridas linhas que serviram de pórtico a uma comunicação por mim apresentada no 2.º  Congresso Nacional de Educação Física (Tróia, 29.Nov.91), intitulada “Os desafios profissionais do futuro”.

Pigmeu de uma longa e penosa jornada, de que José Esteves se fez gigante, rendo o meu preito ao insigne Mestre e dilecto Amigo, de quem recebi o clarão inspirado da intransigente defesa da classe, mas que o meu desajeitado sopro transformou em pálida e mortiça chama.

Em clausura de eremita, entre livros e recordações, e cartas e visitas de afeiçoados em sua casa de Cascais, castelo de sonhos que uma indómita vontade, e força d’alma, tornaram realidade, vive, agora, em cristã resignação, a lembrança de letargias que a tacanhez da Sociedade portuguesa, e a pequenez dos homens, desejavam perpetuadas para todo o sempre, em triste e irremediável destino.

E que formosíssima utopia, a sua: “Não troco a promoção desportiva de uma centena  de crianças das nossas escolas primária por uma medalha de ouro olímpica". A um simples mortal, os deuses do Olimpo, jamais, podiam perdoar  tanto e tamanho desafio aos seus heróis. E não é ‘a vingança o prazer dos deuses?’” "Ex corde. ”Rui Baptista

Viu o INEF a luz do dia em 1940, época de exacerbado nacionalismo que lhe deu o apodo de Nacional em vez de Superior, porque convinha manter os seus alunos longe de tentações universitárias revolucionárias.

Existiam à época, extenso número de faculdades e 4 cursos superiores extramuros universitários: INEF, Arquitectura, Escola Naval e Escola do Exército. A alínea f) do Decreto 36507 de Setembro de  1947, insere, com excepção de Arquitectura inclusa noutra alínea, as escolas supracitadas, assim como, a título de meros exemplos, Medicina e Farmácia. O INEF foi integrado em seio universitário em 75, seguindo-se  a integração de Arquitectura em 79. Aliás, pouquíssimo tempo antes de 25 de Abril, chegou a ser anunciada, num Boletim do INEF, a sua integração na Universidade Nova de Lisboa.

Pelo desconhecimento de textos legais, unicamente apoiados em “achismos”, fui confrontado por mentes asininas sobre a inferioridade do INEF, com suportes na sua crisma de nacional em vez de superior ( cursos espanhóis universitários de Educação Física há que são denominados nacionais). Este “status quo” levou-me, em resposta a uma polémica num jornal da capital moçambicana de que fui um dos polemistas,  a solicitar um esclarecimento oficial à direcção do INEF, de que José Esteves era sub-director, sobre esta controvérsia. A resposta surgiu, via Ministério da Educação, que pelo seu ofício.º 3979, de 27 de Setembro de 1962, informava ser o INEF uma escola superior. Em consequência, foi dado conhecimento deste ofício para ser publicado no jornal que tinha dado guarida  à notícia, através de uma comunicação enviada pelo Centro de Informação e Turismo de Moçambique, para rectificar, como ora se diz, uma “fake new” de um seu colaborador.

Aqui chegado parece-me importante fazer uma resenha sobre os cursos de Educação Física em Portugal, antes da criação do INEF (1940). Existiu um curso superior de Educação Física ministrado   na Sociedade de Geografia de Lisboa que encerrou portas assim que foi criado o INEF. Por os diplomados pelo INEF não chegarem para o preenchimento das vagas para a respectiva docência, foram criados, na década de 60, cursos médios de Educação Física, em Lisboa, no Porto e Coimbra (que não chegou sequer a funcionar), cujos diplomados, titulados instrutores de Educação Física, exerciam funções sobre a orientação de professores de Educação Física. Estas escolas médias  foram também criadas em Luanda e Lourenço Marque na década de 70.

Depois de 25 de Abril, foram os ex-instrutores havidos como professores “diplomados” em Educação Física, como se os professores formados pelo INEF fossem uma espécie de párias que exerciam funções docentes sem qualquer diploma ou habilitação de crédito. Bem nos alertou Almeida Santos, tido como um dos príncipes da legislação portuguesa, que a maior parte da legislação produzida depois de 25 de Abril em Portugal, chumbava no antigo exame da 4.ª classe.

Se mérito diviso neste meu texto, escrito ao correr da pena, é porque a sua intenção foi combater opiniões malévolas que geraram confusão sobre o INEF. Como escreveu G. Scott, “os factos são sagrados e os comentários livres”, ainda que perigosos quando se estribam no simples “ouvi dizer” qual boato, que se espalha com a velocidade de um relâmpago que tudo calcina à sua volta com a finalidade  de destruir a reputação de instituições dignas da maior consideração, como o INEF. Haja, no mínimo, respeito! 

Aquele respeito que o então Ministro da Educação, Roberto  Carneiro, numa Sessão Comemorativa,  realizada na FMH, afirmou solenemente: "O Instituto Nacional de Educação Física subiu a pulso  o caminho que o haveria de conduzir à Universidade!"

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