Segundo Eça, "o riso é a mais antiga e ainda a mais terrível forma de crítica. Passe-se sete vezes uma gargalhada em volta de uma instituição, e a instituição alui-se". Ora, numa altura em que Portugal atravessa
grave crise, em inúmeros sectores da vida nacional, o Bloco de
Esquerda fez-se móbil de uma cruzada em prol da “linguagem sexista”. E se o poder do riso leva ao aluimento das
instituições, não pode o Bloco de Esquerda deixar, consequentemente, de se preocupar com este
texto de Nuno Pacheco (“Público”, 22.Abril.2016), nem que seja só como
prevenção nas escolhas de temas futuros com verdadeiro interesse para a grei. Para não privar uns tantos portugueses e
portuguesas (ou portuguesas e portugueses, em trato cavalheiresco?) da sua
leitura, transcrevo o seu texto:
“Se o ridículo matasse, Portugal estava constantemente pejado de cadáveres. Não bastava a tolice do acordo ortográfico, tolice aliás que o Bloco de Esquerda abraça estoicamente, voltámos agora à mais tola e inútil das cruzadas: a da chamada “linguagem inclusiva”; o contrário da linguagem “sexista” e “discriminatória” onde se diz pais, irmãos, avós, primos, etc. Tudo discriminatório, naturalmente. Ora foi com base em tal pressuposto que, num momento de particular inspiração, o BE propôs que o Cartão de Cidadão passe a chamar-se Cartão de Cidadania. Talvez porque Cartão de Cidadão e Cidadã fosse demasiado comprido. Ricardo Araújo Pereira, no Governo Sombra, já caricaturou devidamente esta paranóia correctiva. Disse ele, imaginando um discurso bloquista: “Portugueses e portuguesas, estamos aqui reunidos e reunidas porque estamos todos e todas preocupados e preocupadas com a questão dos desempregados e desempregadas”. Pois. Mas mesmo assim não chegava. Era preciso nuns casos começar com o masculino e noutros com o feminino, para não ofender ninguém. E havia que olhar inquisitorialmente para outras palavras, muitas, milhares, que enchem livros, dicionários e gramáticas, antros de desigualdades com masculinos e femininos por todo o lado, olhem para criança (e não há o crianço?), para membro do partido (haverá a membra?), para polícia ou guarda (deveria haver o polício e o guardo?)… E então a toponímia? Ah, mas aqui imperam as “mulheres”: vejam a rua, a praça, a avenida, a travessa, a calçada, a estrada, a auto-estrada, enquanto para os “homens” sobra o beco, o largo, o passeio, o boqueirão! Querem mesmo acabar com a linguagem “sexista”? Acabem com o Português. Porque ele, que é língua no feminino e idioma no masculino, está impregnado de sexo por tudo quanto é letra. É que até o Bloco soa no masculino. Deveria ser Bloc@? Ou Bloca?”
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