A história da evolução
humana tem sido várias vezes alterada nas últimas décadas. Para isso têm
contribuído pelo menos duas áreas da investigação antropológica: várias
descobertas de novos fósseis em África, Ásia, Europa, Médio Oriente, Indonésia,
entre outros locais; o desenvolvimento de novas e muito sensíveis técnicas de
microextracção de ADN e sequenciação de genomas antigos. Qualquer uma destas
áreas tem trazido novas e empolgantes informações sobre a evolução da nossa
espécie. Contudo, os estudos genéticos têm permitido extrair muito mais
informação para além dos achados fósseis e inclusive na ausência destes!
Prova disto, são dois
artigos publicados nas duas últimas semanas nas revistas Science e Nature,
ambos relacionados com estudos genéticos, que vêm agitar as águas em que navega
a história da evolução humana.
Na Science, foi publicado um estudo que
analisa a herança genética no nosso genoma proveniente do homem de Neandertal e
que associa essa herança, de pouco mais de 2% do genoma humano moderno, com
doenças como a depressão, o vício do tabaco, o enfarte do miocárdio e algumas
lesões cutâneas.
Na Nature, foram publicados os
resultados de uma análise do genoma de um neandertal cujos restos foram
encontrados numa gruta situada nos Montes Altai da Sibéria, perto da fronteira
entre a Rússia e a Mongólia. Estes resultados são surpreendentes. Eles mostram
a existência de vestígios muito antigos de genes de homem moderno nos
antepassados do neandertal analisado.
Este trabalho indica que poderão ter havido
relações sexuais entre neandertais e humanos anatomicamente modernos há cerca
de 100 mil anos. Ora isto implica que a data em que os primeiros Homo sapiens migraram de África para a
Eurásia terá de ser reavaliada e muito antecipada. Recorde-se que os primeiros
fósseis de Homo sapiens encontrados
na Europa têm cerca de 45 mil anos, altura em que o continente europeu era
povoado pelos neandertais. Pelo menos é isso o que os fósseis até agora
encontrados nos dizem.
Antes deste estudo,
pensava-se que a primeira vez que as duas espécies fizeram sexo teria sido há
cerca de 47 a 65 mil anos (o que deixou no nosso genoma a herança de cerca de
2% de genes neandertais) e que o homem moderno teria saído pela primeira vez de
África há 65 mil anos.
Estas novas análises
mostram que o homem moderno que deixou a sua marca genética naquele neandertal
encontrado na Sibéria, só pode ter pertencido a um grupo que migrou de África
dezenas de milhares de anos antes do que os antepassados directos dos europeus
e dos asiáticos actuais.
Contudo, a equipa
internacional de cientistas que realizou o estudo admite saber muito pouco
sobre esses primeiros migrantes. Sergi Castellano, do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva na Alemanha e coautor
do estudo, sublinhou à AFP que as análises efectuadas “só” mostram que
estes primeiros viajantes “se separaram bastante cedo dos outros homens
modernos de África e que procriaram com neandertais há uns 100 mil anos”. Mas
sublinha que “esta é a primeira prova genética da presença do homem moderno
fora de África, apesar de ser indirecta, uma vez que não temos ossadas daqueles
primeiros migrantes, mas apenas as marcas genéticas que deixaram nos
neandertais”.
De qualquer forma, este
estudo vem confirmar que houve cruzamentos com descendência fértil entre
neandertais e Homo sapiens, e
galvanizar a procura de vestígios fósseis dos primeiros homens modernos a
chegar à Eurásia.
António Piedade
2 comentários:
Não gostou do meu comentário! Compreendo, sexo é tabu.
Qual comentário? Só recebemos este!
Enviar um comentário