quinta-feira, 1 de outubro de 2015

PELO FUTURO DA CIÊNCIA

Hoje a grande maioria dos cientistas teme pelo futuro da ciência se a actual política de destruição continuar. Surgiu uma petição aos partidos concorrentes às eleições, que está a recolher um número cada vez maior de assinaturas. Eu assinei por concordar com o fundamental do conteúdo. Quem também concordar, poderá assinar clicando aqui.

 Para: Aos Partidos candidatos às legislativas de 2015

APELO A UMA MUDANÇA URGENTE DA POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

Assistimos nos últimos quatro anos a um plano de reformas no sistema científico e tecnológico português que resultou numa significativa perda de capacidades e recursos humanos. Com estas reformas, a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), que é a entidade responsável pela gestão do investimento público em Ciência e Tecnologia, pretendia alinhar as políticas científicas portuguesas com os parâmetros internacionais, após um período anterior de 15 anos de franca expansão.

 No entanto, a introdução de novos programas e as alterações nos já existentes, bem como as mudanças nos procedimentos operacionais dentro da própria FCT, traduziu-se de facto em perdas no sistema científico e tecnológico português, a saber: 1) diminuição do número de bolsas de doutoramento e pós-doutoramento atribuídas; 2) redução significativa do número de contratos de investigador FCT, face aos contratos que terminaram entre 2012 e 2013; 3) decréscimo na taxa de sucesso na atribuição de projetos; 4) aumento da divergência entre Portugal e a média Europeia na despesa total anual em I&D em proporção do PIB.

 Em particular, a avaliação das unidades de investigação decorreu num clima de contestação pela falta de transparência, falhas no regulamento e alteração das regras a meio do processo. A discrepância entre as regras de financiamento anunciadas e aplicadas foi aliás reconhecida pela recente avaliação a que a FCT foi sujeita por um painel internacional em cujo Relatório de Avaliação Internaciona se conclui que "a FCT não deveria ter alterado as regras". A avaliação terminou com a exclusão de metade das unidades de investigação na primeira fase, e com a atribuição de financiamento às unidades que passaram à segunda fase extremamente desequilibrada: 50% da verba disponível foi concedida a 19 unidades (11% do total).

 O sistema científico e tecnológico português perdeu assim capacidades (financiamento e unidades de investigação) e especialmente recursos humanos: muitos jovens investigadores promissores deixaram o país, aumentando a ‘fuga de cérebros’. Estes factos só podem ter consequências negativas na produtividade científica e tecnológica do país, a curto, médio e a longo prazo, com reflexos imediatos na capacidade de inovação e na competitividade da economia nacional.

 A comunidade científica reagiu: publicaram-se comunicados e cartas, realizaram-se reuniões com a tutela, promoveram-se ações judiciais e publicaram-se livros2. Contudo, esta contestação não deu origem a nenhuma correção ou reorientação da estratégia, continuando a FCT numa política pouco dialogante com a comunidade científica – sem ouvir o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, investigadores, sindicatos, organizações de bolseiros, sociedades científicas, etc. Nas conclusões e recomendações deste relatório, consta: "... o painel recomenda que a FCT melhore a comunicação com todas as partes envolvidas, clarificando e partilhando os planos futuros, desafios, etc". O painel recomenda ainda que "a FCT se deveria empenhar no diálogo com as universidades e o governo para reforçarem o sistema universitário".

 Os subscritores desta petição consideram que é urgente reajustar a política do sistema científico e tecnológico português para manter as suas capacidades e recursos humanos e garantir a sua qualidade, produtividade e impacto socioeconómico.

 1) Reconhecemos que a implementação das atuais reformas do sistema científico e tecnológico português pôs em causa questões de fundo que importa sublinhar: - Houve uma crescente precarização dos investigadores jovens que são um importantíssimo ‘motor’ do sistema científico e tecnológico português. Esta visão é contrária à de uma sociedade democrática, economicamente sustentável, capaz de coletivamente contribuir com respostas para os desafios que enfrentamos em todas as áreas do conhecimento, e que ofereça aos cidadãos e à sociedade as capacidades e infraestruturas necessárias para que os seus melhores talentos possam ser postos ao serviço dessa mesma sociedade. - Houve uma falha na apreciação de que é necessária uma forte acumulação de conhecimento fundamental para este poder ser aplicado em benefício da sociedade. Com efeito, o desenvolvimento de aplicações científicas e tecnológicas resulta de um corpo de conhecimento fundamental que tem de ser previamente gerado. É por isso que é necessário investir em investigação fundamental. Assim é necessária uma visão de ciência e tecnologia que reconheça a dimensão de risco que é inerente à investigação fundamental, valorizando o que é novo, fomentando a criatividade sem a qual não há progresso nem ciência ‘aplicada’.

 2) Sublinhamos que as recentes reformas introduzidas no sistema científico e tecnológico português levaram a uma perda de capacidades e recursos humanos com enormes desperdícios económicos e financeiros. Efetivamente, Portugal investiu fundos nacionais e europeus na educação duma geração de investigadores, que é a mais qualificada de sempre, mas que em grande parte teve de abandonar o país ou está sem emprego. Para poder responder aos desafios que atualmente enfrenta, o país tem de mobilizar essa enorme massa de talento e conhecimento. São necessários ajustes no sistema científico e tecnológico português que concretizem a obrigação que o Estado tem de mobilizar essas capacidades já desenvolvidas e massa crítica de investigadores para os pôr ao serviço da inovação e desenvolvimento económico.

 3) Consideramos que têm de ser feitos ajustes urgentes no sistema de ciência e tecnologia português para a construção de um futuro da ciência em Portugal que seja sustentável.

Por isso apelamos a todos os responsáveis políticos para que defendam na próxima legislatura, em Portugal e na Europa, medidas que corrijam a atual situação, de forma a garantir as capacidades, massa crítica de recursos humanos e o desenvolvimento do sistema científico-tecnológico português, associados a critérios de excelência e produtividade, de forma a que este tenha maior impacto na sociedade. xxx Tal missão só será possível apostando no diálogo com a comunidade científica nacional e valorizando a qualidade, mas também a diversidade, a criatividade e a cooperação, que são essenciais ao progresso da missão científico-tecnológica.

 Os promotores,
 Margarida Santos-Reis, CE3C, Centre for Ecology, Evolution and Environmental Changes (Coordenador) José Francisco Rodrigues, CMAF-CIO, Center for Mathematics, Fundamental Applications and Operations Research (Comissão Diretiva) Margarida Telo da Gama, CFTC, Center for Theoretical and Computational Physics (Coordenador) Margarida Amaral, BioISI, Biosystems & Integrative Sciences Institute (Coordenador) Maria José Calhorda, CQB, Center of Chemistry and Biochemistry (Coordenador) Olga Pombo Martins, CFCUL, Centre for Philosophy of Science of the University of Lisbon (Coordenador) Pedro Dinis de Almeida, IBEB, Institute of Biophysics and Biomedical Engineering (Coordenador)

3 comentários:

Teresa Mendes disse...

Caro Professor,
Concordo que o estado da Ciência em Portugal está muito problemático.
Mas infelizmente não acredito que as coisas possam melhorar somente com acções politicas.
Como sabe, eu tenho uma proposta revolucionária para uma inversão sustentada desta situação.
Nesta proposta o papel da comunidade científica portuguesa é muito relevante e inclui o acesso ao financiamento Horizon2020 e Portugal2020 em termos colaborativos.
Só alguém como o Professor, poderia criar a dinâmica necessária para que esta parte do projecto possa funcionar.
Pense nisso.
Aguardo o seu contacto.
Obrigada pela sua atenção.
Teresa Mendes

João Santos disse...

Quem dera a muitos portugueses andarem encostados no Orçamento de Estado a beneficiarem do dinheiro dos contribuintes a entrar na conta sem dar algum retorno, e ao fim do dia diriam que andaram a fazer ciência.

Anónimo disse...

É pena que isso não aconteça, até porque pode sempre ver o trabalho que os cientistas fazem... Dizer mal dos outros é que é uma actividade que lhe agrada muito, pelos vistos.

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