“Duas «novidades» caracterizam o contexto em que se desenvolvem as práticas laborais dos docentes e que afetam seu sentido e identidade coletiva. Uma está relacionada com a tendência a incorporar as novas tecnologias da comunicação e da informação (TIC’s) na sala de aula. As tecnologias obrigam a uma profunda redefinição das práticas e modos de fazer as coisas em sala e, portanto, dos processos de formação docente. A outra transformação se relaciona com a crise do modelo burocrático que estruturou em seus princípios a organização dos sistemas educativos e do trabalho dos docentes.
A introdução do «novo espírito» do capitalismo no sistema e nas instituições educativas modifica profundamente as condições de trabalho nas instituições e nas salas. A introdução de critérios de concorrência (entre instituições, agentes, etc.), produtividade (em termos de rendimento das aprendizagens), avaliação, competências, autonomia das instituições, tensões entre desregulação e pressão por resultados, etc. conformam um cenário que coloca novas condições ao processo de construção da identidade do coletivo docente (…)
[Os professores ] já não são, estritamente falando, aquela velha mistura de “missionários ou apóstolos da cultura” e funcionários públicos, mas profissionais dotados dos conhecimentos científicos e técnicos necessários para maximizar o rendimento em matéria de aprendizagem. A pressão pelos resultados medidos segundo provas estandardizadas tenderá a diluir a mística da função pública tradicional, fortemente estruturada ao redor da ideologia da “vocação”. O salário do docente não dependerá só de sua antiguidade ou qualificação, mas de sua capacidade de lograr certos resultados de aprendizagem mensuráveis em seus alunos.
Os resultados serão muito mais importantes do que os processos ou os efeitos de seu trabalho sobre outras dimensões de seus alunos (capacidade de mobilizar seu interesse e/ou curiosidade, criatividade, atitudes solidárias, etc.). Esse novo mecanismo de regulação gera, de modo geral, uma oposição por parte das organizações sindicais docentes. Muitas delas questionam a ideologia da “profissionalização” dos docentes e os efeitos da desregulação sobre sua própria autonomia profissional na medida em que estão submetidos à nova tirania das provas estandardizadas. Algumas inclusive chegam a afirmar que as consequências do “neoliberalismo” educativo são a “proletarização” do trabalho docente, na medida em que implica uma perda de controle e autonomia dos docentes sobre o sentido e conteúdo de seu trabalho nos estabelecimentos.
Em síntese, a luta permanente pela construção social do ofício do professor se desenvolve em um novo contexto onde intervêm atores coletivos (sindicatos docentes, especialistas, altos funcionários e responsáveis políticos dos ministérios de educação, intelectuais, partidos políticos, interesses dos fornecedores privados de educação, etc.) que lutam pelo controle do trabalho docente. As distintas posições e relações de força dos atores se correspondem a visões e formas diferentes de definir o sentido da educação e do trabalho dos profissionais da educação.
Para alguns, estes são nada mais que especialistas em ensino-aprendizagem e sua maior responsabilidade consiste em fazer que seus alunos alcancem os melhores resultados nas provas nacionais de avaliação de conhecimentos. Nessa perspectiva, o docente é um profissional técnico, ou seja, possuidor de um saber sobre os meios de ensino e aprendizagem. Em outra perspectiva, os docentes seriam profissionais críticos, ou seja, construtores de subjetividades conforme a projetos políticos relacionados com a construção de uma sociedade mais justa, livre e democrática. Em sentido estrito, seriam trabalhadores intelectuais capazes de cooperar na distribuição deste capital estratégico que são o conhecimento e a cultura nas novas gerações."Referência bibliográfica:
- Fanfani, E. T. (2010). Condição docente. O texto integral pode ser encontrado aqui.
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