quarta-feira, 23 de abril de 2014

QUARENTA ANOS DE CIÊNCIA EM PORTUGAL



Meu texto acabado de sair no jornal cultural do Porto "As Artes entre as Letras" (na imagem, instantâneo da Revolução de 25 de Abril):

A revolução de 25 de Abril de 1974 e a entrada de Portugal na União Europeia a 1 de Janeiro de 1986 permitiram desenvolver em extraordinária medida a Ciência. Consideráveis fundos europeus foram usados para apoiar bolseiros e infraestruturas de Ciência. Pode falarse de uma verdadeira explosão nesta área do conhecimento.

Em 1995 foi criado o Ministério da Ciência e Tecnologia e em 1996 a FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, que sucedeu à JNICT – Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, que por sua vez tinha assumido o papel do INIC, o Instituto Nacional de Investigação Científica. Com a abertura à Europa e ao mundo a ciência portuguesa internacionalizou-se como nunca tinha acontecido antes, com a saída do País de muitos cientistas em várias áreas e também com a entrada de estrangeiros. Começou uma avaliação regular da actividade de investigação. Construíram-se edifícios, montaram-se estruturas, incluindo alguns grandes equipamentos. O País passou a fazer parte de vários organismos científicos internacionais como o CERN - Centro Europeu de Pesquisa Nuclear, a ESA - Agência Espacial Europeia e o ESO - Observatório Europeu do Sul. As áreas das ciências sociais e humanas conheceram particular expansão, abrindose a ramos novos do conhecimento, como por exemplo a sociologia. Perante a dificuldade de as universidades absorverem rapidamente e de modo adequado os recursos postos à disposição pelo Estado (em larga medida vindos da União Europeia), foram criadas instituições privadas de interesse público, sem fins lucrativos, que foram chamadas Laboratórios Associados por analogia com os Laboratórios do Estado, como o Laboratório de Veterinária, o Instituto Ricardo Jorge e o Laboratório Nacional de Engenharia Civil, que já existiam. Foi o caso do CNCUC - Centro de Neurociências e Biologia Celular da Universidade de Coimbra, na Lusa Atenas, e do IPATIMUP - Instituto de Patologia e de Imunologia Molecular da Universidade do Porto, na Cidade Invicta (que está agora a fazer 25 anos). Essas instituições cresceram rapidamente em contraste com alguns dos Laboratórios do Estado, que não se desenvolveram na medida das expectativas. Surgiu, além do Instituto Gulbenkian de Ciência, forte na área da biologia, que remonta aos anos 60, em 2010 um outro centro de investigação na área da biomedicina em busca de reputação internacional, este apoiado pela Fundação Champalimaud

O investimento na Ciência e Tecnologia aumentou até ter atingido 1,6% do Produto Interno Bruto nos anos de 2009 e 2010, em reflexo do aumento do número de investigadores e da actividade destes. Uma medida desse crescimento é o enorme incremento do número de doutoramentos feitos no País ou fora dele (cada vez mais no País), reconhecidos cá. Também aumentou, em consonância, o número de publicações científicas, assim como impacto destas, que é medido pelo número de citações. Basta consultar a PORDATA, base de dados de Portugal contemporâneo da responsabilidade da Fundação Francisco Manuel dos Santos, para verificarmos esses factos. O investimento em investigação e desenvolvimento (I&D) cresceu de 0,3% no ano de 1982 (o primeiro ano mostrado na série temporal da PORDATA – esse ano corresponde politicamente, com a revisão constitucional e o fim do Conselho da Revolução, à normalização democrática)  para 1,5% em 2012.  Dois indicadores indesmentíveis sobre os resultados do sucesso desse investimento em ciência são o número anual de novos doutorados formados e o número de novas publicações científicas. Em 1982 obtiveram o diploma de doutor  230 pessoas, mas em 2012 já foram 2209, quase dez vezes mais. O número de publicações científicas em revistas indexadas, que foi de 3,9 por cem mil habitantes no ano de 1982 passou para 156,7 por cem mil habitantes em 2012, cerca de 40 vezes mais. Ainda não atingimos valores da média europeia, mas poucas coisas subiram tanto em Portugal em tão pouco tempo!

A cultura científica também alastrou. A editora Gradiva, com a colecção Ciência Aberta iniciado no princípio dos anos 80, tem feito um trabalho de difusão científica através do livro, tal como nos anos 40 a Biblioteca Cosmos de Bento de Jesus Caraça. Os media começaram a falar de Ciência como nunca tinham falado antes. A Ciência Viva – Agência Nacional para Difusão da Cultura Científica e Tecnológica alargou o interesse pela divulgação científica, designadamente com a criação e apoio a vários centros de ciência no País, o maior dos quais é o Pavilhão do Conhecimento em Lisboa.

Estando vivos a maior parte dos protagonistas mais recentes, é ainda cedo para fazer a história deste período da ciência portuguesa, ainda que se possa desde já dizer que, apesar de algum retrocesso muito recente na expansão da ciência em Portugal,  estamos, aparentemente, perante um novo período de luz depois dos períodos localizados no século XVI e no século XVIII, associados respectivamente aos Descobrimentos e ao Iluminismo. Mas falta ainda a devida distância histórica para podermos provar que foi isso mesmo o que aconteceu.


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