O desemprego é hoje uns dos maiores flagelos sociais. Taxas de desemprego superiores a 50% entre camadas mais jovens são hoje comuns em muitos países. Podemos culpar os partidos – que certamente têm culpas - ou a globalização, mas existe um outro culpado silencioso e não menos importante: a tecnologia. Estamos a atravessar mudanças tecnológicas de impacto e abrangência talvez superiores a todas as revoluções anteriores.
Há que admitir que as máquinas retiraram, e vão continuar a retirar, muitas pessoas do trabalho. Desde a robotização das fábricas até tarefas rotineiras como conduzir um carro, são ou serão em breve realizadas por máquinas.
As novas tecnologias estão a destruir imensos postos de trabalho. Cada novo programa de computador está basicamente a realizar alguma tarefa que antes era feita por uma pessoa. Mas o computador normalmente fá-lo mais rápido, por menos dinheiro e sem quaisquer custos extra para as empresas. Isso não são boas notícias para os desempregados.
Para alguns a resposta para este problema consiste em aumentar a formação e o nível educacional. Por exemplo, o trabalhador da cobrança de portagens poderia ser treinado para programar os equipamentos da Via Verde. Mas existem aqui dois problemas. Primeiro as escolas não estão a preparar em número suficiente os alunos com as competências adequadas para este tipo de novas tarefas quantitativas em áreas de engenharia e programação. Em segundo lugar, o saldo é raramente compensatório: o número de postos de trabalho perdidos é maior daqueles que são ganhos.
A criação de emprego tornou-se o karma que orienta as decisões políticas e algumas opções de investimentos públicos. Independentemente da eficácia destes investimentos, a pergunta que temos de fazer é: será o desemprego realmente um problema? Não nos teremos de adaptar a uma nova realidade com taxas de desemprego persistentemente elevadas? Não estaremos a perseguir um objectivo impossível?
Tal como na revolução industrial, na era digital a tecnologia é usada para aumentar a eficiência, despedir mais gente e aumentar os lucros das empresas. Isso é ruinoso para trabalhadores e sindicatos, mas será realmente mau para as pessoas? A questão de fundo deveria ser reformulada "podemos organizar uma sociedade sem usar termos como emprego, carreira e empregabilidade?"
É assumido que os salários, provenientes dos empregos, são a única forma de trocar trabalho por dinheiro. Mas esta associação é no mínimo redutora. O emprego deve estar associado ao aumento da produtividade e existem muitas outras formas de distribuir os ganhos de produtividade por todos. A associação trabalho–emprego é um conceito relativamente recente (algumas centenas de anos) e originária de uma realidade com escassez de produtos. Porém o problema hoje não é o ter produtos a menos mas o da falta de meios para tornar estes produtos disponíveis para todos - é um facto que a desigualdade da distribuição da riqueza tem-se vindo a agravar consistentemente.
O que falta é uma nova forma de distribuir “adequadamente” os ganhos gerados pela tecnologia. Existem várias propostas, como a de Jaron Lanier que sugeriu um modelo alternativo baseado num mercado de partilha de bens digitais. É que, ao contrário da Era Industrial, a produção digital pode ser feita a partir de casa de forma independente e até mesmo em formato peer-to-peer, sem passar por empregos em grandes empresas. Jogos, livros, código software podem ser criados, partilhados e distribuídos sem necessidade de intervenção de dinheiro.
Se este modelo parece ainda demasiado utópico o tempo o dirá, mas certamente precisamos ver além do umbigo e perceber que a desaceleração económica e as alterações tecnológicas irão destruir um número crescente de empregos e acelerar a criação de um novo padrão de distribuição de riqueza. Nunca devemos porém esquecer que o que a tecnologia destroi a tecnologia também cria. Uma reflexão sobre novos mecanismos de distribuição e troca de valor numa realidade digital será muito bem-vinda. Não podemos usar modelos de organização do trabalho do século XIX para uma sociedade do século XXI.
1 comentário:
Olá Armando.
Já tinha lido o teu texto. A menção às responsabilidades que os sindicatos tém no desemprego por não permitirem a flexibilização das leis laborais tinha-me ficado atravessada. Vejo que desapareceu. Mudaste de ideias ou não passou na censura?
Enviar um comentário