Para compreender – e enfrentar – discursos como o que aqui reproduzimos, da lavra da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), ao qual, com honrosas excepções, políticos, comunicação social, académicos e educadores de demasiados países do mundo se curvam, recomendamos a leitura de dois livros organizados pelo professor de Ciências da Educação Jorge Larrosa, da Universidade de Barcelona (aqui e aqui). Maria Helena Damião e Cátia Delgado.
"Atualmente, estamos assistindo a certa dissolução da forma tradicional da escola. A escola, diz-se, já não é o único lugar da educação, e talvez não seja o mais adequado. A escola, diz-se, se transformou em um lugar anacrónico, obsoleto, desagradável e ineficaz. A aprendizagem, diz-se, ultrapassa as fronteiras da escola e se dá em todos os lugares e a qualquer momento. A crítica da escola se tornou um lugar-comum, e a educação ficou sem um lugar próprio. E é agora, neste momento de crítica e dissolução da forma da escola, que queremos repensá-la amorosamente para reencontrar sua especificidade e sua autêntica natureza. Este livro apresenta diversos exercícios de pensamento (textos, filmes e exposições) que tentam trazer ao mundo aspectos da escola, do estar na escola, do ordinário da escola, de uma memória escolar em suas atualizações, do chiaroscuro no cotidiano escolar, de tudo o que ainda faz com que a escola exista como lócus para um espaço público e um tempo livre." (aqui).
"Com as críticas ao professor tradicional, a exigência por inovação e a redefinição das funções da escola, o ofício de professor – que Hannah Arendt relacionava à transmissão e à renovação do mundo comum – vem sendo desqualificado. E as pessoas que o exercem estão sendo redefinidas como mediadoras, coaches, animadoras de aula ou impulsionadoras das aprendizagens autónomas. Ao mesmo tempo, são submetidas cada vez mais à “reciclagem” permanente, à precariedade laboral, à perda de sua autoridade simbólica e à dissolução do sentido público (e, portanto, independente) de seu trabalho. Reagindo a essa constatação, os autores deste livro dedicam tempo e atenção às formas, aos gestos e às materialidades que compõem o ofício de professor." (aqui)."
"Os organizadores deste volume, Jorge Larrosa, Karen Christine Rechia e Caroline Jaques Cubas, colaboram há anos em um projeto de largo alcance orientado a pensar e a defender a escola pública (tão ameaçada) e a dignificar o ofício de professor (tão precarizado). No marco desse projeto, foram organizadas algumas das atividades que deram lugar a este livro, assim como a Elogio da escola (aqui)."
2 comentários:
Esta hegemonia da "Educação do Futuro" entra pelas escolas dentro com a força de uma moda. Ninguém gosta de estar fora de moda. Ora, os exames estão fora de moda, mas...
No ano letivo de 2022/ 2023 fiz parte de um "júri de exame" do 9.º ano escolaridade. Então, obedecendo escrupulosamente às diretrizes governamentais, elaborámos a prova com um grau de dificuldade praticamente nulo, para a qual preenchemos três ou quatro grelhas excel repletas de critérios de classificação e correção que, depois de aplicados à risca, implicavam a não aprovação do examinando. Mas, como não quisemos ficar fora de moda, passámos o aluno! Infelizmente, isto não é, como dizia a outra, um caso pontual. A indisciplina, para ser eufemístico, tomou conta das escolas.
A bandeira da Liberdade. Porque abril é sempre primavera.
A minha esperança na educação, como no resto, é fruto da minha constatação, desde sempre, de que, em liberdade, havendo condições de liberdade, a cultura, por si mesma, gera progresso. Ou seja, o progresso é inerente ao processo cultural, que é o processo pelo qual o homem, em liberdade, escolhe o melhor, no quadro das possibilidades.
A Educação deve abster-se de agitar bandeiras.
A única bandeira, se houvesse uma, que ficaria bem à Educação, seria a da Liberdade.
O conceito de progresso é muito problemático e quando vejo alguém a usar o termo como uma bandeira fico preocupado, mesmo que esse uso se tenha banalizado, ou faça parte daqueles lugares comuns a que todos torcem o nariz e ninguém é capaz de dizer não.
Quando é um grupo, ou um partido, seja de humanistas, da verdade, de Deus, ou de outra coisa qualquer, a agitar a bandeira de progresso, ainda fico mais preocupado.
É na Liberdade, no quadro das possibilidades, subjetivas e objetivas, que o indivíduo opera as suas escolhas (e não as dos outros), e estas devem ser o mais livres possível, não devem ser tolhidas com repressões e opressões e práticas de submissão que se reproduzem em espirais de discriminação, de desigualdades, de violência e de injustiça.
Onde as pessoas têm liberdade de escolha o progresso acontece "naturalmente", diria mesmo que só na liberdade de escolha o progresso acontece como um determinismo. E isto deve dar-nos esperança e tranquilidade, desde que asseguremos a tal liberdade sem a qual os problemas se multiplicam. Em liberdade, o confronto com o tradicional faz parte do tradicional e é desse confronto que, também, resulta o progresso. Mas não se promove a liberdade quando se trabalha para a desinformação.
Iria mais longe, até ao paradoxo democrático, de dizer que não se promove liberdade quando se promove um partido, nem talvez quando esse partido fosse o partido da liberdade.
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