Meu artigo de opinião publicado hoje no "Diário as Beiras":
“A amizade é como os títulos honoríficos: quanto mais velha, mais preciosa” (Johann Goethe).
“A amizade é como os títulos honoríficos: quanto mais velha, mais preciosa” (Johann Goethe).
Sempre que me recordo do Museu Álvaro de Castro, actualmente Museu
de História Natural de Moçambique, de centenária tradição, “porque o passado não reconhece o seu lugar, está sempre presente”
(Mário Quintana, poeta e jornalista brasileiro) renasce em mim a saudade da
minha vivência na costa oriental
africana aguçada pela lembrança de uma grande e duradoura amizade que prevalece
para além da morte de Augusto Cabral.
Augusto Cabral, na então Metrópole, frequentou
diversos cursos sem os completar (dos que me recordo o INEF e o Conservatório
Nacional de Música). O primeiro serviu-lhe para dar aulas de Educação Física,
na Escola Mouzinho de Albuquerque onde fomos colegas; o segundo para ser pianista na “boîte”
do Hotel Girassol. No desporto foi tenista de competição em
Lourenço Marques e boxeur amador no Lisboa Ginásio Clube. Homem de vários
ofícios e hobbies que se distinguiu, na arte de bem escrever (refiro, por exemplo, o festejado livro científico:
“Borboletas de Moçambique”, prefaciado
por Mia Couto”), na pintura e escultura, seu exercício profissional que lhe
dava o sustento principal foi a gerência
da Casa da Sorte.
Depois de
25 de Abril, regressei a Portugal tendo ele permanecido em Maputo onde se viria
a formar em Biologia, sendo docente universitário e director do Museu de
História Natural. Reencontramo-nos,
passados anos, em Maputo, aquando da realização do "V Congresso de
Educação Física Ciências do Desporto dos Países de Língua Portuguesa"
(1997). Esse reencontro merece ser contado:
Estando os congressistas hospedados no Hotel Cardoso,
que fica em frente do supracitado museu, atravessei a rua e disse, sem me
identificar, a quem me atendeu querer
falar com o director. Respondeu-me o funcionário não ser possível por “o senhor
director” ter agendada uma reunião para
daí a pouco. Insisti, dizendo-lhe que era um amigo de Portugal que o desejava
cumprimentar. Tanto insisti que ele recebeu ordens para me deixar entrar desde
que a minha presença fosse rápida.
Quando entrei no seu gabinete, na penumbra que
apenas deixava divisar silhuetas, e lhe
falei, disse-me: “Meu grande malandro, não sabias teres-te anunciado pelo
nome?” Retorqui: “Quis fazer-te uma surpresa”. Uma muito e grata surpresa, acrescentou ele! E aí permanecemos a recordar
velhos e saudosos tempos ficando a dita reunião para segundo plano!
Aquando do regresso dos congressistas a Lisboa,
agendada para as 21 horas, fomos avisados que a partida tinha sido adiada para
as duas horas da manhã do dia seguinte. Augusto Cabral, a essa hora, estava à
minha espera para se despedir de mim, desde as 21 horas pré-anunciadas.
Nunca mais nos vimos, tendo ele falecido em 2016
em Maputo. Mas em mim permanece a sua imagem e a sua amizade que fez com que
aguentasse estoicamente no aeroporto por mim quatro horas, numa altura em que essa aerogare não primava por instalações confortáveis.
São amizades raras como esta que nos fazem
acreditar num mundo melhor e mais fraterno que políticas de cariz oposto não conseguem destruir ou, sequer, molestar!
E se como, escreveu o nosso imortal Vate, lá onde quer que estejas
“memória desta vida se consente”, recebe um abraço, “ex- corde”, Augusto, meu Amigo, meu Irmão sem qualquer parentesco de laço de sangue! Repousa em Paz!
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