Meu texto na "Ciência na Imprensa Regional", projecto coordenado por António Piedade:
No dia 29 de Maio de
1919 – fez há poucos dias exactamente cem anos – observações realizadas
na ilha do Príncipe, então uma colónia portuguesa, e na cidade de Sobral, no
Nordeste do Brasil, de um eclipse solar total permitiram confirmar uma previsão
efectuada quatro anos antes, em 1915, por Albert Einstein relativas ao desvio de
raios de luz emitidos por estrelas que se encontravam na região do céu por detrás
do Sol. A antiga teoria de Newton previa o valor de 0,87’’ de arco para o
desvio na posição das estrelas, mas a teoria de Einstein previa o dobro,
1,74’’. Quem teria razão? O valor era muito pequeno, mas era mensurável com o
equipamento da época: câmaras fotográficas aplicadas a telescópios. As
observações penderam claramente para o lado de Einstein, que assim se tornou
uma celebridade. Foi nessa altura que Einstein, então com 40 anos, se tornou o famoso Einstein, um ídolo da
ciência.
O sábio, quando lhe perguntaram o que teria pensado se
o resultado tivesse sido diferente, respondeu: “Nesse caso, eu teria pena do
Bom Deus. A teoria está correcta.” Convém lembrar que Einstein usava a palavra
Deus como metáfora da Natureza ou,
melhor, da harmonia da Natureza. Para ele, “pensamentos de Deus” era uma
expressão que queria significar leis da Natureza. Ter pena de Deus significava
lamentar que a Natureza não seguisse uma teoria que era não só coerente como
bela, e que por isso era verdadeira.
As notícias do triunfo das ideias de Einstein só
chegaram à imprensa passados uns meses mais de cinco meses após as observações,
uma vez que os cientistas tiveram de medir as posições nas chapas fotográficas.
O jornal “Times” de Londres do dia 7 de Novembro anunciou em título: “Revolução na ciência / Nova teoria do Universo / Ideias de Newton derrubadas”, e
dois dias depois o jornal “New York Times”, do outro lado do Atlântico,
titulava: “As luzes estão tortas no céu / Homens da ciência na expectativa
quanto aos resultados do eclipse/ A teoria de Einstein triunfa / As estrelas
não estão onde pareciam estar ou deviam estar, mas ninguém precisa de se preocupar.”
A 15 de Novembro subtitulava “O Século” de Lisboa num tom poético: “A luz pesa,”
depois do título “Descobertas científicas.”
Nesse encontro, com Newton a observar de dentro da
moldura do seu quadro pendurado na parede, foram anunciados ao mundo os
resultados das observações do eclipse que “canonizaram” Einstein, não tendo
sequer faltado um “advogado do diabo”, cujas alegações contrárias não tiveram
acolhimento. Reportou o referido jornal português: “No Príncipe, apesar de se
ter apresentado nebulosa a atmosfera, conseguiu-se obter algumas fotografias,
em que ficava perfeitamente comprovado que a luz estelar sofre uma inflexão ao
passar junto da orla do disco solar. Em Sobral, os resultados foram ainda mais
numerosos e patentes, Os sábios reunidos para examinar as fotografias obtidas e
ouvir as explicações dos expedicionários, tiveram de admitir que, com efeito, a
luz aparece atraída pela gravitação solar, isto é, que a luz pesa.”
Nenhum astrónomo português esteve presente no Sobral,
o que contrasta com a expedição ao Brasil, na qual os britânicos tiveram a
companhia de uma equipa brasileira. Em 1925 Einstein, que tinha recebido o
Prémio Nobel da Física de 1921, foi recebido no Rio de Janeiro com todas as
honras. Não se esqueceu de referir que a sua teoria tinha sido confirmado pelo
“céu radiante do Brasil.” Na sua viagem de barco para o Brasil parou em Lisboa,
onde não foi reconhecido. Mas ele, conforme deixou registado no seu diário,
apreciou os monumentos históricos portugueses e reparou, em particular, na
graciosidade das varinas que vendiam o peixe. Foi ao Brasil gabar os encantos
das mulheres portuguesas…
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