Foi nas colónias gregas da Ásia Menor, mais precisamente na Jónia, entre os séculos VII e VI a.C., que encontramos as primeiras manifestações de um pensamento dotado de exigência e compreensão racional.
Foi aqui que alguns dos seus habitantes mais letrados esboçaram as primeiras tentativas de explicar o mundo que os rodeava sem recorrerem à mitologia, o que era a prática comum da época. Só meio século depois, Pitágoras (circa 570-495 a.C.) deu o nome de “filosofia” a essa atitude mental.
Nascido em Mileto, cidade desta colónia, Thales (c. 623-546 a.C.) terá sido o primeiro pensador a afastar-se das crenças religiosas que conduziam a sociedade grega mais antiga e, como tal, o primeiro filósofo ocidental. Foi o surgir de um pensamento que virou costas à tradição mítica de deuses e heróis e começou a fundamentar-se nas realidades observadas no dia-a-dia. Pode dizer-se que, com ele, a experimentação quotidiana conduziu à laicização do conhecimento e à sua condução no caminho do racional.
Dentro deste espírito surgiram na Escola que fundou em Mileto e noutras, ao longo dos séculos VI e V a.C., as primeiras ideias, ditas filosóficas, como o embrião de uma ciência teórica, meramente especulativa, sem qualquer apoio experimental. Estas escolas foram comunidades de pensadores ditos pré-socráticos (Tales, Anaximandro, Anaxágoras e Heráclito, entre outros), cujas ideias, muitas vezes divergentes entre si, foram os primeiros passos na procura do conhecimento no mundo ocidental. Dizemos ocidental porque havia outros a oriente, não menos importantes, nomeadamente, na índia, na Mesopotâmia, na Pérsia e na China, pensamentos que, é preciso dizer, tiveram influência na cultura grega.
Sócrates, Platão, Aristóteles e muitos, muitos outros, menos conhecidos do grande público, legaram-nos um pensamento despido de deuses e heróis, considerado o caldo das escolas e universidades medievais.
Esta vitória do pensamento laico sofreu grande retrocesso com o advento do catolicismo (do grego “catholikós”, universal), em especial pela influência de Agostinho de Hipona (354-430), mais conhecido por Santo Agostinho e um dos maiores teólogos e filósofos dos primeiros anos do cristianismo. Segundo este doutor da Igreja, a única verdade era a dos Santos Evangelhos.
Instituição da Idade Média, a Universidade nasceu como algo mais do que a Academia de Atenas, fundada por Platão, no século IV a. C. (nos jardins de Akademós, o herói da mitologia grega e, daí, o nome). Tanto nesta Academia como no Liceu fundado pelo seu discípulo, Aristóteles, os mestres limitavam-se a especular e debater com os discípulos as suas ideias.
Durante, praticamente, toda a Idade Média, a Igreja Católica Romana deteve o monopólio da cultura e do pensamento. Daí, o ensino ser ministrado por eclesiásticos e os conteúdos e objectivos serem estabelecidos pela hierarquia religiosa, tanto nas Escolas (paroquiais, catedrais, monacais e palatinas), como nos Estudos Gerais e nas Universidades que, a partir deles, se formaram. Lembremos, a propósito, que a palavra “universidade” radica no latim “universum” (com o significado de “tudo junto” ou “tornado um”), de “unus”+”versus” (particípio passado do verbo “vertere”, tornar, verter).
Enraizadas na Europa Ocidental, a partir de meados do século XII, no contexto do chamado “Renascimento do Século XII”, as “Universitas Magistrorum et Scholarium”, as verdadeiras Universidades foram comunidades de mestres e discípulos, procurando funcionar como centros de ensino, de pesquisa e produção de saber e, ainda, pólos de debates, não raras vezes, conflituosos. Como locais propícios ao desenvolvimento de ideias, sofreram intervenções de reis, ordens religiosas e, até mesmo, dos papas. O elevado valor já então atribuído ao conhecimento científico, entendido como um “dom de Deus”, proibia os professores de receberem honorários. Assim, estes viviam das dádivas dos alunos (vindos, sobretudo, da nobreza) sob a forna de colecta.
Surgidas na Itália, na França e na Inglaterra, estas Universidades visavam o estudo do Direito, da Medicina e da Teologia, numa perspectiva do enobrecimento do espírito dos homens e na elevação das suas virtudes. Com raríssimas excepções, as mulheres não eram voltadas para essa educação.
Um parêntese para dizer que, anteriormente a estas Universidades, fora criada em Bolonha, em 1088, uma estrutura afim, vocacionada para, ao mesmo tempo, ensinar a nível então tido por superior e investigar no sentido de inovar conhecimento. Lembrada por Universidade de Bolonha, caracterizou-se por procurar um ensino liberto das amarras da Igreja Católica. Esta não foi, porém, a mais antiga de todas. Antes dela surgira a Universidade de Al Quaraouiyine, em Fez (Marrocos), no ano de 859, a de Hunan (Changsha), na China, em 976, e a de Al-Azhar, no Cairo, Egipto, em 988.
No final da Idade Média, já em pleno Renascimento, as Universidades viram aumentar o número de estudantes filhos de uma burguesia em crescimento, exigentes de uma formação mais ampla, incluindo a de caráter técnico, abrindo-se às Artes, à Matemática, à Filosofia e à Arquitetura. Entre 1200 e 1500 foram fundadas, na Europa, cerca de 80 universidades, muitas delas por bulas emanadas de Roma. Entre elas, destacam-se:
Século XI – Bolonha e Oxford.Foi o tempo da escolástica, a filosofia cristã colocada na base de todo o ensino, concebida como uma via para harmonizar a razão com a fé. Foram, porém e apesar de tudo, instituições de excelência internacional, consideradas os locais de ensino e de investigação mais prestigiados da Europa medieval.
Século XII – Paris e Modena.
Século XIII – Cambridge, Salamanca,
Montpellier, Pádua,
Nápoles, Coimbra (1290)….
Seculo XIV - Lérida, Roma, Pisa…
Século XV – Turim, Leipzig, Poitiers, Lovaina…
Século XVI – Évora (Universidade do Espírito Santo)…
A. Galopim de Carvalho
4 comentários:
O tema das universidades europeias é de suma importância, pelo que vi tratado, com inusitada competência, no livro «Os intelectuais na Idade Média», de Jacques Le Goff.
De cada vez que recuo no tempo para tentar encontrar o tempo presente verifico, porém, que as grandes questões filosóficas e religiosas continuam em aberto, como no paleolítico.
Vivemos aprisionados dentro de um universo que vamos conhecendo cada vez mais. Cada vez mais capazes de descrever e de explicar como funciona. Mas o nosso problema humano é outro. Que é que substitui ou satisfaz a nossa vontade? Podia ter todas as verdades no bolso da camisa. Até podia ser Deus.
Como é que isso iria resolver aquele problema da vontade?
Ou, dito de outra forma mais prosaica, um voto serve para alguma coisa?
E se forem todos os votos?
Vivemos numa sociedade que, embora evoluída cientificamente, se mantém arcaica e que não aprendeu, nem aprende com os erros, porque destituída de passado, ou, pelo menos, conscientemente destituída, completamente descredibilizada na sua competência para resolver problemas sociais de sempre, mais empenhada no estudo da física atómica e dos astros do que no estudo dos problemas sociais e político-económicos, mais apodítica sobre as rochas e os meteoros do que informativa sobre a justiça e as desigualdades sociais, com mais conhecimentos sobre as galáxias do que sobre os factos sociais, mais segura das característcas físicas da matéria do que assertiva quanto às qualidades dos organismos vivos, a resvalar em movimento acelerado para mais uma catástrofe provocada por uma coisa irracional chamada (des)humanidade.
Faz falta um Newton e um Einstein e um Schrodinger das Ciências Humanas e Económico-Sociais.
Mas continua a ser muito mais difícil do que pareceria no dealbar das revoluções...
A mim, o que me faz falta é dinheiro para não necessitar de ganhar o pão com o suor do meu rosto!
Não acha Jesus Cristo, Buda e Karl Marx grandes figuras das Ciências Humanas e Económico-Sociais, cuja craveira intelectual nada fica a dever à de Newton, Einstein ou Schrodinger?!
Amemo-nos uns aos outros, como Ele nos amou!
É o que fazemos todos os dias. O problema é que Ele não nos amou.
Lembro-me do aparecimento dos Verdes e da impreparação dos "eternos" candidatos a cargos políticos, que os confundiram com um pombo dos concursos de tiro. Os nossos políticos ditam (ditadura) as políticas, mas não sabem, grosso modo, de coisa nenhuma, nem têm que saber.
E, se sabem, isso não garante minimamente que ditem (ditadura) de acordo com o que sabem e, menos ainda, de acordo com um saber sufragável pelos critérios mais credíveis e plausíveis do momento.
O conceito de soberania popular precisa de ser reelaborado de forma a reelaborar o conceito de soberania, porque é necessário conceder um lugar de proeminência ao conhecimento.
A contratualização social que esteve na base da revolução francesa e da democracia representativa, além de ser uma falácia, que servia bem os interesses da época, é uma capitulação absoluta e incondicional aos imperativos da vontade.
É imperioso resgatar os sistemas políticos e económicos da vontade e da liberdade individuais entendidos como redutos sagrados da decisão política, em que basta ter vontade para ser eleito presidente, de junta, da república, etc....
Mas, ainda aqui, estamos no domínio da micropolítica. É imperioso estudar e dissecar e compreeender a macropolítica como determinante daquela. E as relações etica e juridicamente admissíveis entre ambas.
Mais do que a relação do indivíduo com o mundo e o planeta e a exploração dos seus recursos e os outros indivíduos e as instituições, é necessário definir os critérios e os limites dessa relação, para evitar e impedir que ela seja desastrosa. O coletivo deverá ser capaz de exprimir, justamente, os limites ao individual e o indivíduo deverá ter capacidade para exprimir e impor, razoavelmente, os limites ao coletivo.
Tudo sem cedências à arbitrariedade e à manipulação dos processos eleitorais, que deverão ser revistos e reformulados de fio a pavio.
De qualquer modo, não são apenas os processos eleitorais que estão profundamente em causa. A própria admissibilidade de candidatos deve estar condicionada a requisitos mínimos de competência e de idoneidade, para bem de todos.
A arquitetura dos modelos político-económicos talvez dependa mais do que se pretende do que daquilo que é a realidade, mas a realidade reclama e exige que a governação seja algo mais, muito mais, do que um teatro de fantoches à volta de uma epopeia de clubes de futebol, para fazer esquecer uma máquina de guerra virtual que devora e mata mais que as calamidades, em nome da vida e da paz.
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