Meu artigo de opinião publicado hoje in Diário as Beiras:
A minha odisseia, como da maioria dos portugueses que se viram impelidos a
regressar, depois de 25 de Abril, a este pequeno torrão de terra, em
citação de Pessoa, “onde a terra acaba e o mar começa”, não me permitiu
explicar a minha decisão em vir para Portugal, em vez de rumar à África do Sul, a uma personagem de elevadíssima craveira profissional e humanista a quem
muito fiquei a dever em gratidão, e tal como eu, mas em circunstâncias
diferentes, muitos cidadãos de Lourenço Marques que a ele recorriam em
consultas ou operações do foro da Ortopedia. Refiro-me a Mr. David Roux de quem
tive a triste notícia do seu falecimento (em 1987), através de um documento biográfico, emanado do “Royal College of Surgeons of England”, que traduzo:
“David Roux graduou-se na Universidade de Pretória em 1949 e pouco
tempo depois começou a sua formação em ortopedia, trabalhando
principalmente no Hospital Geral debaixo da orientação dos Professores J M
Edelstein e G T du Toit. Fez uma breve visita a Londres em 1955 em que
passou do inicio ao final do FRCS em apena poucos meses.
Posteriormente passou um ano no Hospital de Cirurgia Especial em
Nova Iorque onde trabalhou para o Dr. John Cobb cujo principal interesse era em
escoliose e deformidades neuofibromatoses da coluna. No seu regresso à
África do Sul criou a primeira unidade de escolioses no Transval
onde se deparou com problemas motivados por tuberculose,
poliomielite e anormalidades congénitas. O seu trabalho foi lendário mas ainda
encontrou tempo para a pesquisa e ensino. Como cirurgião, apesar de da ausência
do seu dedo médio da mão, foi o mais dextro, exacto e preciso técnico”.
(Por julgar ser
do desconhecimento de grande parte dos leitores, abro um parêntese para
esclarecer que os médicos cirurgiões, membros do prestigiadíssimo “Royal
College of Surgeons of England”, não enjeitando a sua herança de
barbeiros-cirurgiões, com raízes na Idade
Média, utilizam o tratamento de
“mister” em vez de “doctor”).
Como referi no
início do meu artigo, perante a perigosa situação que se vivia em Moçambique, no período transição para a respectiva
independência, por tencionar rumar para a África do Sul, passou-me Mr.
David Roux um certificado (1974) de que cito este pequeno excerto: “Tive uma relação
profissional com ele durante sete anos, através de doentes que lhe enviei para
Lourenço Marques. Prestou um excelente serviço e se quiser emigrar para a
África do Sul teria prazer em endossar as suas qualidades como um benefício
para a África do Sul e em particular para o campo de ginástica correctiva.”.
No meu regresso
a Portugal, em concurso púbico para a leccionar
a disciplina de Recuperação e Terapia pelo Movimento, do ISEF da Universidade
do Porto, fiquei classificado em 1.º lugar, tendo sido contratado, por despacho
do Secretário do Estado do Ensino Superior e Investigação de 21 de Março de
1976.
É, pois, diante
da memória de um ser de eleição daqueles que perpassam em nossas vidas, e que pela sua grandeza nos fazem sentir
importantes por orbitarmos profissionalmente à sua volta, que eu escrevo
este singelo, mas muito sentido texto e me curvo respeitosamente em homenagem póstuma
a um cirurgião de inexcedível competência profissional e rigoroso cumprimento
do “Juramento de Hipócrates”. Repouse em paz, meu nobre, meu
querido e muito saudoso Amigo, Mr. David Roux.
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