sexta-feira, 18 de março de 2016

GERINGONÇA E CARANGUEJOLA

(Duas palavra sinónimas que entraram no léxico político, designando entidades visceralmente opostas)

Texto de A. Galopim de Carvalho


“Durante muitos anos, afirmou-se que a esquerda portuguesa era a mais estúpida do mundo por não ser capaz de equacionar, na justa medida, o essencial e o acessório. Isso acabou, e a direita parece ter ficado órfã de uma situação que, obviamente, lhe dava seguros dividendos de poder. Ontem viveu-se, na Assembleia da República, mais um acontecimento que marca a mudança de qualidade na política portuguesa. Pode dizer-se, sem sombra de dúvida, que se trata de mais um facto histórico na democracia portuguesa: a proposta de Orçamento do Estado para 2016 foi aprovada pelo PS, BE, PCP e PEV” (Fernando Paulouro Neves, no Blogue NOTÍCIAS DE BLOQUEIO, 17.03.2016).

A palavra “geringonça” aparece no Diccionário da Lingua Portugueza, do grande lexicólogo, António de Morais (1755-1824) definida, entre outras, como: coisa mal engendrada que ameaça ruina; obra mal feita e armada no ar.

Copiando-o de certa maneira, como é regra neste tipo de obras, o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, disponível na net, considera-a sinónima de “caranguejola” e, também entre outras, define-a como: coisa mal feita; obra armada no ar. Embora por forma ligeiramente diferente, o Dicionário Online de Português diz: coisa malfeita, que ameaça ruína; obra maljeitosa e mal armada que ameaça desconjuntar-se.

Como nome vulgar em zoologia a palavra “caranguejola” designa um crustáceo (Cancer paguros) comum na nossa costa, semelhante ao caranguejo, mas um pouco maior.

No Dicionário de Morais é ainda definida como: qualquer aparelho ou armação que está ou parece estar desconjuntado ou pouco seguro. O Online diz apenas: armação de madeira de pouca solidez. Por outro lado, no Priberam lê-se: traquitana velha; acervo de coisas sobrepostas e mal seguras; construção, artefacto, máquina, etc., que tem pouca solidez; pelo que a sinonímia indicada atrás tem toda a razão de ser.

Não procurei saber quem, com o oportuno sentido de humor (que descomprime naturais tensões), foi buscar estas palavras para rotular as duas correntes em frontal e acesa oposição nas bancadas do Parlamento. De igual pendor e do mesmo sinal no léxico da língua portuguesa, geringonça e caranguejola designam hoje dois grupos parlamentares de sinais contrários.

A primeira imagino ter sido inventada por por alguém de entre os que não souberam perder, com o propósito de achincalhar a vitoriosa maioria PS-PCP-BE-PEV, em crescimento, a segunda, afigura-se-me ter sido a resposta desta para, em termos de resposta de igual tom, dar nome à ressabiada minoria PSD-CDS.

Como geringonça, a presente maioria, apertando porcas e parafusos, consolida-se e caminha em frente, cada dia com mais segurança e solidez. Ao contrário, a caranguejola, a deixar para trás porcas e parafusos, desconjunta-se e afunda-se num mau perder mesquinho dos que não aceitam a derrota.

A. Galopim de Carvalho

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