sexta-feira, 1 de outubro de 2021

FRANÇA EM DEFESA DA ESCOLA PÚBLICA

O forte e concertado movimento, com protagonismo crescente, destinado a instalar um sistema educativo global/mundial, dinamizado por grandes organizações e corporações da mesma dimensão, tem feito tudo o que o que lhe é possível para desacreditar os sistemas educativos públicos nacionais e pô-los ao seu serviço. Nos últimos anos, e porque lhe é mais conveniente, tem-se esforçado por estilhaçá-los, deixando o seu núcleo central desactivado. Não se trata de uma conjectura: a UNESCO apresenta provas concretas disto mesmo num relatório de 2016 (ver aqui). 

Até agora, esse movimento tem razões de sobra para cantar vitória. Cada vez são mais os países, de vários continentes, que se lhe rendem sem dar luta, mostrando, até, entusiasmo por perderem uma conquista ainda tão recente na história da humanidade. E não falamos apenas dos sectores políticos mas também académicos, sociais, e, até, escolares. 

Porém, a unanimidade, que este movimento faz crer que é seu apanágio, vai apresentando brechas cada vez mais pronunciadas. Neste texto falamos de uma delas.

Em França corre um abaixo assinado para contestar as políticas para a educação do Governo de Emmanuel Macron, em que é Ministro da Educação Jean-Michel Blanquer, e apelar à comunidade para participar num encontro/manifestação nacional, a realizar no próximo dia 2 de Outubro.

O documento, com o título “Contre Macron et Blanquer. Reconquérir le bac et son caractère national. Reconquérir le droit à l’instruction” é assinado por sindicalistas, professores, alunos, pais e investigadores, que dizem estar juntos contra a destruição sistemática da escola pública e do direito à educação. É muito interessante que as suas primeiras linhas sejam as seguintes:

“O CEO da EDF [Electricidade de France] disse (…) em julho de 2021: «parece que o bac vai desaparecer, o que é uma notícia muito boa. É preciso, na verdade, que o Estado deixe de ser o prescritor da formação e que ela seja inteiramente confiado às regiões (...) para a aproximar das necessidades das empresas»”. 

O “bac”, designação “carinhosa” de “baccalauréat”, é um diploma, criado em 1808, que certifica a conclusão dos estudos secundários e viabiliza o acesso ao ensino superior. Ora, é esse diploma, que atesta a aquisição de uma certa cultura escolar por todos os que foram alunos do sistema público, que agora está em causa.

Pretende-se, na lógica das reformas “ocedeístas”, também em França, tornar o currículo “global” (seguindo as orientações/recomendações das grandes organizações que operam a este nível) e ao mesmo tempo “regional” (permitindo e legitimando a intervenção dos agentes/parceiros de proximidade que, assim, têm oportunidade de fazer valer os seus interesses), apagando o “nacional” (que é decidido pelo poder político que, em democracia, por ter sido eleito, tem legitimidade para tanto). 

Voltando ao comunicado, nele se lembra que o currículo nacional e a certificação das aprendizagens conseguidas era o “edifício de instrução pública”, que, agora, desaba. E desaba de modo acelerado à conta do argumento Covid 19. 

É a transmissão de conhecimento que está em causa, por ter sido aligeirada, porque nem todos os alunos aprendem o mesmo (o que estaria em programa) e porque passam a ser as empresas a escolher o que se deve aprender nesta ou naquela região em função das suas necessidades. 

Mas é também a função docente que se transforma. Os professores deixam de instruir para passarem a preparar para o trabalho. A isto acresce que em algumas zonas, em certas circunstâncias, estão a ser substituídos por animadores.

Mais se diz no documento: as muitas medidas destrutivas da escola, entre as quais se contam as acima mencionadas, decorrem de políticas que, deliberadamente, viram as costas às novas gerações para atender às exigências dos empregadores. "O ensino-mercadoria contribui para reduzir o aluno à qualidade de futuro trabalhador", diz Jérémie Daire, um dos contestatários dessas políticas (ver aqui).

As palavras de ordem são fortes: 

"A defesa da escola da República e dos seus princípios: uma escola nacional laica que educa, exige que este governo ao serviço da União Europeia e dos empregadores seja derrotado!"

Para redigirmos este texto usámos os documentos que podem se encontrados aqui, aqui e aqui

1 comentário:

Anónimo disse...

Quem tem dinheiro é que manda. Os antigos professores que, a cada dia que passa, têm vindo a ser rapidamente substituídos por mentores e animadores, também são obrigados a ensinar (quer dizer, a dar a passagem de ano, com uma classificação simpática) a indivíduos com graves deficiências mentais, ao nível da aquisição de competências e conhecimentos escolares, porque se parte do princípio de que somos todos iguais, portanto o melhor lugar para pessoas mentalmente doentes serem tratadas é a sala de aula com vinte e tal alunos e um professor prontos a transfigurarem-se em médicos especialistas.
Isto é só um exemplo, e uma farsa!
A escola, em Portugal, tem de voltar a instruir!

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