Novo texto de Eugénio Lisboa:
Em resumo – disse Tarrou com sim-
plicidade - , o que me interessa é
saber como é que alguém consegue
ser santo.
- Mas Você não acredita em Deus.
- Justamente. Poder ser
santo sem Deus
é o único problema que hoje me ocupa.
Albert Camus. La Peste
Assinalando
o centenário do PEN Internacional, fundado em Londres, em 1921, em boa hora a
Presidente do PEN Português, Teresa Martins Marques, resolveu publicar um livro
intitulado OS DIAS DA PESTE, que desse forte destaque àquele centenário,
centrando a celebração num tema que neste momento preocupa, de modo
particularmente angustiante, a humanidade de todas as latitudes e longitudes,
de todas as etnias, de todas as crenças religiosas (incluindo a ausência
delas), de todas as ideologias (ou de nenhuma), de todas as idades, em guerra
ou em paz: o COVID 19, uma das grandes pragas que têm avassalado o mundo.
Glosadas em várias obras famosas, de Bocaccio e Daniel Defoe a Albert Camus, as
grandes pandemias têm sido um dos mais mortíferos pesadelos que têm afligido a
humanidade, dizimando ao acaso milhões de seres humanos, entre os quais se
encontrariam provavelmente muitos talentos e até génios que para todo o sempre
ficaram perdidos.
Destes medonhos flagelos – a morte totalmente descontrolada, ceifando a torto e a direito – ninguém deixou mais impressivo testemunho do que Camus, enorme escritor e grande consciência do nosso tempo, destemidamente em luta contra todas as opressões totalitárias e grande mestre de inteireza e de coragem. Como esquecer acutilantes cintilâncias como esta: “Nada é menos espectacular do que um flagelo e, pela sua própria duração, as grandes desgraças são monótonas”?
Este
precioso e belo livro que Teresa Martins Marques e Rosa Maria Pina congeminaram
e organizaram, com o título que indiquei – OS DIAS DA PESTE – constitui uma
volumosa e generosa obra de 630 páginas, servidas por 272 autores de 58 países,
todos assinalando, cada um à sua maneira, esta grande peste do século XXI. A
qual só poderá ser completamente dominada pelo esforço contínuo, deliberado,
teimoso e obstinadamente atento de governantes, médicos, enfermeiros e, também
(ia dizer: sobretudo) de todos nós, sem excepção absolutamente nenhuma. Não
pode haver a mais pequena distracção que nos desvie de um grande objectivo
comum. Foi ainda Camus, no seu imortal romance – A PESTE – quem nos deixou este fundamental recado: “O que é natural
é o micróbio. O resto – a saúde, a integridade, a pureza, se quiser – é um
efeito da vontade, de uma vontade que não deve jamais deter-se. O homem
direito, aquele que não infecta quase ninguém, é aquele que tem o menor número
de distracções possível.”
Este livro
que, para ser consumado, envolveu um gigantesco e obstinado esforço que não
custa imaginar e que ficará como um marco a assinalar um dos mais negros
períodos da história da vida humana, tem tido, curiosamente, pouca repercussão
nos meios da comunicação social. É pena porque lê-lo é encontrar bom
combustível para os que gostam de reflectir no que profundamente nos aflige.
Eugénio Lisboa
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