domingo, 6 de dezembro de 2020

CULPAS DA DESCOLONIZAÇÂO

 

         ( Na foto chegada ao Aeroporto de Lisboa dos chamados "retornados" com parcos haveres ganhos após uma vida de trabalho )

Na crença popular não há dois sem três. Fiel que sou à voz do povo, depois, de nos primeiros dias deste mês natalício de 2020, ter publicado dois post’s, respectivamente, “Mais uma vez a Guerra do Ultramar” e “Fardos de Fome", cumpre-me publicar a fotografia de uma trilogia “Culpas da Descolonização” (“Correio da Manhã”, 28/09/1990).

Afirmou Pitigrill que “tudo deve ser discutido; sobre isso não há nenhuma discussão” até porque “não há factos eternos nem verdades absolutas,  segundo Nietzche.

Publico a foto do meu último artigo supracitado.


Em citação  de Eça: "Achais estas páginas cruéis? Pensais que não me dói tanto escrevê-las como a vós dói lê-las? Pensais que é com o espírito alegre, e a pena ao vento, que levantamos um por um, diante do público, os farrapos da vossa decadência?"

As verdades sempre foram duras de ouvir, esta é a minha verdade, embora eu saiba que cada um tem a sua verdade que flui com o tempo e que, dificilmente,  gera consensos. Consensos tanto mais difíceis  entre quem os vivenciou e aqueles que dizem por terem ouvido dizer, passe o plebeísmo, emprenhando pelos ouvidos da sua escravidão partidária! 

P.S.: Receoso que o texto seja difícil de ler por a foto estar pouco nítida, , transcrevo-o:

“Tendo vivido em Moçambique durante 18 anos e daí ter partido em vésperas da sua independência é natural que tenha uma perspectiva pessoal, embora a deseje desapaixonada sobre a acção colonizadora de Portugal em África.

Porém , provando que o facto de se ter vivido em África, e dela se ter feito uma segunda pátria, não é  condição “sine qua non” para um completa compreensão  da sua controversa  problemática, transcrevo um excerto de Salazar (1959) sobre o caos  que se viria  a abater sobre os territórios ultramarinos, evitável  para muitos por uma descolonização feita  a seu devido tempo e noutras circunstâncias: “(…)  esses povos (…) têm  apenas diante de si duas alternativa: a regressão  ou a submissão  a novos dominadores”.

Na acusação de Portugal não ter criado uma elite negra capaz de governar, cometem muitos uma injustiça  para com , entre outros, Amilcar Cabral (Guiné-Bissau), Agostinho Neto (Angola) e Eduardo Mondlane (Moçambique) todos licenciados, os dois primeiros com diplomas obtidos em universidades portuguesas.

Parece-me, portanto, que o fracasso da descolonização não se ficou  dever tanto  à escassez de um escol africano mas deles próprios se não se aperceberem  quando chegaram ao poder, que o que estava em causa era o progresso social (económico, educativo e sanitário) das populações e não o seu ou de uma clientela que passou da clandestinidade à acção governativa  ou partidária de um só partido

Após  a descolonização, pela ausência unificadora da presença portuguesa e de um forte sentimento nacionalista que se não gera  pelo simples agrupamento de etnias diversas com costumes, culturas e religiões diferentes, logo a população moçambicana se lançou em lutas tribais que  provocaram um verdadeiro genocídio entre gente da mesma raça.

Talvez por isso e/ou por os portugueses não serem colonizadores, no sentido pejorativo da palavra, a luta no mato nunca se assumiu com o cunho de uma verdadeira guerra de libertação nacional. Prova-o a livre circulação de civis desarmados, na maior parte do território moçambicano (dias antes de 25 de Abril deslocava-me eu e a família de automóvel  de noite, a centenas de quilómetros de distância), e o esmagador número de negros que se bateram na frente de combate ao lado dos brancos, sem memória de deserções significativas ou de desobediência para com os superiores..

Durante o governo de transição surgiram os “soldados” da Frelimo (nascidos em Moçambique e levados em criança, à força, para países limítrofes de expressão inglesa, Tanzânia e Zâmbia, onde eram politizados e recebiam instrução militar) maltrapilhos e descalços mas com as mais modernas armas de fabrico soviético ao ombro e exprimindo-se em dialecto prezado próprio ou num inglês arrevesado  e sem entenderem patavina do idioma de Camões.

Cheia de razão muita gente se interroga (de entre elas eu próprio ), sobre a quem cabe a responsabilidade da desastrosa descolonização portuguesa. Ser-me-ia cómodo remeter a culpa para a “utopia marxista, cega e néscia ” (Soljenitsyne ) e, mais ainda, encostar à barra da opinião  pública o peito dos homens que na altura governavam ou das eminências pardas que influenciavam as decisões do Terreiro do Paço.

Cometeria, porém, a injustiça de deixar à porta da memória colectiva dos portuguese os civis e militares que, isoladamente ou à sombra dos partidos políticos  com a imposição de “nem mais um soldado para as colónias”  criarem um clima de pressão para a retirada ultramarina de Portugal, rápida e quase  sem condições.

E a que título se podem inocentar  países como os Estados Unidos ou Cuba, por exemplo, que na cobiça das riquezas do continente africano fizeram uma política semelhante à da União Soviética para a emancipação precipitada e desastrosa dos territórios portuguese a sul do Equador?

Porque os terrenos diamantíferos e os poços de petróleo produzem mais em tempo de paz, agora, segundo os media, sob proposta do governo português e alguma relutância angolana, a União Soviética e os Estados Unidos estarão presentes, na qualidade de observadores, no próximo encontro MPLA/UNITA que procura um acordo definitivo de cessar de fogo em Angola.

Mas cairá bem aos olhos do mundo e da diplomacia montar um cenário internacional com eles, em que os incendiários  escondem  a sua responsabilidade na descolonização portuguesa, aparecendo agora no papel de soldados da paz, num fogo que atearam antes´(fim de citação).

À laia de "post scriptum", não posso deixar de me interrogar sobre a culpabilidade dos políticos portugueses responsáveis  por uma descolonização por eles tida, por não fazerem a coisa por menos, como exemplar! Em descrença minha e por experiência de vida, escrevi  que quem diz o o que pensa é reacionário, quem diz o que lhe manda o partido é progressista! E ser progressista não pode ser, de forma alguma, adjectivar a descolonização portuguesa como exemplar, facto que o genocídio no norte de Moçambique desmente ao vitimizar um povo bom, generoso  e hospitaleiro que bem melhor sorte merecia. As culpas, como de costume, num país de passa-culpas,  não podem, e muito menos, devem morrer solteiras. Faça-se, pelo menos, uniões de facto ainda que só para varrer uma testada de vergonha!

2 comentários:

Bmonteiro disse...

Racismo pós-moderno

O autor abaixo, amante da liberdade africana, mas sem cultura (ou deformação) marxista, religioso e meio ocidentalizado, será talvez uma testemunha menos abonatória – Eduardo Mondlane:
A) 10/09/51 – Não sou cidadão da África do Sul, embora tenha sido educado em Johansburgo. Nasci na África Ocidental Portuguesa, na capital, chamada Lourenço Marques.
(…) Os problemas sociais, políticos e económicos do meu país são um pouco diferentes dos da União da África do Sul. Por exemplo, nós não temos uma barreira de cor ou discriminação racial no nosso país.
(…) Pessoalmente penso que há duas maneiras que ajudarão os africanos:
1.Educação massiva…
2.O espalhar da verdadeira cristandade.
(…) É esta a razão porque eu tenho a obrigação de regressar a África para fazer tudo o que puder para contribuir com a pequena parte de boa vontade com que eu sei que Deus quer que eu contribua na vida.
B) 24/09/51 – Lembra-te que eu próprio não sou cidadão sul-africano. Sou cidadão português. No meu país não temos leis de segregação… Eu farei tudo para lutar pelos direitos do meu povo no meu próprio país…
C) 24/04/54 – O meu desacordo com o governo tem pouco a ver com a sua política racial porque, embora não seja a ideal, não é tão má como a dos países vizinhos… O que não posso suportar é a falta de liberdade de expressão. Isto é verdade para todos os cidadãos portugueses, em Portugal e em África.
PS: enxertos das cartas de Mondlane a sua mulher Janet.
Livro de Nadja Manguezi, Maputo 2001, Centro de Estudos Africanos e Livraria Universitária:
Com “Uma história da vida de Janet Mondlane” com o título “O Meu Coração está nas Mãos de um Africano”
Barroca Monteiro
PS: enviado a Daniel Oliveira, Expresso, crente na genética pró racial da sociedade lusa.

Rui Baptista disse...

Já sabe qual foi a reacção de Daniel Oliveira ou ter-se-á ele remetido a um silêncio comprometedor? Se tiver, porventura, havido gostaria que a publicasse que isto do racismo se está a tornar num tema altamente polémico em que o racismo negro toma a dianteira. Mondlane era um moderado que muita falta fez a Moçambique e a Portugal porque o ódio racial não se combate acicatando-o. O povo moçambicano é um povo que me merece o maior respeito e amizade fraternal.

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