Eça com uma prosa elegante, mas demolidora de fina ironia, reconhecida por ele próprio, quando diz (cito de memória) que uma boa gargalhada faz aluir instituições, e Camilo em estilo caceteiro. Por esse facto, fico desiludido quando um jornalista moçambicano vem a Portugal para, em casa alheia que lhe devia merecer respeito, acusar este país, que deu "novos mundos ao mundo", de ser responsável pelos "fardos de fome" que assolam o continente africano sem referenciar os respectivos e actuais governos dessa responsabilidade.
Mas melhor será o leitor ler essa acusação de Machado da Graça e a minha resposta a esse desaforo, até porque eu não sou de levar desaforos para casa. Em face de antagónicas posições o leitor poderá tirar as suas ilações. Curial me parece esclarecer que Machado da Graça, quem sabe se para não me dar confiança para terçar armas com um profissional da escrita, não deu continuação a uma temática que deve ser escalpelizada sem ficar no ar um simples cabelo de suspeita.
Infelizmente, por ele já ter falecido, resta aos defensores da "Descolonização Exemplar" explicar a adjectivação de "exemplar" em que os novos colonizadores pertencem ao povo desses países , explorando-o, sem pingo de vergonha, até ao tutano. "Alea jacta est"!
P.S.: Se, porventura, o leitor tiver dificuldade em ler o texto da foto, disponibilizo-me a transcrevê-lo.
Por via das dúvidas, transcrevo-o. Assim:
"No limiar do meio milénio da demanda de Vasco da Gama à "Terra da Boa Gente" (Inhambane - 1493 ) e de uma miscigenação que fizeram dos portugueses uma excepção dos povos que nuca se fixaram verdadeiramente em solo africano - muitas mulheres belgas iam ter os filhos à Bélgica para que não nascessem em África.
O jornalista moçambicano Machado da Graça [ "tripeiro" de nascimento ] escreve,, no passado dia 30 de Julho, sob o título "Falar de fardos numa manhã de verão", "que não pode deixar de pensar na velha imagem colonial de uma longa fila de negros transportando à cabeça os fardos dos homem branco (...) com as riquezas que o dito homem branco trazia para melhorar a vida na sua civilizada Europa".
E porque o indisfarçável rancor só deixa ver o lado feio das coisas insiste ele: "O homem branco (...) deixou-nos fardos como, por exemplo, 97 por cento de analfabetismo", percentagem muito discutível e que desvia a atenção do facto de não haver memória de terem morrido de fome os nativos de Moçambique, antes da descolonização!
Falemos claro! Para o senhor Machado da Graça o analfabetismo era quase total no ano de 1974. Paradoxalmente, de acordo com a insuspeita revista "Jeune Afrique" (1972), "Moçambique possuía o maior índice de escolarização de grande parte dos estados africanos".
Não será essa a actual percentagem actual de mortes em combates fratricidas e por carências alimentares de toda a ordem, e daqueles esfaimados que aguardam o mesmo destino trágico? Contas feitas, dos escassos 3 por cento restantes, um está de férias bem burguesas e descansadas em praias portuguesas - o senhor Machado da Graça.
Lá longe, na sua pátria distante, incontáveis mães pretas, seios esqueléticos, e em abraço derradeiro, aos filhos que em lenta e dolorosa agonia lhes morem de fome - que os frutos da ideologia e as raízes do sofrimento não alimentam como o leite materno.
Nessa mesma hora, o senhor Machado da Graça, segundo ele próprio, "pega na toalha e volta para a beira-mar, que lá é que se está bem.!
Bem-aventurado e fresco que nem uma alface, em terra hospitaleira e mar português, de regresso aos seus estivais aposentos, através de indelicado e polémico texto, transfere para os "retornados das colónias", ou para a recordação ainda dolorosa das mães que em "Lágrimas de Portugal" (Pessoa) que viram partir os seus filhos para um guerra que, aparentemente, a seu olhos, de não lhes dizia respeito, com o custo dos erros de uma desastrosa política económica. Os fardos de fome não foram os portugueses que os lá deixaram"! (fim de citação).
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