A produção exponencial de heróis com direito a "quinze minutos de fama" passou a ser um aspecto normal no funcionamento dos sistemas educativos. Com uma cadência diária, ou quase, temos conhecimento da intenção de distinguir ou da distinção decidida/atribuída a/o(s) melhor(es) escola(s)/universidade(s), projecto(s), iniciativas, professor(es), aluno(s)... Se nos posicionarmos em Portugal, há prémios à escala planetária, europeia, ibérica, nacional, local, de escola/universidade...
O que a escola e a universidade faz, tendo em conta a sua natureza, não é reconhecido pelo valor educativo/de conhecimento que possa ter, com a discrição que se espera: ensinar, aprender, investigar. Se não houver um agraciamento sonoro o trabalho é deitado a perder. O curriculum vitae-tipo de um estudante ou profissional passou, de resto, a incluir um item fixo que tende designar-se por "prémios e distinções".
Surpreende-nos, também, o tipo de prémios: a imaginação tem de ser esticada para se conseguir acrescentar mais um e mais outro à já infinita lista. Acontece que a imaginação é esticada para rotas que se desvinculam da rota da escola e da universidade, para aquelas que, como é evidente, são as das entidades que atribuem os prémios: empresas, fundações, Estado, organizações internacionais, associações científicas e profissionais... A ordem é mais ou menos esta, podendo haver ligações entre estas entidades e, frequentemente, essas ligações existem.
Eis o mais recente exemplo de imaginação para um prémio na escolaridade obrigatória. Certamente que o leitor julgará por si mesmo...
O Governo (através do Primeiro Ministro, em visita oficial à Índia), e o Ministério da Educação (através do Ministro da Educação), anunciou a atribuição, com periodicidade anual, do Prémio Gandhi de Educação para a Cidadania. A primeira edição será sobre os princípios éticos para o bem-estar animal. O prémio, enquadra-se na Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania (2017) sendo “inspirado nos pensamentos e afirmações” do líder indiano Mahatma Gandhi (1869-1948). Pretende-se “honrar um grande homem” e “conduzir as suas ideias para um futuro melhor, assente na esperança e na dignidade para todos” (nota retirada da notícia elaborada por Manuel de Almeida/Lusa (aqui).
Maria Helena Damião e Isaltina Martins
3 comentários:
Os formandos/ professores nas escolas básicas e secundárias portuguesas devem, no final de cada período letivo, avaliar a criatividade de todos cada um dos seus formandos/ alunos, como muita, pouca, ou nenhuma, apondo uma cruzinha no quadradinho respetivo. A burrice da burocracia educativa vai por aí fora, porque os professores e educadores de infância são funcionários que se comprazem em cumprir ordens.
Já para não falar no Professor Doutor António de Oliveira Salazar, cuja política educativa ia beber à fonte do catolicismo cristão, que propõe à juventude um mundo baseado no amor entre todos os homens e mulheres, porque não instituir um prémio de educação para a cidadania tomando como modelo a figura humanista de um português, como o “engenheiro” José Sócrates, com créditos firmados em estudos sobre a tortura em democracia, nas Novas Oportunidades, para velhos e novos, nas licenciaturas por equivalência, ao domingo, nos indestrutíveis computadores Magalhães, na Área de Projeto, de cariz obrigatório, e na entrada na linha dos professores dos ensino básico e secundário, juntamente com os educadores de infância?!
Música de fundo para a leitura da notícia :
https://www.youtube.com/watch?v=qc0ZwEDGq6U
Prezados Leitores
Conheço bem as grelhas em causa com os seus itens, especificações e respectivos quadradinhos. Não pode haver instrumentos de avaliação mais desconcertantes, não têm qualquer justificação na investigação pedagógica digna desse nome; introduzem na apreciação dos alunos elementos claramente ideológicos, subjectivos. E, no entanto, elas estão em todas as escolas, replicam-se e usam-se... Talvez porque muitos professores e educadores são entendidos e, sobretudo, entendem-se (entendemo-nos) como funcionários que cumprem o que lhe (nos) é dito para cumprir em vez de se entenderem (nos entendermos) como intelectuais que agem em função de princípios.
Cordialmente,
MHDamião
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