terça-feira, 3 de julho de 2018

"Professores apaixonados" ou o marketing de um negócio em florescimento

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De actividade individual, mais ou menos modesta, mais ou menos recatada, as explicações passaram para um nível empresarial bem organizado e consolidado.

Basta dar-se uma volta, que nem precisa de ser  grande, pelas nossas cidades, quer seja pelas maiores quer seja pelas mais pequenas, para se perceber que o negócio floresce: encontram-se em praças, ruas e travessas apartamentos, lojas e prédios letreiros a indicar "centros" e  "academias" de "reforço escolar".

Anunciam múltiplos serviços de apoio para todos os anos de escolaridade - básico, secundário e superior - e para todas as disciplinas, temas, etc.

A sua dimensão pode ser local, regional e nacional, mas começam a surgir transnacionais; a sua sede não é só física mas também virtual.

Com esta dupla configuração, ganham flexibilidade para atenderem às necessidades dos clientes (neste caso, o termo "cliente" está correctíssimo):
Dou aulas presenciais na casa do aluno. Dou aulas por webcam. Dou aulas presenciais em minha casa ou na casa do aluno. 
Usam o marketing que qualquer outra empresa usa: os "sites" são apelativos; a linguagem é multifacetada, moderna, os termos em inglês são frequentes; os professores-explicadores, jovens e sorridentes, são apresentados como "perfeitos", "apaixonados", diz-se estarem sempre "disponíveis"; afirma-se a personalização do trabalho e a atenção individualizada, bem como o conforto; garantem-se resultados em testes e exames...

A progressiva expansão destas empresas e o modo como se apresentam constitui um indicador muito fiável da diluição da escola pública: enquanto em relação a esta (ensino gratuito, para todos) se recusa a função do professor, afirmando-se que o aluno descobre por si mesmo ou com os pares o seu próprio conhecimento; naquelas (onde se paga, para alguns) a marca é o que professor faz para o aluno aprender. E, ainda que a tecnologia esteja em destaque, o (velho) método é destacado. Como diz um professor, na promoção dos seus serviços.
Acredito que a melhor metodologia para as sessões seja uma sucessão de pequenas introduções teóricas, seguidas de bastantes exercícios. Desta forma, o aluno começa com uma ideia geral da matéria e aprofunda esse conhecimento através da resolução de problemas práticos. 

2 comentários:

Anónimo disse...

Para a generalidade dos encarregados de educação, e respetivos educandos, o sucesso na escola mede-se por diplomas que abrem as portas, do Estado, ou da privada, onde poderão satisfazer as suas necessidades e ser alguém na vida! Essas minudências de ensino e aprendizagens são boas para teóricos bens instalados que se deixaram aburguesar e já se esqueceram o quanto custa aturar professores que dizem que o teorema de Pitágoras, a Mensagem de Fernando Pessoa, o ácido desoxirribonucleico, a Lei da Inércia, ou o princípio do funcionamento dos espetrómetro de massa, por exemplo, são matérias muito importantes que devemos estudar empenhadamente e com muito gosto!
Ora, nos centros de explicações trabalha-se diretamente para as notas. Repetem-se, até à náusea, a resolução das provas de exame dos anos imediatamente anteriores e, dada a simplicidade da reduzida matéria alvo de avaliação, os exercícios propostos, ao longo de anos sucessivos, são sempre tão parecidos que acaba por compensar andar em explicações. As explicações não se destinam, principalmente, aos alunos menos dotados, como noutros tempos em que já era muito bom passar de ano, agora o grande objetivo do aluno médio é atingir os vinte valores, nem mais nem menos, e, muitas vezes, atinge!
A massificação do ensino, com o golpe de misericórdia da escolaridade obrigatória até aos dezoito anos, afastou da escola o critério da qualidade, acabando por ter o efeito perverso de guindar aos cursos com melhores saídas profissionais os alunos mais ricos que têm dinheiro para pagar colégios, explicações e notas elevadas!

Carlos Ricardo Soares disse...

Não podemos ignorar que a escola, as escolas, com seus critérios e com a sua falta de critérios, apanham na rede todas as crianças, das mais entusiásticas e iludidas (crentes) às mais tristes e maltratadas. Gostar da escola é um problema tão grave, ou ainda mais, do que não gostar. Ou, por outra, não gostar da escola não seria um problema se não fosse um problema gostar da escola. Os problemas não existiriam se não fossem criados. Pode não haver, em última análise, criacionismo culpabilizante, mas há uma angústia, até na alegria dos resultados. A sensação de que se vive para as convenções e de que não há alternativas ao faz de conta que conta, pode ser intransponível para muitas crianças e jovens (os adultos já se acostumaram), enquanto para outros será muito natural e, a breve trecho, espectacular.
Este contexto está longe de ser selvagem, mas as oportunidades e os proveitos não. Quem está interessado na verdade? E na verdade desportiva?
Só de pensar no que seria necessário para encarar a realidade, faz preferir continuar na ilusão.

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