quinta-feira, 15 de março de 2018

UMA CASA DO CONHECIMENTO EM COIMBRA



Artigo meu que saiu no Diário de Coimbra na terça-feira passada:

Quando há alguns anos, quando era Director da Biblioteca Geral, ao verificar a falta de espaço das velhas instalações lancei aos meus concidadãos o desafio de construção de uma Casa do Conhecimento - Biblioteca do Século XXI em Coimbra, que poderia ser uma moderna biblioteca da Universidade e da Cidade, nas instalações do Estabelecimento Prisional de Coimbra. Estou em crer que o desafio se mantém actual. Mais do que nunca, Universidade e Cidade precisam de se reunir em grandes projectos comuns, que alimentem culturalmente Coimbra, a região Centro e o país. O facto de, em 2027, uma cidade portuguesa - desejamos que seja Coimbra –  vir a ser Capital Europeia da Cultura obriga-nos a pensar em iniciativas que, ancorando-se no nosso rico passado, nos possam impulsionar animicamente para o futuro.

Porquê uma Casa do Conhecimento - Biblioteca do Século XXI? Porque Coimbra é a Cidade do Conhecimento. Porque em Coimbra há uma extraordinária herança de livros e autores, tanto nas humanidades como nas ciências, assim como uma também notável herança de casas editoras e de livrarias. Não é por acaso que a Universidade de Coimbra – Alta e Sofia são Património Mundial da Humanidade. É, em parte, devido à existência desse vasto espólio, do qual a Biblioteca Joanina, indiscutivelmente uma das mais belas bibliotecas do mundo, é a mais brilhante montra, que somos Património Mundial. Mas a Biblioteca Geral da Universidade, hoje mais do que ontem, está a rebentar pelas costuras. Acresce que a Biblioteca Municipal da Cidade, a qual, tal como a Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, também alberga um legado muito rico, não está  suficientemente valorizada no país e no mundo. Beneficiando as duas de depósito legal e estando as duas tão próximas uma da outra, sofrendo as duas das mesmas necessidades, justifica-se mais do que trabalho conjunto o aproveitamento de um espaço comum, num modelo de funcionamento que persevere evidentemente as tradições e os direitos de cada uma. Trabalhando em conjunto e dispondo de modernos espaços de leitura, de reservas ampla (desejavelmente subterrâneas, para melhor preservação), de equipamentos audiovisuais (porque as bibliotecas de hoje e ainda mais as de amanhã não são só letras mas também sons e imagens), de um auditório acolhedor, de espaços expositivos amplos, de uma livraria e espaço de restauração, poderiam aspirar a ser a melhor biblioteca do país e uma das melhores da Europa. Poderiam, por exemplo, ligar o papel e o digital de formas muito inovadoras.

Por outro lado, a Penitenciária de Coimbra está completamente fora do seu prazo de validade. É do século XIX, apesar de ainda funcionar nos dias de hoje. Não oferece condições mínimas para os fins a que se destina. Além do mais está a roubar espaço à cidade, muito próximo desse sítio tão demandado que é a Alta universitária. Actualmente não fazem nenhum sentido prisões dentro da cidade. O espaço que está dentro dos muros da prisão poderia inspirar uma boa equipa de arquitectura que conseguisse conciliar a preservação do corpo principal do edifício e a memória do espaço com a criação de instalações funcionais de uso cultural não só para estudantes, que bem precisam de novos sítios de estudo e convívio,  como para todos os cidadãos, residentes em Coimbra ou vindos de fora. Boa parte do espaço entre o Parque de Santa Cruz e o Jardim Botânico poderia passar a ser verde, tornando Coimbra uma cidade  ambientalmente sustentável e ainda mais agradável para viver. Há exemplos no mundo de espaços antigos que foram criativamente aproveitados com obras contemporâneas arrojadas, que mudaram por completo a vida das cidades onde foram feitos. E Coimbra sempre foi um sítio de mudanças, por exemplo a construção da Biblioteca Joanina sobre uma prisão medieval.

O ano de 2027, em que Coimbra se pode e deve mostrar ao mundo, está à porta. Existe fundos disponíveis para lá de 2010 cuja utilização tem de ser agora definida. Será que a Universidade e a Cidade conseguem trabalhar em conjunto? Seremos capazes de ligar o passado ao futuro através de um projecto ambicioso? Quero acreditar que sim.

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