sexta-feira, 30 de março de 2018

Recordando o Professor de Educação Física Anastácio Sarmento


E francamente devo dizer que levantar trinta quilos em cada pulso, trepar a um quarto andar por uma corda, saltar a pés juntos um fosso com dois metros de largura, me parece, com relação ao domínio do homem sobre o mundo exterior, uma cousa tão importante, pelo menos, como fazer análise gramatical e a análise lógica de uma oração de Cícero”.
José Ramalho Ortigão (1836-1915)

Viveu Anastácio Sarmento a sua formação académica e múnus profissional num tempo em que só havia em Portugal três universidades, duas em Lisboa, uma em Coimbra e outra no Porto, com um acervo apenas de duas dezenas de cursos superiores. Coexistiam com elas quatro escolas superiores não universitárias: o Instituto Nacional de Educação Física, Arquitectura, Escola Naval e Academia Militar todas com  exigência curricular, prestígio e dignidade (cf., Decreto-Lei n.º 36507, de 17 de Setembro de 1947).
Licenciou o INEF nomes da cultura portuguesa de que destaco, a exemplo de outras vezes, como “primus inter pares”, o nome de José Esteves autor do notável livro: “O Desporto e as Estruturas Sociais”. Outros nomes houve, numa altura em que se homenageia tantos medíocres e se olvida tanta gente de valor, que da lei  do esquecimento têm sido vítimas, quiçá, pela interioridade das terras em que exerceram uma docência digna de louvor. Refiro-me, por exemplo, ao Professor Anastácio Sarmento, dando conta do seu percurso docente e homem do desporto em terra de Viriato, ainda que em breves pinceladas exigidas por um "post". Assim:
Precocemente falecido em 1980, o professor de Educação Física, de seu nome completo Anastácio Campos de Aguiar Sarmento, licenciou-se, em 1955, pelo INEF, tendo exercido a docência na Escola Industrial  e Comercial de Viseu com uma acção multifacetada prestimosa, reconhecida em várias e extensas reportagens e artigos jornalísticos laudatórios.
Assim, nas décadas 60/70, evidencia-se no desempenho dos cargos de presidente do Conselho Técnico e treinador regional de atletismo com resultados alcançados nas pistas regionais e nacionais de atletismo. Igualmente, responsabiliza-se pela organização de inúmeras provas para atletas federados e simples populares que aderiram a esta modalidade olímpica  que se virão a inscrever nos clubes e centros escolares sob a égide da Mocidade Portuguesa.
É, em consequência desta sua notável acção que, em 1965, um jovem de frágil constituição física, rendido inicialmente à prática do futebol, experimenta a prática do atletismo sob a orientação do Professor Anastácio Sarmento. Era ele Carlos Lopes que viria a participar na sua primeira prova oficial, a corrida de S. Silvestre em Viseu. Nascia, quiçá, em baptismo dos deuses do Olimpo, a medalha de ouro portuguesa alcançada nos Jogos Olímpicos de 1984, em Los Angeles.
Em recordação de personalidades para quem a gratidão não é palavra, vã transcreve-se  este comovente testemunho de Carlos Lopes (“Programa da RTP, 1994, ‘Com peso e medida, com Nicolau Breyner´”):
“Eu devo muito ao Professor Sarmento que, infelizmente, já faleceu. O Professor Sarmento, que era professor de Educação Física, é que me levou muitas vezes, mesmo muitas vezes, para a Escola Comercial onde me treinava, dava ginástica, fazia tudo, mesmo quando eu não queria ele mentalizava-me que era possível e que eu conseguia fazer. Desde o início, eu tive a sorte de encontrar pessoas à altura para poder singrar na vida!”
De uma vida plena de dádiva à sua profissão e falecimento de Anastácio Sarmento, quando muito havia ainda a esperar da sua docência, procuro respaldo  em Fernando Pessoa: “O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem!”

6 comentários:

karl disse...

Amizade, memória e gratidão são muito mais do que palavras, são manifestações de uma forma de estar na vida. Para Anastácio Sarmento, como para Rui Batista, a única.
Bem-haja!
Carlos Sarmento

Unknown disse...

Caro Professor Rui Baptista, muito obrigado pelo seu texto. Não conheci, fisicamente, o Professor Anastácio Sarmento. No entanto, neste seu testemunho, foi-me possível perceber a elevação da sua acção através deste sinal de reconhecimento e gratidão.
Um forte abraço.
António Figueiredo

Rui Baptista disse...

Por lapso, de que me penitencio perante os respectivos licenciados, não mencionei a antiga Escola Superior Colonial que eleva as escolas superiores não universitárias existentes à época, de quatro para cinco, com a inclusão da antiga Escola Superior Colonial.

Anónimo disse...

Estimado Professor Rui Baptista,
Muito obrigado pelas suas sempre distintas reflexões.
Um abraço amigo,
Raul Martins

Rui Baptista disse...

Caro Doutor António José Figueiredo, foi com incontível júbilo que vi o comentário de um meu antigo aluno do corpo docente inicial da Faculdade de Ciências e Desporto e de Educação Física da Universidade de Coimbra.

Isto, porque numa espécie de testemunho se perpetua a entrada do INEF (1975) na mais antiga, e mui prestigiada, Universidade Portuguesa. Bem haja meu Amigo.

Rui Baptista disse...

Distinto Doutor Raul Martins, simpatia a sua.

Ocorrem-me palavras do nosso imortal Vieira: "Quando se olha com simpatia para o cisne preto até o cisne preto nos parece branco!"; "Quando se olha com antipatia para o cisne branco até o cisne branco nos parece preto!"

Páscoa Feliz, com um abraço amigo.

O BRASIL JUNTA-SE AOS PAÍSES QUE PROÍBEM OU RESTRINGEM OS TELEMÓVEIS NA SALA DE AULA E NA ESCOLA

A notícia é da Agência Lusa. Encontrei-a no jornal Expresso (ver aqui ). É, felizmente, quase igual a outras que temos registado no De Rerum...