Meu artigo saído hoje no jornal I:
A ciência é, hoje em
dia, indissociável da inovação, isto é, da transformação da sociedade. Ela tem
impacto nas nossas vidas através de descobertas e invenções que ficam à
disposição de todos. Na nossa civilização global, a ciência está por todo o
lado: na saúde (a longevidade hoje é maior graças a avanços científicos), nas
comunicações, nos transportes, na energia, etc. O impacto da ciência nas nossas
vidas está, porém, longe de se restringir a aspectos materiais: a ciência é,
primeiro que tudo, saber e, portanto, cultura.
Em Portugal, que
beneficia da ciência que é feita por todo o mundo, também se faz ciência e inovação. Mas o esforço nesse sentido numa escala razoável é recente. Só desde
há vinte ou trinta anos é que cresceu substancialmente o número de
investigadores e o número de artigos científicos e protótipos tecnológicos. E só
desde então cresceu a cultura científica, sem a qual a ciência dificilmente
pode existir. A entrada da ciência nas empresas é ainda mais recente, apesar de
haver alguns bons exemplos anteriores. Foi o estabelecimento de políticas
públicas favoráveis à ciência e tecnologia que permitiu colocar Portugal no
mapa da ciência. O nosso país subiu extraordinariamente nos rankings da ciência e tecnologia, tendo
abandonado a cauda da Europa. Hoje, olhando para uma série de parâmetros, não
estamos ainda na média europeia, mas estamos bem mais perto do que estávamos
quando entrámos na União Europeia. De facto, foi a ajuda europeia que possibilitou
essa escalada. Mas houve também a visão política de mobilizar uma parte ainda
que diminuta dos financiamentos europeus em favor da ciência.
Estamos, sem dúvida,
melhor do que estávamos. Mas devemos ter a ambição de querer mais, quer dizer,
de atingir e até ultrapassar a média europeia. Impõe-se, por isso, uma reflexão
sobre o estado da nossa Ciência e Inovação, assim como uma tentativa de
prospectiva. Questões actuais são a avaliação do sistema científico-tecnológico,
a ligação da ciência ao ensino superior, a ligação da ciência à economia
(ligada de perto à questão do emprego científico) e a cultura científica. Subsistem
problemas em todos essas vertentes: a recente avaliação da FCT está longe de
ser perfeita, o ensino superior precisa de renovação, as empresas nacionais não
albergam suficiente ciência (até porque empregam poucos cientistas) e a cultura
científica deixa entre nós a desejar.
A Fundação Francisco
Manuel dos Santos (FFMS) tem por missão estudar Portugal, em particular a sua
evolução recente com base em indicadores, como os que estão reunidos na
PORDATA. A FFMS vai em breve anunciar o do estudo Ciência e Tecnologia em Portugal, 1995-2011: métricas e impactos,
que mostra comparações internacionais em complemento de A Ciência em Portugal, um dos ensaios da Fundação. Aprofundando o
debate em torno da ciência, a FFMS continuará em 2015 o seu ciclo de Conferências de Ciência na sequência das que organizou na
Universidade do Porto em 2013 e na Universidade de Lisboa em 2014, respectivamente
com o Prémio Príncipe de Astúrias Pedro Echenique e o Presidente da Royal
Society Paul Nurse. Interessa também à FFMS analisar a transferência de
conhecimento científico para as empresas, para o que apoiará projectos nessa
linha. Como entra a inovação nas empresas? Empresas inovadoras são, de facto,
empresas mais bem sucedidas do ponto de vista económico? Como é a dinâmica, em
casos exemplares, entre ciência e cconomia? Sendo também pertinente estudar a
cultura científica da população, está já em curso um mini-estudo sobre esse
tema: Que níveis de cultura científica existem em Portugal em comparação com
outros países? Onde obtêm os cidadãos informação sobre assuntos científicos? Por último, a FFMS gostaria de congregar numa
plataforma os cientistas portugueses espalhados pelo mundo e de os convidar ao
debate sobre o futuro da ciência e do país. Não é só a ciência que nos salva,
mas sem o apoio constante da ciência estaremos perdidos.
Carlos Fiolhais
Responsável pela
área do Conhecimento na Fundação Francisco Manuel dos Santos
1 comentário:
A cultura cientifica está muito pouco presente na nossa sociedade, seja a nível empresarial seja ao nível do cidadão, por isso somos tão mas tão pequeninos.
Não se lê, não se estuda ao longo da vida, não se discute a res pública, não se debate, não se exige seriedade e rigor.. tudo ausências que nos trouxeram até ao estado a que isto chegou..
Felizmente ainda vai havendo entidades que se preocupam com estes assuntos
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