quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Ciência e Inovação em Portugal

Meu artigo saído hoje no jornal I:


A ciência é, hoje em dia, indissociável da inovação, isto é, da transformação da sociedade. Ela tem impacto nas nossas vidas através de descobertas e invenções que ficam à disposição de todos. Na nossa civilização global, a ciência está por todo o lado: na saúde (a longevidade hoje é maior graças a avanços científicos), nas comunicações, nos transportes, na energia, etc. O impacto da ciência nas nossas vidas está, porém, longe de se restringir a aspectos materiais: a ciência é, primeiro que tudo, saber e, portanto, cultura.

Em Portugal, que beneficia da ciência que é feita por todo o mundo, também se faz ciência e inovação. Mas o esforço nesse sentido numa escala razoável é recente. Só desde há vinte ou trinta anos é que cresceu substancialmente o número de investigadores e o número de artigos científicos e protótipos tecnológicos. E só desde então cresceu a cultura científica, sem a qual a ciência dificilmente pode existir. A entrada da ciência nas empresas é ainda mais recente, apesar de haver alguns bons exemplos anteriores. Foi o estabelecimento de políticas públicas favoráveis à ciência e tecnologia que permitiu colocar Portugal no mapa da ciência. O nosso país subiu extraordinariamente nos rankings da ciência e tecnologia, tendo abandonado a cauda da Europa. Hoje, olhando para uma série de parâmetros, não estamos ainda na média europeia, mas estamos bem mais perto do que estávamos quando entrámos na União Europeia. De facto, foi a ajuda europeia que possibilitou essa escalada. Mas houve também a visão política de mobilizar uma parte ainda que diminuta dos financiamentos europeus em favor da ciência.

Estamos, sem dúvida, melhor do que estávamos. Mas devemos ter a ambição de querer mais, quer dizer, de atingir e até ultrapassar a média europeia. Impõe-se, por isso, uma reflexão sobre o estado da nossa Ciência e Inovação, assim como uma tentativa de prospectiva. Questões actuais são a avaliação do sistema científico-tecnológico, a ligação da ciência ao ensino superior, a ligação da ciência à economia (ligada de perto à questão do emprego científico) e a cultura científica. Subsistem problemas em todos essas vertentes: a recente avaliação da FCT está longe de ser perfeita, o ensino superior precisa de renovação, as empresas nacionais não albergam suficiente ciência (até porque empregam poucos cientistas) e a cultura científica deixa entre nós a desejar.

A Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) tem por missão estudar Portugal, em particular a sua evolução recente com base em indicadores, como os que estão reunidos na PORDATA. A FFMS vai em breve anunciar o do estudo Ciência e Tecnologia em Portugal, 1995-2011: métricas e impactos, que mostra comparações internacionais em complemento de A Ciência em Portugal, um dos ensaios da Fundação. Aprofundando o debate em torno da ciência, a FFMS continuará em 2015 o seu ciclo de Conferências  de Ciência na sequência das que organizou na Universidade do Porto em 2013 e na Universidade de Lisboa em 2014, respectivamente com o Prémio Príncipe de Astúrias Pedro Echenique e o Presidente da Royal Society Paul Nurse. Interessa também à FFMS analisar a transferência de conhecimento científico para as empresas, para o que apoiará projectos nessa linha. Como entra a inovação nas empresas? Empresas inovadoras são, de facto, empresas mais bem sucedidas do ponto de vista económico? Como é a dinâmica, em casos exemplares, entre ciência e cconomia? Sendo também pertinente estudar a cultura científica da população, está já em curso um mini-estudo sobre esse tema: Que níveis de cultura científica existem em Portugal em comparação com outros países? Onde obtêm os cidadãos informação sobre assuntos científicos?  Por último, a FFMS gostaria de congregar numa plataforma os cientistas portugueses espalhados pelo mundo e de os convidar ao debate sobre o futuro da ciência e do país. Não é só a ciência que nos salva, mas sem o apoio constante da ciência estaremos perdidos.

Carlos Fiolhais

 Responsável pela área do Conhecimento na Fundação Francisco Manuel dos Santos

1 comentário:

Anónimo disse...

A cultura cientifica está muito pouco presente na nossa sociedade, seja a nível empresarial seja ao nível do cidadão, por isso somos tão mas tão pequeninos.
Não se lê, não se estuda ao longo da vida, não se discute a res pública, não se debate, não se exige seriedade e rigor.. tudo ausências que nos trouxeram até ao estado a que isto chegou..

Felizmente ainda vai havendo entidades que se preocupam com estes assuntos

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