Vi em parte a audição e julgo que Carlos Moedas será aprovado pelo Parlamento Europeu como Comissário para a Investigação, Ciência e Inovação (um nome algo estranho, não sei por que é que se acrescenta Ciência a Investigação). A sua fluência linguística em quatro línguas da União Europeia ajudou-o. Assim como a apresentação do seu percurso de vida e o seu declarado entusiasmo pela ideia de Europa. Um dos pontos fortes do seu discurso foi, de facto, a sua adesão ao projecto europeu.
O comissário designado tinha pontos fracos e tentou habilidosamente, como fazem os políticos, contorná-los. Em primeiro lugar a sua relação íntima com a troika: ficámos a saber que afinal havia algumas quezílias, decerto quezílias domésticas. Depois o actual desinvestimento da ciência em Portugal, do que ele é, afinal, co-responsável. Ao responder ao deputado João Ferreira que não interessava que pagássemos mais para a ciência na Europa do que recebemos dela, estava a dizer que o dinheiro não era tudo, que havia outros lucros imateriais, o que é verdade, mas esvazia alguns argumentos ocos do governo a que pertenceu (alguns governantes criticaram a falta de capacidade da ciência portuguesa. Achei interessante um financeiro vir dizer que o dinheiro não era tudo. Pois... Assim como achei interessante a defesa que fez das ciências sociais e humanidades quando a Europa as está a cortar e Portugal ainda mais.
Ninguém esperava de Moedas grandes rasgos. Ele deu a ideia de um funcionário europeu empenhado, que vai tentar criar uma imagem de dedicação e competência. Um aluno marrão, portanto. Não sabe muito de ciência e inovação, mas estou convencido que quer aprender para tornar o sector mais relevante (para mostrar que tinha lido alguma coisa sobre ciência até citou o Nobel da Física Andre Geim, co-descobridor do grafeno). A actual situação portuguesa na ciência é para ele uma "pedra no sapato": saberá Moedas que o maior colaborador português do Nobel do grafeno, Nuno Peres, foi chumbado pela FCT?
Carlos Moedas tem por um lado a seu favor e por outro lado contra si a circunstância de o programa Horizonte 2020 já estar formatado. Dificilmente poderá ir além desse quadro, como ele próprio reconheceu nas respostas por escrito. Não há lugar para coisas novas, nem a burocracia de Bruxelas se presta a golpes de rins. Basicamente o que Moedas quer é aplicá-lo tecnicamente nos prazos acordados. "Implementing, implementing, implementing", afirmou ele. Quer aquilo que chama "resultados" desse programa. Mas só resultados não chegam. O que ele devia querer era "bons resultados", isto é, a prova na prática de que a ciência e a inovação são o caminho para o desenvolvimento europeu. Moedas, que nestas funções terá de ser mais um político do que um técnico, não pode esquecer que, na política de ciência como na política em geral, há sempre uma margem de manobra. Pode-se ir mais por um lado ou mais por outro. Há escolhas a fazer. Há problemas para resolver e, para usar uma expressão inglesa, the devil is in the details. E Moedas vai ter de mexer nos pormenores, que é como quem diz poderá ter de dar a mão ao diabo. E nisso de dar a mão ao diabo ele já tem alguma experiência.
terça-feira, 30 de setembro de 2014
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1 comentário:
Oh,iria ser despromovido e voltava ao Governo de cá?
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