O poeta não esconde a sua
passagem pelo manicómio, esse «Reino do Silêncio, do Não-Mundo», esse reino em
que o homem é «réu»; não esconde o seu coração e a visão fugaz da amada: «E a
amar sem amor eu me dedico»; não esconde as consequências da dor de amar: «e
para todo o sempre fiquei triste» e «Ó morte vem depressa tardas tanto»; não
esconde o ódio ao Estado Novo e ao país abúlico: «Piolhoso país em que nasci!»
e «Arre, ladrões, bandidos, salafrários!»; não esconde a sua afeição à
monarquia, nem a sua alma inquieta: «Jamais a paz./ Sempre agulhas na vista./
Aqui jaz/ Um artista.».
Apocalipse de São
Tomás:
Topázio:
– Pedra da cor de luz das tardes mansas,
Fig 1: Espectro de
emissão e espectro de absorção do sódio
Desagregou-se o núcleo dum cometa,
esfacelou-se em cores, abriu o leque vário
dos ardentes metais e arroja lá do ossário
dos astros findos radiações em seta.
Desagrega-se em dor e arde um núcleo de alma,
expande-se em perfumes coloridos.
O sonho em lume torce-se em gemidos,
em leque de pavão se irradia e espalma.
O sódio do cometa arde amarelo,
duas riscas de luz, frechas desesperadas,
que silvam a gritar no branco das ossadas
como vergões de sádico flagelo.
Na alma perdida, o amor perdido chora,
o amor que quer amar e bate em negro muro.
Embalde pede luz o frio amor escuro
que vê de crepes o luzir da aurora.
Topázio:
– Pedra da cor de luz das tardes mansas,
da moribunda lividez do Outono,
que à lividez ajuntas do abandono
Tons de âmbar e de mel de flavas tranças
ora me dás a sugestão das esperanças
em nimbos de oiro que ardem no meu sono,
ora cingindo em teu cruel quimono
bailo do tédio as amarelas danças.
Na transparência do teu brilho lendo,
o teu segredo abafa-me em revolta:
quanto mais claro, menos o entendo.
Os meus anseios de Infinito, abrase-os
o fogo de rubis, não lhes dá solta
a bandeira de peste dos topázios.
1 comentário:
É de palavras que me chamo...
Enviar um comentário