quarta-feira, 20 de agosto de 2014

"Não tem horário para o ano letivo 2014/2015..."

Sem comentários (porque não são precisos), reproduzo, parcialmente, um texto que um professor de Filosofia publicou por estes dias de Agosto (aqui).
"Fui hoje informado que no próximo ano letivo terei horário zero. Terei, portanto, que concorrer. Pelo que ouvi dizer, numa escola secundária de Faro há dois horários – sem filosofia, apenas com disciplinas dos cursos profissionais e outros similares. Vivo em Faro, mas se numa das cidades próximas existisse um horário com filosofia tentaria ir para lá. Infelizmente parece que não há.
Sou professor há vinte e dois anos. Dez deles, sendo os últimos nove consecutivos, na Escola Secundária de Pinheiro e Rosa. Tive Muito Bom numa avaliação e Excelente na outra. Nos anos que levei alunos a exame a média destes foi sempre superior à média nacional e melhor que a maioria das outras disciplinas da escola (...)
Descobri que a possibilidade de ter horário zero era elevada há semanas atrás, mas tinha ainda uma esperança remota e irrealista, para não dizer estúpida, de que isso não sucedesse. Quando há minutos li a frase “não tem horário para o ano letivo 2014/2015, pelo que tem de concorrer ao Destacamento por Ausência da Componente Letiva” lembrei-me do final do romance O Processo de Franz Kafka quando K., mortalmente apunhalado no coração, murmura “Como um cão!”. E senti-me apunhalado no coração. Mas não mortalmente. Mas não mortalmente." 
Carlos Pires

5 comentários:

Ildefonso Dias disse...

... então que sentido existiu ou existe nessa coisa absurda que é a luta eduquês/anti-eduquês... que sentido ou importância terá isso agora para o Professor Carlos Pires (acérrimo anti-eduquês) ou outros professores, todos eles, que estarão agora sujeitos, na melhor das hipóteses, a leccionar uma disciplina fora da sua área especifica, a alternativa é bem pior...

Que absurdo é perguntar, Quem ganhou, Quem perdeu?! Faz ou fez sentido essa luta entre colegas de profissão? Ou tudo não passou de um "dividir para poder reinar"?

Manuela Prata disse...

O ministro quer lá saber se ele bom, muito bom ou mau. Ele quer é poupar uns tostões.

Carlos Pires disse...

Obrigado pela referência Helena Damião.

Anónimo disse...

Concordo mas aconselhava esta leitura

http://correntes.blogs.sapo.pt/kafka-contra-kafka-usar-a-avaliacao-de-2060619

Júlia Damião.

Carlos Pires disse...

Fui ver o post que a Júlia Damião indicou. E quero comentar de modo breve a seguinte frase: “é incompreensível que alguém use as menções de muito bom e excelente nos últimos processos, inaplicáveis e brutalmente injustos, de avaliação do desempenho para justificar a não atribuição de horário zero.”
É verdade que o sistema de avaliação de professores que temos em Portugal não garante a justeza das avaliações: entre outros defeitos, é permeável ao amiguismo e a existência de quotas (nomeadamente quotas tão reduzidas) impede muitos professores de terem as classificações que merecem. Mas isso não significa que todas as classificações sejam injustas. Julgo que as minhas foram justas e há vários factos objetivos que comprovam isso, tendo eu referido alguns deles no texto.
Nesse texto quis ser apenas descritivo e não me pus com grandes explicações nem argumentações. Fiz uma lista de factos que, por significativos que sejam, não impedem um professor – nomeadamente eu – de ter horário zero.
Termino dizendo que é estranho os últimos governos terem investido tanto na avaliação dos professores, tendo obrigado estes a submeterem-se aos seus trabalhosos e burocráticos procedimentos, e depois os resultados da avaliação não servirem para nada: não contribuem para a progressão na carreira (já que estamos congelados), não nos fazem ganhar mais, não podem ser invocados nos concursos nem na determinação de quem tem e não tem horário zero. Para que serve, afinal, a avaliação dos professores?
Embora este não seja o melhor contexto para falar nisso, avanço com uma hipótese: serve para obrigar os professores a trabalhar bem mesmo sem ter condições de trabalho, ou seja, para obrigar os professores a sacrificarem-se de modo a que, apesar de as condições de trabalho terem diminuído, a qualidade do seu desempenho se mantenha.

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