Meu artigo no último JL:
O professor de Sociologia David Justino, que muitos conhecem devido à sua actividade
política (foi deputado, ministro da Educação em 2002-2004, vice-presidente do
PSD com Rui Rio), deu a sua «última lição», sobre «A Nova Era da Incerteza», na
Reitoria da Universidade Nova de Lisboa no passado dia 24 de Janeiro. Saiu
também nessa altura um livro, que é uma reflexão alargada sobre os temas
académicos que o têm ocupado ao longo de décadas: Ensaios sobre o Dia Seguinte
(Edições 70). O subtítulo O Mundo, Portugal e a Educação reflecte as três
partes em que a obra se divide: «O mundo incerto», «Portugal confinado» e
«Educação sem utopia». É um volume indispensável para quem pretenda conhecer melhor
os estados do mundo e do país.
Na primeira parte, a maior de todas, o autor discorre sobre grandes temas
da actualidade mundial: o abrandamento da globalização, a incerteza que é a única
coisa que por estes dias damos como certa, a «nova era dos extremos»
(radicalismos, fundamentalismos, nacionalismos, etc., os opostos das posições
moderadas de um social-democrata), o contínuo progresso das tecnologia e da inovação,
a sociedade da informação e do conhecimento, os Estados e as democracias
(liberais e iliberais) e a
emergência de paises asiáticos como
a China e a Índia. É um texto bem pensado e escrito, que nalguns pontos solicita
o debate, como a tentativa de olhar o mundo pelas teorias dos ciclos económicos
de Kondratieff e Braudel (segundo elas, estaríamos no fim de um ciclo).
Para mim, o capítulo mais interessante é o segundo, em que Portugal é visto,
numa perspectiva de longa duração, por um historiador económico experiente (Justino
doutorou-se em economia e sociologia históricas na Universidade Nova em 1987 com
a tese, orientada por Vitorino Magalhães Godinho, Formação do Espaço Económico
Nacional 1810-1914, que recebeu o prémio Gulbenkian de Ciência em 1987 e
foi publicada pela Vega em 1988). O autor cita alguns académicos que tentaram explicar
o atraso da sociedade portuguesa, por exemplo o sociólogo Adérito Sedas Nunes,
que lhe chamou uma «sociedade dualista em evolução», para referir o contraste
entre tradicionalismo e modernidade. Mas o dualismo em Portugal é também
espacial, com a oposição entre litoral e interior, e também económico e social,
com a desigualdade entre ricos (poucos) e pobres (muitos). Justino refere a chegada
tardia da Revolução Industrial no século XIX, o que causou um desenvolvimento bem
menor do que o dos países que então se industrializaram. E fala da dependência
económica do estrangeiro, que hoje subsiste. A situação de periferia na Europa
é naturalmente abordada.
O autor analisa os constrangimentos portuguesas, a começar pelo «definhar demográfico»:
a demografia é um dos mais graves problemas nacionais, uma vez que a imigração está
longe de compensar a queda de natalidade e a emigração, designadamente de
jovens qualificados seduzidos por maiores salários. Seremos, neste canto da
Europa, cada vez menos e cada vez mais velhos. À assimetria entre o literal e interior
junta-se a assimetria causada pela polarização da população nas áreas
metropolitanas de Lisboa e Porto. Retratando o crescimento económico através do
PIB per capita ao longo de séculos, o gráfico da p. 250 mostra que o
crescimento em Portugal foi anémico no século XIX (com um mínimo histórico nas vésperas
da Revolução Liberal), que a Primeira República foi um tempo de estagnação
económica e que só no Estado Novo se assistiu a continuado crescimento económico
(com o alto preço da falta de liberdade), um crescimento que, embora com soluços,
continuou após 1974, com a ajuda da Europa, até ao ano 2000. Porém. os últimos vinte
anos têm sido de estagnação. No gráfico da p. 251, que compara os PIB per
capita português e espanhol, podemos ver como, no século XVIII, estávamos
muito acima, passando nos séculos XIX e XX a estar abaixo. E o gráfico da p.
260 mostra como Portugal, Espanha e outros países do Sul não conseguem competir
no crescimento económico com os países europeus do Centro, do Norte e do Leste.
David Justino fala, para resumir, de um «labirinto» de que não conseguimos
sair. Comenta, não apenas como um académico, mas também como um politico desiludido:
«Melhor seria que se colocasse a questão: onde e quando pretendemos chegar?
O que precisamos de mobilizar e porfiar por o conseguir? O que é necessário
mudar para que tudo não fique na mesma? Mas este exercício está afastado dos
membros mais proeminentes das elites políticas e intelectuais. Tudo se esgota no
efémero, no imediato, no mediatizado, e tudo o que for além disso é tarefa inglória
que se pode sujeitar ao ridículo.» Diz, para fechar o capítulo sobre Portugal,
que não se enxerga «uma saída, um rumo e um propósito».
Na terceira parte, Justino passa em revista as questões, internacionais e nacionais,
da educação, que tem estudado em profundidade. Para além do défice económico,
Portugal tem um grande défice educacional. A questão impõe-se: Será a aposta na
educação o elixir de uma vida colectiva mais próspera? Será que o investimento
na educação conduz necessariamente ao desenvolvimento? Há alguma controvérsia
entre os economistas. Mas o curioso é que estes querem mandar na educação. Afirma
Justino com sagacidade: «O que se observa é a tendência para que as políticas
nacionais se orientem por directivas transnacionais, especialmente as propostas
e recomendadas pelas organizações internacionais, como é o caso da OCDE, do
Banco Mundial ou da UNESCO. A sua acção, ao contrário das autoridades
nacionais, não tem poder coercivo para impor uma determinada concepção
curricular, mas detém o poder de indução para condicionar e orientar as políticas
nacionais». Justino é inequívoco: ele valoriza o conhecimento em vez das competências
apregoadas pela OCDE e outros. A fechar o livro, Justino apresenta uma proposta de organização de sistema educativo,
que essencialmente visa melhorar a articulação entre os ensinos básico e o secundário,
e sugere uma instância independente do governo para tratar as questões
curriculares.
O tom geral é de algum pessimismo. O autor não está a ver saídas para as
crises do mundo e de Portugal. Mas, como vivemos na «era da incerteza», pode
ser que haja surpresas positivas. Não sabemos quais nem quando.
14 comentários:
Muitos estadistas portugueses, com altas responsabilidades no campo da educação, enchem a boca com o aumento astronómico do número de licenciados e doutores que se tem verificado nestas últimas décadas. Bem, bem, vamos lá ver!...
É o nosso povo que diz " Nem tudo o que luz é oiro". Há que revelar, com toda a frontalidade, que os indutores principais das pedagogias sem nexo - como são avaliar, por escrito, em cada cinquenta minutos de aula, as aprendizagens essenciais e um ror de competências, incluindo as emocionais, de cada um dos cerca de trinta alunos, por sala -, são pessoas doutoradas em ciências da educação que, mesmo à vista desarmada, dá para ver que são mais do que as mães, em Portugal. Pelo menos, nesta área das escolas EB 1,2,3 + S + JI, Portugal cedeu perante o absurdo. Os cientistas da educação dizem que nas escolas os professores só podem ensinar o mínimo dos mínimos de conhecimentos, pois assim os alunos desenvolverão à vontade as competências naturais de todo o ser humano. O sucesso escolar é praticamente obrigatório para todos, principalmente para os mais pobres, o que nos vai garantir, a curto ou médio prazo, uma economia pujante. Nestas medidas avulsas que o ministério tem proposto aos sindicatos, destaca-se um discriminação positiva dos professores e educadores de infância, porque, dizem as autoridades, eles são da monodocência! Então, porque não beneficiar também professores do secundário, porque eles ensinam física ou matemática, por exemplo?!
A carreira única dos professores dos ensinos básico e secundário e dos educadores de infância é um absurdo. Para profissões diferentes, carreiras profissionais diferentes!
Somos todos docentes, a lecionar crianças/jovens em diferentes níveis etários. Não percebo por que razão um professor do 12.º ano será mais importante do que um professor do 1.º CEB. Explique-me, por favor.
Poderá informar-se sobre educadores de infância em:
https://www.dge.mec.pt/perguntas-frequentes-faq
O argumento da importância, apresentado por V. Ex.a., é falacioso. Evidentemente, somos todos importantes, desde o artista de circo até ao professor do 1.º ciclo do ensino básico, passando pelos lixeiros das câmaras municipais, mas, tal como na natureza, um gato é um gato e um cão é um cão, também a profissão de limpa-chaminés é DIFERENTE da profissão de pastor de rebanhos de gado ovino ou caprino, portanto os referidos profissionais devem singrar em carreiras profissionais
DIFERENTES.
As matérias que um docente leciona no ensino secundário têm normalmente um grau de complexidade científica superior às matérias lecionadas no 1.º ciclo do ensino básico, o que acarreta aplicação de metodologias e didáticas muito diferentes nos dois níveis de ensino: ensinar trigonometria é muito diferente de contar a história da carochinha!... Os horários e a restante organização do trabalho, mesmo que a lei diga que são iguais para os dois ciclos de ensino, a realidade, em contexto de sala de aula, aí está para provar que só podem ser diferentes, senão entramos no delírio que se vive atualmente nas nossas escolas EB 1, 2 ,3 +S+JI. V. Ex.a deve ser muito nova. Saiba que antes da nossa revolução dos cravos ter decretado que os professores são todos iguais entre si, e iguais aos educadores de infância, também, na primeira metade do século XX, os russos obrigaram os lituanos, os estónios e os ucranianos, entre muitos outros, a serem todos iguais, e agora estamos a ver no que essa boa intenção deu!
Também lhe peço, por favor, que me responda.
Sim, DIFERENTES. Elucido: façamos emergir uma das 12 disciplinas que os docentes do 1.º Ciclo trabalham com os alunos - Português. Quando conto a história da Carochinha, essa narrativa de tradicional gozo e brincadeira, estou a ativar uma série de funcionalidades, conscientes e inconscientes, suportadas por redes neurais, reforçando sinapses que gravam competências linguísticas, entre outras, nos circuitos cerebrais, tais como: saber escutar, compreender, interpretar, criar realidades, experienciar o mundo, ativar a imaginação, promover opiniões, vaguear pelo sonho, tocar no livro, cheirar o papel, perceber a luz da sala, emocionar-se com os outros, ter sensações de prazer ao ouvir ler...
Graças a nós, uns grandes artistas de circo, simples e desprovidos de dificuldade, é que as criancinhas desenvolvem plataformas cerebrais onde vocês, os doutos da complexidade científica, se poderão dar ao luxo de inscrever o superior conhecimento.
Isto para não falar de complexas metodologias e didáticas aplicadas no âmbito da interiorização dos mecanismos de leitura e de escrita e do desenvolvimento do raciocínio matemático, nas criancinhas de 6 anos, uma a uma (impregnadas de um agitado espírito brincalhão) que nada tem a ver com a bibliografia que os doutos do complexo, enviam para casa para os jovens pesquisarem. Trigonometria, uma ova!
... que os doutos do complexo enviam para casa...
Sem vírgula.
Responda, por favor.
Em Portugal, ainda na véspera do dia 25 de abril de 1974, as escolas primárias eram uma selvajaria!
Porém os arautos do regime, estribados na doutrina da Santa Igreja Católica, tinham conseguido fazer passar para o povo pequeno-burguês que uma 4.ª classe bem feita abria as portas para um futuro cheio de prosperidade. Então, apesar das sevícias cometidas pelos professores primários sobre pobres crianças inocentes, como aquelas a que eu assisti, aterrorizado, em contexto de sala de aula, a sociedade revolucionária bem politizada, por Salazar e Caetano, premiou os ditos professores com a equiparação a professores do liceu, ou, por outras palavras, elevou-os a doutores. Diga-se, de passagem que muitos deles são hoje cientistas da educação, graças aos doutoramentos que fizeram em universidades públicas e privadas, onde aprenderam que “as sinapses gravam competências nos circuitos cerebrais”, tais como tocar num livro e cheirar a tinta e o papel, de onde se deduz que o á-é-i-ó-u é matéria tão, ou mais, complexa do que a trigonometria.
Ó minha senhora, as criancinhas de 6 anos vão à escola porque as obrigam! A grande maioria preferia a liberdade das brincadeiras. Se entrassem na escola aos 10 anos, seria mais do que suficiente. Nesta escola do faz de conta que se ensina, em grande medida arquitetada pelos cientistas da educação, 12 anos de escolaridade obrigatória é uma barbaridade!
Eu sou da velha escola: antes de avaliar, é preciso ensinar. V.Ex.a dá-me ideia que prefere avaliar o que não se ensinou.
Voltando à vaca fria, o trabalho dos professores do ensino secundário é diferente do trabalho dos professores universitários, dos professores do 1.º ciclo do ensino básico (antigos professores primários) e dos educadores de infância, logo a carreira única dos professores dos ensinos básico e secundário e dos educadores de infância tem de acabar, o mais depressa possível!
No Portugal dos anos cinquenta, sessenta e setenta, do século XX, a Igreja Católica não é a única instituição a quem devem ser assacadas culpas no âmbito de sevícias físicas e psicológicas cometidas sobre menores. Não foi só a padralhada que molestou gravemente as criancinhas. Eu assisti, em contexto de sala de aula, numa Escola Primária do Estado Português, a atos cruéis de tortura física e psicológica cometidos por uma professora primária sobre crianças indefesas que, sem dúvida, ficaram traumatizadas para toda a vida.
Apelo aos altos representantes da Justiça em Portugal, que eventualmente leiam este meu libelo acusatório, que criem uma comissão que investigue todas as sevícias que feriram gravemente alunos menores sujeitos às reguadas infrenes desferidas pelos seus professores primários, abrangendo os crimes daqueles que ainda estão no ativo, dos que já se reformaram e dos que já morreram.
Aconselho-o vivamente a atualizar-se, embora se note que fez uma razoável 4.ª classe. Hoje em dia, os professores primários têm licenciaturas, mestrados e doutoramentos. Escolheram lecionar nesse nível de ensino por gosto. Alguns têm mais formação do que os professores do secundário. E sinto, seguramente, que mereço o mesmo vencimento que o colega de carteira que fala latim, dá geometria descritiva, disseca “Os Maias” e sabe o que são trilobites.
Voltando ao velho vácuo frio de visão simplista e reducionista... Complexo vem do latim “complexus” que significa “Aquilo que é tecido em conjunto”, dizia Edgar Morin. Tente pensar maior, sem apequenar o que é DIFERENTE. Confluímos todos para “aquilo”, para uma determinada configuração educativa, social, cultural, o que quer que seja, claro que discutível, mas configuramos em conjunto. Todos somos docentes a trabalhar o barro e no princípio, como sabe, primariamente, estava o Criador, compreende? O primeiro, a trave mestra, a pedra angular, a fundação. O professor primário! O que deveria ser muito bem remunerado porque está na base da pirâmide, na palha, no sangue e no suor, de sol a sol. É o único com 25 horas letivas até aos 66 anos e 4 meses.
Se teve traumas de infância com o seu professor primário é porque o senhor era mau e foi merecido!
Não me toca. Podem investigar. Prendam-nos!
Prendam os pais que entram pelas salas de aula a malhar nos professores por dá cá aquela palha e os meninos que mandam os professores para a Sibéria ou regiões mais abaixo porque sim...
Prendam os políticos que legislam como se não houvesse amanhã para que não haja educação!
Prendam os juízes que deixam escapar pedófilos, homicidas e bestas que batem em mulheres!
Prendam os incendiários que pirilampam pelos pinhais sem guarda e nos asfixiam em cada morte verde!
Prendam os que inventaram o nuclear e os que o utilizam em testes sem qualquer respeito pelo Natural que todos somos!
Prendam os negligentes que matam, esfolam, violam e saem impunes da prisão macia onde conseguem ver a namorada, tirar um curso superior e voltar à rua para fazer o mesmo!
Prendam as réguas, os compassos, os esquadros e todas as figuras geométricas irregulares!
Prendam os que prendem porque prendem!
Prendam porque sim e porque não!
Morra o Dantas!
Pense planetariamente e subtraia o seu nariz do mofo.
Pim!
Porém, trabalhadores intelectuais que realizam trabalhos diferentes deviam ter direito a carreiras profissionais diferentes. a começar pela diferente organização dos horários de trabalho, como acontece no resto do mundo civilizado!
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