sábado, 4 de março de 2023

Contestações a mais ou soluções a menos?

Por Cátia Delgado

As sucessivas greves dos professores têm abarcado diversas fações, enleados que estão estes profissionais em diversas reivindicações, sobressaindo, sobretudo, a recuperação do tempo de serviço que lhes é devido e o aumento dos salários para fazer face ao aumento do custo de vida.

Pese embora as questões (legítimas) que estão em cima da mesa, gostaria de elencar duas, por vezes esquecidas, e que me parecem primordiais para alcançar uma Escola Pública de qualidade

A primeira prende-se com a sucessiva acumulação de funções da escola (e consequentemente dos professores) que, à partida, não lhe pertenciam, mas que, por comodismo e falta de competência das instituições estatais, para ela transitaram, como sejam a resposta às carências sociais de famílias desfavorecidas, dependendo, por exemplo, das refeições ali oferecidas, a guarda de crianças, antes e após o horário letivo, porque não existe uma política social que apoie os pais de crianças e jovens, para que os possam acompanhar devidamente, deixando também essa função para os agentes escolares. Ou seja, assistimos à transformação da escola num departamento da “segurança social”.

A segunda, resultante da primeira, tem que ver com a distorção do papel dos professores, à partida, intelectuais. Com o objetivo último de ensinar, esperar-se-ia que estes profissionais pudessem, com as devidas condições temporais e mentais, dedicar-se à planificação da sua ação, tendo em vista uma verdadeira e profunda transformação dos seus alunos, não que se limitassem a assegurar que demonstrem competências para replicar no dia a dia e, mais tarde, no mercado de trabalho. Tal sucede devido ao excesso de funções que acumulam e os desviam do seu verdadeiro propósito, cingindo-se à réplica de orientações e normas definidas por agentes externos à escola e, por isso, desprovidos do conhecimento da realidade. 

Estes professores “técnicos” contribuirão para gerações culturalmente iletradas, que pouco contribuirão para a evolução do país (e do mundo). Mas, talvez seja esse o objetivo, já que, tendencialmente, interessa que Portugal seja um bom “servidor da Europa”, como podemos ouvir na entrevista que António Carlos Cortez e Elsa Estrela deram à SIC Notícias e que vale a pena ver, ouvir e refletir.

2 comentários:

Anónimo disse...

Pensador fora da caixa

Hermenegildo disse...

O professor é um intelectual que, nos tempos da monarquia constitucional, da I República e da ditadura fascista de Salazar e Caetano, tinha direito, pelo menos, ao título honorífico de doutor com d pequeno. O maior problema dos professores é, atualmente, a opressão que sentem sempre que tentam ensinar os seus alunos. Sem liberdade, nem autonomia técnica e pedagógica, os professores veem-se transformados nuns paus mandados, às ordens do ministério, dos encarregados de educação e dos alunos, a quem interessa, sobretudo, que as escolas sejam instituições de segurança social que, no fim da linha passem diplomas com classificações escolares muito elevadas e livres de qualquer tipo de exames. No fundo, o que se quer, a seguir à demissão do Estado, no seu papel de garante de uma escola Pública de qualidade, é que os professores se demitam de ensinar!
Enquanto o ministério não voltar a trilhar o caminho da racionalidade, longe de ideias abstrusas de alguns especialistas da educação, não haverá solução!

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