A Inteligência Artificial (IA) é um dos temas candentes
da actualidade não só pelo impacto que começou a ter nas nossas vidas, mas
sobretudo pelo previsível aumento desse impacto num futuro próximo. De facto,
algoritmos de inteligência artificial já fazem parte das nossas vidas: eles
estão presentes quando um livro nos é sugerido pela Amazon, ou um filme no Netflix,
ou um conjunto de músicas no Spotify.
Fico muitas vezes surpreendido com as escolhas que esses algoritmos fazem por
mim, parecendo em muitos casos conhecer-me melhor do que eu próprio. Algoritmos
que também actuam num smartphone,
quando nos servimos de um assistente virtual como a Siri da Apple, assim como
no Facebook, quando nos propõem
“amigos” ou montam filmes com as nossas imagens. São também algoritmos desse
tipo que ajudam a obter respostas individualmente optimizadas nas pesquisas que
fazemos no Google ou que realizam
traduções automáticas cada vez mais sofisticadas, como é o caso do Google Translator.
Num futuro próximo a inteligência artificial permitirá
a multiplicação de robôs, como a Sophia,
que são capazes de conversar connosco, assim como o atendimento com voz humana
por sistemas de reserva em restaurantes ou salas de espectáculos. A escrita automática
de algumas peças jornalísticas, o uso de veículos sem condutor (dos quais já
existem protótipos) e a tomada de decisões importantes para a nossa saúde são
outros exemplos de aplicações de IA na nossa vida. No campo da medicina, o.supercomputador
Watson da IBM, um sistema que responde
a perguntas em linguagem natural, está já a ser usado para procurar soluções
para alguns tipos de cancro. E é inteiramente possível que sistemas de IA venham
a adquirir a competência de médicos radiologistas, treinados para interpretarem
imagens de raios X ou de RMN, e, mais do que isso, consigam analisar
rapidamente terabytes de informação
contida em arquivos clínicos para proporcionar novo conhecimento. Esses
sistemas também podem pesquisar na enorme e crescente literatura biomédica e
descobrir associações entre alterações genéticas e certas doenças de modo a
obter informações úteis para diagnóstico ou tratamento.
Mas
o que vem a ser a IA? É um ramo da ciência e tecnologia que visa criar sistemas
com comportamentos inteligentes. E o que é a inteligência? Por inteligência
entendemos as capacidades de interagir com o mundo, de modelar o mundo, de
raciocinar, de aprender e adaptar-se, tudo coisas que nós, Homo Sapiens, somos capazes. O nome AI remonta a 1956, quando investigadores
de diferentes campos da ciência e da tecnologia se reuniram num workshop no Darmouth College, em New
Hampshire, Estados Unidos, para discutir redes neuronais, um tipo específico de
software baseado em analogias com o
nosso cérebro, e tentar entender a inteligência. Um marco notável nesta área
foi estabelecido em 1997, quando o computador Deep Blue da IBM derrotou o campeão mundial de xadrez, o russo
Garry Kasparov. Novas aplicações de IA surgiram nos anos vindouros e,
alavancadas pelos extraordinários progressos nos processadores, nas memórias e
nas redes de computadores. Dada a rapidez dos desenvolvimentos actuais, alguns
futuristas imaginam, talvez indo longe demais, que em 30 ou 40 anos, num ponto a
que eles chamam "singularidade", as máquinas possam substituir a
humanidade. Falam de um “futuro pós-humano.” Nomes como o astrofísico Stephen
Hawking, o empresário Ellon Musk, o linguista Noam Chomsky e o co-fundador
da Apple Steve Wozniak, alertaram,
numa carta aberta divulgada em 2015 pelo Future of Life Institute, para os perigos que os avanços na IA
poderão ter para a sobrevivência da humanidade.
O que têm de especial os programas de IA relativamente
a outros programas? Os programas de IA alimentam-se de dados, que são
tipicamente muito extensos (Big Data),
a fim de extrair padrões e, portanto, conhecimento relevante. Os algoritmos de
IA analisam grandes quantidades de dados para chegar a conclusões que um ser humano
jamais conseguiria alcançar sozinho ou com outros. A diferença entre um moderno
programa de IA e um programa convencional é que, no primeiro caso, o programa se
altera com a entrada de novos dados, pelo que não há uma separação nítida entre
dados e software. Falamos, neste
contexto, de “aprendizagem por máquinas” (machine
learning) e “aprendizagem profunda” (deep
learning), um ramo da última que tenta modelar abstracções.
Mesmo que as questões do “futuro pós-humano” pareçam
uma extrapolação delirante e que, por isso, essa ameaça apocalíptica não se
venha a colocar, o certo é que novas questões estão a surgir com o aparecimento
e uso de aplicações de IA. Estarão elas a substituir os seres humanos, levando à
redefinição ou mesmo à eliminação de muitos postos de trabalho humano? E quem deve
ser considerado o responsável quando as respostas são dadas automaticamente? Qual
deve ser o nosso grau de confiança nas respostas dadas pelas máquinas? Não
estão estas, tal como nós, sujeitas a erros? E, acima de tudo, como podemos
garantir que as máquinas estejam permanentemente alinhadas com os objectivos
humanos? Será que podemos codificar normas éticas nas máquinas (a este campo
muito recente da IA chama-se "ética artificial")? Devemos ter medo
das máquinas? E, baseados nesse medo, devemos tentar impedir alguns
desenvolvimentos no campo?
Estas perguntas não têm respostas fáceis pois, dizendo
respeito a todos, a sociedade enfrenta grandes dificuldades de compreensão dos
conceitos de IA. O público tem uma noção algo mítica sobre computadores e suas
formas antropomórficas que são os robôs. A ficção científica chegou primeiro
que a ciência e tecnologia ao imaginário colectivo e lá permanece. A comunicação
científica dirigida ao grande público enfrenta grandes desafios neste domínio,
pois não é fácil explicar o modo de funcionamento da IA, apesar de os seus
produtos estarem a invadir as nossas vidas.
A questão do futuro do trabalho é, compreensivelmente,
uma das mais cruciais para uma sociedade cuja organização e funcionamento assentam
no trabalho. De facto, a história da ciência e da tecnologia ajuda-nos a pensar
melhor na evolução do trabalho. Durante muito tempo o trabalho humano foi muito
duro, por estar baseado na força braçal (ajudada apenas pels força de alguns
animais domesticados e por algumas máquinas primitivas). Estava ligado à
exploração dos recursos que a terra permitia a fim de assegurar necessidades
básicas como a alimentação e o vestuário. A Revolução Industrial,
iniciada no Reino Unido no final do século XVIII com o desenvolvimento da
máquina a vapor, permitiu uma mudança radical desta situação ao aproveitar a
força motriz do vapor de água para libertar o homem e os animais dos trabalhos
mais pesados. Surgiram fábricas mecanizadas e a economia mundial conheceu um big bang, com o aumento drástico da
riqueza per capita. Uma nova onda da
Revolução Industrial surgiu já a meio do século XIX com a mudança das máquinas
a vapor para máquinas eléctricas, graças a avanços no ramo da física chamado electromagnetismo,
isto é, a junção da electricidade com o magnetismo: descobriu-se que a
electricidade fazia mover um íman e que o movimento de um íman perto de um fio
eléctrico permitia o aparecimento de corrente eléctrica (princípio do dínamo).
Foi o dínamo que permitiu a electrificação das cidades e dos campos, acendendo
a luz em todo o lado e alimentando as máquinas com energia eléctrica. No final
da Segunda Guerra Mundial, surgiu a chamada terceira vaga da Revolução
Industrial (há quem considere ter sido uma nova revolução) com a invenção do
transístor, que permitiu ao aparecimento de computadores muito mais pequenos do
que os anteriores. De então para cá, o avanço da electrónica tem sido crescente,
com o aparecimento dos primeiros computadores pessoais no início da década de
80 e da World Wide Web no início da década de 90.
Os processos de manufactura continuam a mudar. Hoje
fala-se muito em “Indústria 4.0” como uma quarta onda da Revolução Industrial,
que consistirá não apenas no uso dos robôs, as máquinas electrónicas que são hoje
comuns nas instalações fabris por serem ideais para a realização de tarefas
repetidas (basta olhar para os sistemas de montagem de automóveis como os da
Autoeuropa), mas, também, na sua combinação com uma série de tecnologias bem estabelecidas,
como as redes de comunicação rápida, ou em vias de se estabelecerem, como a
“Internet das Coisas” (uma rede ubíqua de sensores), a “computação em
nuvem” (cloud), isto é, o cálculo conjunto por vários computadores situados em
sítios diferentes da rede), a impressão 3D (que permite criar rapidamente certos
objectos à medida), a realidade virtual ou aumentada (que permite criar mundos
simulados que podem ser assaz realistas), a big data (a recolha de
grandes quantidades de informação), e a já referida IA. Embora o termo
“Indústria 4.0” não seja muito preciso, o conceito refere-se aos tipos de produção
inteligente que estão a surgir com a disponibilidade de computadores e de redes
computacionais cada vez mais evoluídas. Os especialistas pensam que os processos de produção irão funcionar através
de sistemas complexos de máquinas, instalações, produtos e logística, que
têm de ser continuamente optimizados. Os desafios são grandes e múltiplos. O
maior deles é: que papel ficará para os seres humanos, em particular quais
serão as consequências para os empregos, quais serão os perfis profissionais
previsíveis e quais serão as novas necessidades de formação?
É sempre difícil fazer previsões. O físico Albert Einstein, cuja família aproveitou no fim do século XIX as oportunidades da segunda onda da Revolução Industrial (os seus pais e tios trabalharam na electrificação da Baviera e do norte de Itália), afirmou um dia: “Nunca penso no futuro. Ele não tarda a chegar.” De facto, ele que foi um dos pioneiros da teoria quântica não anteviu as tremendas consequências que ela traria para a sociedade com o aparecimento dos transístores, que assentam na ocupação por electrões de níveis de energia previstos pela teoria quântica. Contrariando a afiimação de Einstein, devemos pensar no futuro. Parece claro, se olharmos para o passado, que vai haver mudanças substanciais no trabalho humano. O trabalho humano não desapareceu, mas foi ficando diferente, adaptando-se às novas circunstâncias. No século XIX o trabalho nas fábricas substituiu o trabalho agrícola. É um facto que a automação veio eliminar nos anos mais recentes numerosos postos de trabalho, tanto nas fábricas como nos serviços (por exemplo, já quase não há portageiros, substituídos por robôs, assim como há cada vez menos funcionários bancários substituídos pelos próprios clientes, que usam sistemas de homebanking). Mas também é verdade que algumas profissões têm crescido de modo notável, como, por exemplo, engenheiros electrotécnicos, programadores e analistas de dados. Tudo leva a crer que essa tendência vai continuar. Segundo um relatório do World Economic Forum, divulgado em 2018, nos próximos quatro anos a evolução das máquinas e algoritmos no mercado de trabalho terminará com 75 milhões de postos de trabalho, ao mesmo tempo que criará 133 milhões novos postos de trabalho: isto é, serão criados 58 milhões de postos de trabalho. Alguns empregos que hoje existem deixarão simplesmente de existir, mas ao mesmo tempo serão criados novos empregos, alguns deles completamente novos. Um relatório relativo a Portugal da responsabilidade da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), do McKinsey Global Institute e da Nova School of Business and Economics (Nova SBE), anunciado em 2019, a situação entre nós não é tão optimista, por ser grande o nosso potencial de automatização de postos de trabalho: portugal perderá até 2030 até 1,1 milhões de postos de trabalhos, apenas sendo criados nesse período entre 600 mil e 1,1 milhões.
É sempre difícil fazer previsões. O físico Albert Einstein, cuja família aproveitou no fim do século XIX as oportunidades da segunda onda da Revolução Industrial (os seus pais e tios trabalharam na electrificação da Baviera e do norte de Itália), afirmou um dia: “Nunca penso no futuro. Ele não tarda a chegar.” De facto, ele que foi um dos pioneiros da teoria quântica não anteviu as tremendas consequências que ela traria para a sociedade com o aparecimento dos transístores, que assentam na ocupação por electrões de níveis de energia previstos pela teoria quântica. Contrariando a afiimação de Einstein, devemos pensar no futuro. Parece claro, se olharmos para o passado, que vai haver mudanças substanciais no trabalho humano. O trabalho humano não desapareceu, mas foi ficando diferente, adaptando-se às novas circunstâncias. No século XIX o trabalho nas fábricas substituiu o trabalho agrícola. É um facto que a automação veio eliminar nos anos mais recentes numerosos postos de trabalho, tanto nas fábricas como nos serviços (por exemplo, já quase não há portageiros, substituídos por robôs, assim como há cada vez menos funcionários bancários substituídos pelos próprios clientes, que usam sistemas de homebanking). Mas também é verdade que algumas profissões têm crescido de modo notável, como, por exemplo, engenheiros electrotécnicos, programadores e analistas de dados. Tudo leva a crer que essa tendência vai continuar. Segundo um relatório do World Economic Forum, divulgado em 2018, nos próximos quatro anos a evolução das máquinas e algoritmos no mercado de trabalho terminará com 75 milhões de postos de trabalho, ao mesmo tempo que criará 133 milhões novos postos de trabalho: isto é, serão criados 58 milhões de postos de trabalho. Alguns empregos que hoje existem deixarão simplesmente de existir, mas ao mesmo tempo serão criados novos empregos, alguns deles completamente novos. Um relatório relativo a Portugal da responsabilidade da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), do McKinsey Global Institute e da Nova School of Business and Economics (Nova SBE), anunciado em 2019, a situação entre nós não é tão optimista, por ser grande o nosso potencial de automatização de postos de trabalho: portugal perderá até 2030 até 1,1 milhões de postos de trabalhos, apenas sendo criados nesse período entre 600 mil e 1,1 milhões.
A informatização e robotização em curso, potenciada
muito particularmente pelos algoritmos de IA ,colocam novas questões sociais sensíveis
que se somam às anteriores sobre mercado de trabalho e a formação profissional,
às quais a economia e a política serão obrigadas a responder. Por exemplo: Será
sustentável o sistema de segurança social que está montado em países como o
nosso? Fará, por exemplo, sentido taxar robôs, para além de taxar seres humanos?
Permitirão os novos processos um acréscimo de riqueza suficiente para assegurar
a todos um rendimento mínimo garantido? E que farão as pessoas sem trabalho?
Não temos hoje boas respostas para elas, mas sobre o futuro do trabalho
podemos dizer alguma coisa. Uma vez que as tarefas de rotina são as mais fáceis
de automatizar, parece claro que o papel humano será mais de criação e menos de
execução rotineira. Uma máquina aperta melhor muitas porcas do que um operário como
o Charlot em “Tempos Difíceis”. Como os sistemas serão cada vez mais complexos,
a criatividade humana revelar-se-á cada vez mais necessária nos tempos que
aí vêm. As pessoas mais criativas serão evidentemente as vencedoras, o que ao
fim e ao cabo não é nada de novo, pois temos visto isso mesmo ao longo da
história. E, uma vez que a criatividade necessita de um terreno sólido para
desabrochar, uma preparação dada por uma escola superior revelar-se-á cada vez
mais necessária. Também aqui não há nada de novo: a Revolução Industrial
conduziu à massificação da escola, primeiro primária e depois secundária e a
moderna sociedade do conhecimento tem vindo a valorizar o papel do ensino
superior, que entre nós se divide num sistema universitário e num sistema
politécnico (que, por vezes, se sobrepõem, criando ambiguidades). A
qualificação será cada vez mais importante, se olharmos para a lista de perfis
profissionais que os estudiosos do futuro entendem como necessários: por
exemplo, especialistas em IA e em transformação digital, em automação e em
redes, em dados e segurança informática, em
media sociais e comércio electrónico, em marketing digital e interacções homem-máquina, etc. Certas
profissões já existentes continuarão seguras, como, por exemplo, gestores, profissionais
de marketing e vendas, avaliadores de
riscos, cientistas e engenheiros, etc. Os jovens precisarão de uma formação
inicial mais longa, que proporcione conhecimentos e treine capacidades, ao
passo que a população activa precisará de formação contínua, que lhes confira a
formação conveniente para lidar com as inevitáveis mudanças. O que temos garantido é a mudança. E quanto mais
soubermos sobre o que está em causa, melhor nos poderemos preparar para
participar dela.
E os professores? Sou professor e tenho-me interrogado sobre o futuro da
minha profissão. Estou em crer que a profissão de professor, que é
intermediador das aprendizagens pessoais, não é das que está mais em risco. Nos
anos 80 e 90, perante alguns avanços da IA, houve quem julgasse que o ensino
futuro viesse todo ele a ser realizado por computador, mas isso não aconteceu
até hoje nem vai previsivelmente acontecer. Quer dizer, o ensino formal, seja
inicial seja ao longo da vida, continua a basear-se no contacto humano, embora
se tenha de reconhecer que boa parte do ensino informal passe hoje pela
Internet. A informação já está e estará cada vez mais acessível em todo o lado
e há que saber não apenas recolhê-la, mas sobretudo interpretá-la para poder
tomar as melhores decisões em todos os casos reais que surjam. Há elementos
pessoais, e sociais nos processos de aprendizagem. Como devem as escolas, os
professores, os currículos adaptar-se às novas exigências? Na reflexão sobre o
futuro da escola, convém não esquecer o essencial. É preciso acima de tudo
assegurar que o mundo permaneça humano, o que significa que a sociedade não
deverá nunca ver as tecnologias como um fim, mas sim como um meio para uma vida
melhor.
1 comentário:
Muito interessante! O mundo da inteligência artificial tem mudado muitos aspetos da nossa vida. No âmbito da logística, as aplicações de localização fazem a vida dos trabalhadores muito mais fácil. Obrigado pelo post.
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