Meu artigo no "Diário de Coimbra" de ontem:
Embora
o magazine Ticket que anuncia espectáculos
em todo o país seja dominado por eventos em Lisboa e Porto, também se encontram
eventos noutras cidades. Mas não se encontra nada que tenha lugar no Convento
de S. Francisco em Coimbra, um equipamento que custou 42 milhões de euros e que
devia ter projecção nacional. Planeado para ser um Centro de Congressos
internacional está a falhar esse objectivo, pois a Câmara Municipal, detentora
do equipamento, não conseguiu atrair congressos suficientes para garantir a
necessária sustentabilidade (uma andorinha de um congresso de saúde não faz a Primavera!).
Planeado também para ser um Centro de Cultura nacional, também tem falhado esse
outro objectivo pois não existe uma programação coerente nem uma gestão
autónoma que a permita concretizar. Pretendendo rivalizar com a Casa da Música ou
com o Centro Cultural de Belém está muito longe dos padrões de excelência
desses centros. Nem sequer chega ao Centro de Artes e Espectáculos da Figueira
da Foz. Recebo os programas desses centros culturais mas nunca recebi
informação nenhuma de S. Francisco. Consultado o respectivo website, encontro coisas avulsas, sem
suficiente qualidade e acima de tudo sem qualquer coerência. A programação é o
que calha, quando calha. Há muitos dias, demasiados dias, em que não calha
nada. Valha-nos S. Francisco!
Vale
mais a pena deslocar-me à Casa da Música ou ao Centro Cultural de Belém, ou,
mais perto, ao Centro de Artes e Espectáculos do que ao Convento de S.
Francisco pois esses centros têm uma programação regular de qualidade, que é divulgada
com antecedência. Não percebo por que é que S. Francisco não tem um prospecto semelhante
aos que recebo do Porto ou de Lisboa, ou da Figueira da Foz. O problema pode
ser da gestão. Têm sido feitos contratos por ajuste directo e a prazo com pessoas
do agrado político, que fazem sugestões. Mas tudo tem de ser aprovado pelo Presidente
da Câmara. Os preços dos bilhetes são aprovados em reunião camarária, mesmo a posteriori. A cidade, os seus agentes
e meios culturais, vivem desligados de S. Francisco. Perguntei já a várias
pessoas da área da cultura de Coimbra e nunca ninguém me disse ter sido ouvido
sobre S. Francisco. Perguntei a outras pessoas da mesma área em Lisboa e Porto,
mas esses nem sequer sabiam o que era S. Francisco. Está à vista o seu fracasso
não só como Centro de Congressos internacional mas também como Centro de Cultura
nacional. Se falha nos congressos e na cultura para que serve? Parece que tem
lá havido reuniões políticas: não sei se o aluguer foi pago, pois as contas de
S. Francisco estão nos segredos dos deuses.
Coimbra
tem, de facto um belo equipamento da autoria de um prestigiado arquitecto, mas
é como se o não tivesse pois não o valoriza. O objectivo de S. Francisco é
indefinido (as frases sobre a missão no website
são absolutamente vazias). O modelo de gestão também não foi definido. E o
elefante branco vai consumindo elevados recursos da Câmara, quer dizer de nós
todos, sem que haja um benefício claro para todos. Coimbra continua uma cidade com
história e património, mas sem uma identidade cultural que ligue o antigo e o
moderno.
A
última noticia sobre S. Francisco é que a Câmara de Coimbra quer lá colocar a
colecção de fotografia do Novo Banco. O governo, de posse de um grande espólio
fotográfico e sem saber o que fazer com ele, quer emprestá-lo à Câmara e esta,
sem pensar, estendeu logo a mão ávida da esmola. Com certeza que a cidade, que tem
a rica tradição dos Encontros de Fotografia realizados entre 1980 e 2000, pode
exibir esse espólio, atraindo público da cidade e de fora. Mas o Convento de S.
Francisco não foi feito para museu de fotografia e não tem as condições
técnicas adequadas. A colecção nem sequer lá cabe. Para caber uma parte as
mudanças estruturais seriam demasiado caras. De resto, a Câmara faria mal em
gastar o seu dinheiro nisso quando não consegue manter a valiosa colecção dos
Encontros de Fotografia, que está armazenado num exíguo espaço do Centro de
Artes Visuais (CAV) sem ar condicionado e à mercê de infiltrações de água.
Parece que o Secretário de Estado da Cultura, quando já sabia que o CAV estava
condenado em primeira instância, foi visitá-lo como se nada soubesse. Ainda não
se sabe se lhe vai dar os meios necessários para ele que a colecção possa ser
não só mantida como mostrada.
Será
que a Câmara vai pedir ao CAV para fazer a curadoria da mostra do Novo Banco?
Será decerto necessário alguém competente que saiba organizar as fotografias do
Novo Banco numa rede de salas que abranja a cidade e a universidade, como
fizeram os Encontros de Fotografia e está agora fazer a Estação Imagem, uma
iniciativa que desfruta do louvável apoio da Câmara de Coimbra. A Câmara tem
feito tanta coisa mal na cultura que temos de lançar um foguete quando faz uma
bem. Um foguete? Meio, pois “esqueceu-se” de associar os média locais…
*Professor
da Universidade de Coimbra
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