"Quando se dá uma bolacha a um rato, logo a seguir ele pede um copo de leite".
Provérbio chinês
Transcrevo uma destacada notícia de jornal sobre uma solene cerimónia
académica, presidida pela secretária de
Estado do Turismo, alusiva à criação de
uma licenciatura de Gastronomia na Escola Superior de Educação de Coimbra:
“Rui Antunes,
presidente do IPC, voltou ontem a sublinhar a necessidade de se acabar com o sistema binário de Ensino Superior,
preconizando a união do sistema num quadro pluri-institucional, em que cada
instituição ‘escolha a que se adapta melhor ao seu processo educativo’. Ao
rejeitar que o Politécnico queira ser Universidade reafirmou que apenas
pretende um enquadramento jurídico
igual. O actual sistema binário causa,
segundo o docente, prejuízo ao ensino politécnico, nomeadamente, na formação do
3.º ciclo [doutoramentos] e com entraves à investigação. O movimento
pela alteração do sistema binário inclui os institutos politécnicos de Lisboa e
Porto. O projecto educativo politécnico será sempre diferenciado do universitário, disse”
(“Diário de Coimbra”, 14/10/2016).
Ou seja, Rui Antunes, um tanto a latere, talvez porque “imaginamos
o que desejamos, queremos o que imaginamos e, por fim, acreditamos no que
queremos” (Bernard Shaw), aproveitou
a ocasião para, em linguagem popular, “voltar à vaca fria”, criticando o sistema binário de ensino
superior (universitário e politécnico), em arrazoado em que mete os pés pelas
mãos e as mãos pelos pés, pretendendo, ipso
facto, acabar com o sistema binário
de ensino superior defendendo, em causa própria, uma terceira
via de ensino superior: um ensino
híbrido do tipo centauro, metade universidade, metade politécnico.
Debrucemo-nos, agora e ainda que resumidamente, sobre algumas
passagens do discurso formal de Rui Antunes:
- Começo por voltar a citar o final da notícia jornalística
supracitada: “O movimento pela alteração
do sistema binário inclui os institutos politécnicos de Lisboa e Porto”.
Nela não é referido o Instituto Politécnico de Coimbra, referência
desnecessária porque implícita: “Quem parte
e reparte e não fica com a melhor parte ou é tolo ou não sabe da arte”! (provérbio
popular).
- Um quadro pluri-istitucional, em que cada instituição “escolha a que se adapta melhor ao seu
processo educativo”. Ou seja, uma espécie
de auto-gestão para um ensino politécnico à
la carte, em imitação de universidade em que os cursos criados proliferam
como cogumelos em terreno húmido.
- Como se pode aceitar a rejeição de que o Politécnico seja universidade
preconizando, em simultâneo, um
enquadramento jurídico igual? Ou seja, os deveres para a Universidade (acesso
mais difícil, por exemplo ) e os direitos para os politécnicos (vantagem nos
concursos para professores do 2.º ciclo do ensino básico, outro exemplo)?
Passando, agora, ao essencial da questão, segundo Hannha Arendt, “a irreflexão parece ser uma das principais características do nosso
tempo”, só irreflectidamente Rui Antunes poderá produzir a sua declaração do "Politécnico não querer ser Universidade".
Em prova documental
que desmente, esta sua peremptória declaração pública, sem apelo nem agravo, recordo a verdade dos factos, porque “a
única verdade é a realidade” (Aristóteles), trazendo, como tal, à colação o meu artigo de opinião: “Ensino Superior e doutoramentos” (“Público”,
12(/07/2016).
Nele escrevi, preto no branco:
“Anos atrás, foi
feita por Rui Antunes a seguinte
declaração: “A cidade de Coimbra só
teria a ganhar se o Instituto
Politécnico de Coimbra continuasse a fazer o que tem feito até aqui com o nome de Universidade Nova de
Coimbra!” (“Diário de Coimbra”, 10/11/2005). Quem sabe se por ter dado pelo plágio
relativamente ao nome de Universidade
Nova de Lisboa, volta ele à carga propondo, agora, lato sensu, a crisma
de ensino politécnico para ‘Universidade de Ciências Aplicadas” (“Diário as
Beiras”, 05/08//2013).
Caro leitor, o que
aqui escrevo “é um repositório de
factos, testemunho do passado, exemplo do presente, advertência do futuro”
(Miguel Cervantes). Um futuro que não pode estar hipotecado a um presente em
que o ensino politécnico não preenche as vagas que lhe são destinadas confluindo, esta situação,
consequentemente, com uma hemorragia dos dinheiros públicos.
E isto, através da pretensa igualização de um ensino politécnico de menor exigência relativamente a um ensino de secular tradição ministrado em claustros universitários que vivem, por vezes, afogados num mare magnum de carências orçamentais para fazer face a uma sobrevivência digna e dignificante. Tudo somado, resume-se tudo isto a uma questão de bom senso e, principalmente, de boa utilização dos dinheiros públicos em época de vacas magras!
E isto, através da pretensa igualização de um ensino politécnico de menor exigência relativamente a um ensino de secular tradição ministrado em claustros universitários que vivem, por vezes, afogados num mare magnum de carências orçamentais para fazer face a uma sobrevivência digna e dignificante. Tudo somado, resume-se tudo isto a uma questão de bom senso e, principalmente, de boa utilização dos dinheiros públicos em época de vacas magras!
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