quinta-feira, 20 de novembro de 2014

DESASTRES NATURAIS


Trancrevemos um artigo de opinião de Victor Hugo Forjaz, Professor de Vulcanologia, escrito a propósito do dia 13 de 0utubro, Dia dos Desastres Naturais: 

1- Ao longo de cada ano existe uma já longa lista de "dias comemorativos", desde  o Dia Mundial das Zonas Húmidas, a 2 de Fevereiro ao Dia Internacional das Montanhas, a 11 de Dezembro, passando pelo Dia Internacional da Literacia, a 8 de Setembro. O Dia dos Desastres Naturais deveria ser o mais importante dos Açores,  dado o  galopante  analfabetismo que grassa  por  todas  as  ilhas, presentemente contaminadas por um ebolante surto de  futebol  e de pirosas  "casas  dos segredos", habitadas por gente  dos mais humilhantes  habitats. Até porque "analfabetismo" é um conceito cada vez mais alargado, mais abrangente - já não basta saber ler e escrever, como no tempo do Doutor Salaza… Nestas ilhas as variantes de analfabetismo assustam. O analfabetismo politico - acentuadamente  esquecido e desleixado - é uma dessa chagas açorianas  e pode  explicar a vergonhosa percentagem de abstenção em actos  eleitorais  fulcrais, realidade a que os partidos pouco se dedicam ou aplicam receita. Porém o dia mundial  comemorativo mais curioso é o que se marcou para 13 de Outubro, porque é móvel como certas festas religiosas, ou seja, deve ser evocado num combinado dia  de Outubro, chamando-se  Como a lista anual de  "dias"  vai engrossando ano após ano, os dias nacionais, europeus, internacionais e mundiais banalizaram-se e deixaram de agregar a pedagogia que os  aureolava. Enfim - é a vida! (como dizia o tal senhor).
2- No caso dos Açores os dias comemorativos são poucos, secos de ideias e  pouco credíveis. Salvo os que, muito bem aceites, incluam ementas pesadíssimas  com coentradas sopinhas  de pão (as afamadas sopas do banco bom),  couvinhas do quintal, roxas e perfurantes  vinhaças de tintol  americano e arroz doce peganhento de canela  - tudo de borla e   repetido. Por esse motivo, com  a crise eurótica (de euros) por que passamos (nem todos…), os dias comemorativos andam muito esquecidos. Quem quer comemorar, à escala de arquipélago, para que todos se sintam juntos e menos isolados, o Dia da Poesia, o Dia do Livro,o Dia do Clima, o Dia Nacional da Água, o Dia do Animal, o Dia do Voluntário? Este  último - um dos mais importantes - é uma aflição porque vivemos em terra onde o voluntariado cada vez mais escasseia ou se deturpa. Desgraçados os voluntários que nos hospitais, nos grupos de auxílio a pobres e desprotegidos ainda se amarram, por espírito de solidariedade, a causas! Nestas ilhas as causas são cada vez menores e  mais perseguidas! Mas são cada vez mais numerosos  os que exigem que a Região-Estado tudo deve  fazer… e pagar. ´

Mas - Como  o tema de hoje é específico, passemos ao dito - porque interessa comemorar as  Reduções dos Desastres Naturais?
3 -  Há muitos anos  que me dedico a esse tema. Deambulei  por esse mundo dos desastres sísmicos, vulcânicos e de deslizamentos (de terras, a que os geosabichões da ilha  chamam  agora de" movimentos de massa", como se fossem um banco!). Em 1984 até fui frequentar um curso internacional  do US Geological Survey,em Denver - Colorado, com uma geofísica do ex-INMG, que felizmente desapareceu.Uma vez mais integrei uma equipa  científica de apoio ao vulcão Santa Helena  e aprendi  actuações muito úteis. Mais tarde estive em Disaster City, no Texas, onde participei em diversas operações de socorro em simulacro sísmico e vulcânico. Também estive em Itália a aprender a arrefecer lavas do Etna e a encaminhar a fase fluida das lavas vermelhas  para topografias adequadas. Para meu treino pessoal, incluindo no Japão, deliciei-me com esses conhecimentos. Para a Região a minha evidente experiência  pouco serviu porque entrei na lista negra do Dr. Ricardo Barros, eterno e verdadeiro chefe da Protecção Civil dos Açores e dá em diante - kaput! - Deixei a Universidade aos 70 anos sem um simples adeus do reitor De Menezes  e também não disseram   good buy, até por  educação de berço ou  mera e súbita delicadeza, os  inefáveis  docentes que meti  no Departamento de Geociências  quando de mim precisaram. Alguns, há anos, eram  apenas "militantes" das ruas da cidade, passeantes das calçadas de basalto polido. Agora são importantissimos  políticos da governança. Não estou arrependido dessas  bondades - apenas concluí  que não soube escolher melhor. Amen!
4- Bem gostaria, neste dia comemorativo, de elogiar  as diversas equipas anti-desastres naturais do arquipélago. Mas não o devo nem posso, apenas para ser simpático. Os nossos bombeiros são bestiais? São - mas precisam de experiência em coisas que  irão surgir. Assim,  de facto, sendo a Islândia  tão aparentada e tão próxima, a poucas horas de voo e estando a vulcão fissural Bardarbunga em plena actividade, durante meses veranis, quem, dirigente (da Protecção Civil), se deslocou, que se saiba, aquela área? Para observar, para aprender, para conhecer materiais, estratégias  e até erros? A actuação de bombeiros, de forças de segurança e de militares é essencial em  todos os cenários de desastre  natural.  No cenário sísmico, um dos agentes  muito perturbadores, com as poeiras e o caos  destrutivo, é a chuva  . No cenário vulcânico, totalmente diferente, os agentes parasitas e incómodos são bem maiores, caso de gases, de cinzas, de ventos, de enxurradas  (além da sismicidade acompanhante). O que sabem as Protecções Civis Regional e Municipais sobre o Bardarbunga da Islândia ("gémeo" do Complexo dos Picos de S. Miguel, dos Sistemas Fissurais da Terceira, da Graciosa, do Pico, de S. Jorge e do Faial)? O que aparece no youtube ou são remetidos pelos amigos?  E sobre as mortes  recentes  do  Otake do Japão , com similitudes com o Vulcão do Fogo de S. Miguel?

O Dia das Reduções das Catástrofes Naturais não se destina a meter medo. Destina-se também a advertir. E os geólogos, cada um com a respectivas especialidade, competência  e entusiasmo, não devem prescindir do seu papel social, afastando as teias do sensacionalismo e das querelas pessoais. E os senhores do Governo, já que gastam tanto dinheiro em festivais e festivalecos, sem retorno de qualquer tipo, pelo menos que apoiem mais a prevenção de desastres  naturais. Incluindo a tal cultura de protecção civil, tão badalada  e útil.  Não se zanguem com este reformadinho....            

Amen!

Victor Hugo Forjaz, geólogo  --   vforjazovga@gmail.com



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