Minha crónica no Público de hoje:
Regularmente tenho apresentado
neste espaço algumas sugestões de livros para férias. Com a mesma regularidade
tenho-me pronunciado contra a ideia feita de que, nesta época, o cérebro só
absorve literatura light. Pelo
contrário, quando temos mais tempo para ler, podemos descobrir mundos
desconhecidos (enfatizo a palavra “descobrir”, agora maldita), dando novos
mundos a nós mesmos. Alinho aqui alguns títulos, todas eles edições recentes, por
ordem alfabética do apelido do autor.
- André, João Paulo, Poções e Paixões. Química e Ópera,
Gradiva. Este livro, ricamente ilustrado, de um professor de Química da
Universidade do Minho e entusiasta da ópera, é uma obra singular que reúne as
“duas culturas”, ao relacionar de uma maneira assaz cativante duas áreas tão aparentemente
distantes como a química e a ópera. Com sabedoria e elegância, o autor,
revela-nos que há muita química na ópera.
- Camarneiro, Nuno, O fogo será a tua casa, Dom Quixote.
Tenho acompanhado a obra do autor, engenheiro físico que foi meu aluno na Universidade
de Coimbra. Depois de ter ganho o prémio Leya de 2012 (Debaixo de algum céu), escreveu a colecção de contos Se eu fosse chão e agora faz uma
incursão literária pelo Médio Oriente, onde a guerra tudo incendeia. Aqui
descreve-se o drama de um grupo de reféns, de vários países, nas mãos de
fundamentalistas islâmicos.
- Endo, Shusaku, O Samurai, Dom Quixote. O autor é o
mesmo de O Silêncio, que conta a
odisseia de dois jesuítas portugueses no Japão no século XVII e que serviu de
guião ao filme de Martin Scorsese. Este livro, que é uma reedição, conta a aventura
de um japonês, Hasekura Tsunemaga, que, no mesmo século, chegou a Espanha via
México. Está ainda por contar em literatura a viagem de Bernardo de Kagoshima, outro
samurai japonês que se tornou jesuíta e que, 60 anos antes de Tsunemaga, foi o
primeiro japonês a chegar à Europa. Descobriu-nos, portanto.
- Magalhães, Gabriel, Os Crimes inocentes, Planeta. Do autor,
professor de Literatura na Universidade da Beira Interior, li com muito gosto o
Como Sobreviver a Portugal continuando a
ser português (um original ensaio sobre a portugalidade) e Restaurante Canibal (uma divertida
sátira). E, por isso, está no meu saco de férias o último romance dele, que
parte de um crime perpetrado no Museu dos Coches, que vai ser deslindado por
uma filha de emigrantes que vive de empregos precários. Juntando cultura e
política, humor e horror, o livro promete…
- Magdalena, Carlos, O Messias das plantas. Aventuras em busca das espécies mais raras
do mundo, Bizâncio. Magdalena é horticultor nos Jardins Botânicos Reais de
Kew, perto de Londres, um dos maiores e melhores jardins botânicos do mundo.
Tem dedicado a sua vida a salvar plantas em vias de extinção, procurando-as nos
mais remotos cantos do planeta. Um volume imprescindível para quem se interessa
pelo prodigioso mundo vegetal.
- Reeves, Hubert, O Banco do tempo que passa. Meditações
Cósmicas. Gradiva. O conhecido astrofísico e divulgador de ciência
canadiano, que escreveu Um pouco mais de
azul e vários outros bons livros, dá-nos neste livro uma súmula do seu
pensamento científico e filosófico, onde cabem tanto o fascínio pelo imensíssimo
cosmos como o alerta pela necessidade de defesa da biodiversidade na Terra. A
Gradiva publicou também recentemente duas bandas desenhadas de Reeves, ambas
desenhadas por Daniel Casanave.
- Verney, Luís António, O Verdadeiro Método de Estudar, Círculo
de Leitores (coordenação, introdução e notas de Adelino Cardoso). Esta é uma
das obras maiores da cultura nacional, por ter sido o primeiro tratado
pedagógico escrito na nossa língua. Quando
saiu, em 1746, suscitou uma enorme polémica, entre “antigos” e “modernos,”
tendo mais tarde inspirado a Reforma Pombalina da Universidade. Obra ecléctica,
trata tanto da poética e da retórica como da física e da química, é o vol. 27
da colecção Obras Pioneiras da Cultura
Portuguesa, coordenada por José Eduardo Franco e por mim, que reúne o “ADN
da cultura nacional.” Já saíram 10 volumes, alguns deles sobre as descobertas
marítimas dos portugueses.
Boas leituras. Boas férias!
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