“No mundo nada é verdade ou mentira: tudo depende do
cristal com que se mira” (Ramón de Campoamor)
Antes de responder ao comentário
de José Fontes, ao meu post de ontem, “Medina Carreira: homenagem que lhe é devida”, farei, como
que a modos preambular, duas citações separadas no tempo:
1.“Quando se olha com antipatia para o cisne branco até o cisne branco nos
parece preto; quando se olha com simpatia para o rato preto até o rato preto
nos parece branco” (Padre António Vieira).
2.“Os psicólogos sociais chamam erro de atribuição à tendência humana
para desacreditarem um argumento apenas por causa das características que
atribuem ao seu autor” (Rui Tavares, “Público”, 08/03/2007).
Ou seja, é indissociável
o prisma com se discutem os assuntos com a isenção que merecem, daí eu dar um
desconto generoso ao remoque em que são
metidos no mesmo saco do “abaixo assinado
(que para já tem apenas a assinatura
pública de José Fontes) todos “os Ruis
Baptistas deste mundo. Chamem-se eles Ruis Henriques ou outros nomes” que nada
têm a ver com este assunto.
Avesso a um diz-tu-direi- eu, julgo interpretarmos em leituras diferentes, a intervenção do deputado
Proença Duarte na Assembleia Nacional (não confundir com Assembleia da
República). Assembleia da República que
para prover à falta de operários especializados teve a peregrina ideia de sancionar os actuais
cursos “superiores” com a duração de dois anos (TESP) - medida a exemplo da génese dos actuais cursos do ensino politécnico, com
a duração inicial de dois anos, que ora
choram barba e ranho para, depois de licenciaturas e mestrados, outorgarem doutoramentos, - em afronta aos antigos cursos “inferiores” das escolas industriais
com a duração de 5 anos e uma forte componente
teoria-prática traduzida em oficinas altamente apetrechadas.
Dando de barato, a sinceridade com que descreve a sua péssima docência na
carreira docente do ensino técnico que não lhe deu a minha “visão idílica ”
(sic.) deste ensino, a sua extinção, como diria Pessoa, não passou de “um cadáver adiado que procria” abortos
em barrigas de aluguer de um ensino superior como porta de cavalo, a exemplo
das “Novas Oportunidades”, de acesso a licenciaturas ensino superior. Ou
mesmo exigente ensino superior universitário que “exporta”
para o estrangeiro diplomados que exemplifica. No seu comentário, com uma elite de engenheiros, cientistas,
economistas, etc.
Eu, por meu lado, reporto-me, a uma minha recordada com saudade experiência
deste tipo de ensino iniciado em finais dos anos 50 em confronto com a sua má vivência
pessoal de um ensino situado em inícios dos anos 70, depois de transvertido de reformas e
contra-reformas. Contas feitas, entretanto, muitos assentos dos cadeirões da 25
de Outubro serviram de berço ao fenómeno da “diplomocracia”, para utilizar uma
critica de António José Saraiva, que deu azo a que neste país fosse anátema ser ministro sem um diploma universitário. E
como todos os caminhos vão dar a Roma, uns por trilhos com sangue, suor e
lágrimas, outros em arraiais de festança e regabofe, assiste-se a licenciaturas, em regresso de citação a António
José Saraiva, "não para ter mais conhecimento ou para se ser mais esclarecidos, mas para
não ser menos que os outros. Não é a igualdade da cultura que se busca, mas a
igualdade de estatuto, através da posse do diploma”. E à pala de uma
maneira viciosa em que“há duas maneiras de mentir, uma é não dizer
a verdade, outra é fazer estatística” (Francisco Leite Pinto), dá-se a
conhecer ao mundo uma "Alice no país das maravilhas" em que, sem
generalizações sempre perigosas de se
fazer, se transmutam analfabetos de
ontem, em burros de hoje, parafraseando
novamente Miguel Sousa Tavares. caloroso defensor, para uns tantos, de um simples golpe de Estado de militares descontentes com a Guerra do Ultramar, para ele e outros tantos, a alvorada de um esperançoso Portugal, através da Revolução de 25 de Abril de 74.
Isso mesmo, sobre perspectivas
diferentes de um mesmo assunto, nos ensina Ortega y Gasset: “O que é a verdade? Do ponto de vista da
verdeira cultura, não é o mais importante de decidir. Cultura é, frente ao dogma,
discussão permanente”!
Na foto: fachada da antiga Escola Industrial Mouzinho de Albuquerque de Lourenço Marques.
Na foto: fachada da antiga Escola Industrial Mouzinho de Albuquerque de Lourenço Marques.
8 comentários:
O sr. Baptista lida mal com o calor. Vai daí brinda-nos sempre com estas pérolas estivais.
António Nunes
Sem intenção de retrucar com grosseria estival, apenas por associação de ideias, ocorre-me a expressão: "Deitar pérolas a porcos".
o sr. Baptista anda com algum problema de refracção no cristal que usa para mirar....
Tenha umas boas férias e aproveite para descansar.. Cumprimentos
https://es.m.wikipedia.org/wiki/Ley_Campoamor
Respondendo a Ortega, a verdade é o acontecimento. Imparcialidade é vê-lo, sem cristal. Todo o discurso é disfarce, óculos de cultura e cedência às influências e interesses.
“É a ti que eu canto, Democracia!” - Walt Whitman.
Até à ruína do ideal.
O poeta Pessoa transmuda-se em versão de Poema. Não é quem é, nem o que parece ser. É só o cristal.
F.C.
Já agora como leitura de tempo de férias e retribuindo o desejo de boas férias e os simpáticos cumprimentos que me endereçou, "contestar a ideia de um certo homem, ou defendida por outro homem, não é insultar esse mesmo homem: sabe-se isto no mundo inteiro e só se desconhece neste país. E porquê? Porque muitos dos que escrevem, berram ou declamam na nossa terra (...)andam a fingir de pessoas cultas: nunca se elevaram verdadeiramente à autêntica vida do pensamento, e ficaram ao nível do fanatismo e dos simples interesses e relações pessoais" (António Sérgio).
Obrigado pela citação que faz de Campoamor.
Obrigado pelo seu comentário.
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