quarta-feira, 12 de abril de 2017

Projectos, emprego científico e regionalização

Hoje o Público traz artigo de Samuel Silva e Teresa Firmino sobre o concurso de projectos da FCT, para o qual fiz declarações. Desenvolvo aqui opinião sobre o assunto, após consultar colegas:

Os projectos estão a ser um modo de dar emprego científico obviamente temporário. Claro que sobra menos dinheiro para a execução do projecto. Quando há colaborações que exigem missões e é necessário desenvolver/adquirir  equipamento  fica, de facto, pouco dinheiro, que pode não chegar. Além do equipamento, em grandes colaborações, por exemplo na área da física, é preciso que várias pessoas vão ao Chile ou à Argentina e isso é caro. Em projectos mais teóricos menos dinheiro talvez possa chegar, embora grandes computadores sejam caros e haja que pagar tempo de computação (um assunto em Portugal não ou mal tratado). Além disso  a política de publicação em "open access" envolve custos que entre nós não são assumidos de forma generalizada.  No último concurso muitos projectos receberam tudo ou a maior parte do que pediram e grande parte tinha pedido os 200 mil euros. Mas nos projectos anteriores tal não acontecia e geralmente havia cortes nos recursos humanos.

Daí a sensação actual de mal estar. A FCT deveria informar que percentagem dos concursos obteve aprovação com 100 mil, o novo tecto efectivo. E um estudo por áreas deveria indicar que diferentes áreas custam diferente dinheiro.

Mais em geral, não é claro quanto dinheiro vai haver para a ciência deste ano e nos próximos. Os últimos números indicam investimento de 1,3% do PIB a Europa tem de média 2,1% e tem a meta de 3% em 2020. Ora 2020 é já daqui a 2 anos. Alguém acredita que vamos duplicar o investimento em ciência em 2 anos? O "roadmap" devia ser indicado claramente pelo governo, uma vez que se trata de uma  opção política. Vamos continuar a crescer até à média europeia ou não? Estamos a falar de percentagem da riqueza existente e não de valores absolutos, que é outra coisa.

Pior outro lado, a "regionalização" da ciência  é um  grande problema. Nem os meus  colegas nem eu conseguem ver como se vai incluir estrelas de neutrões ou  matéria escura tendo em contas a prioridades da região centro?  Teremos que distorcer o projecto salientando alguma coisa regional dos grandes problemas do universo? Tanto quanto sabemos a região centro não tem mais matéria escura do que as outras.... Poderemos ter a certeza que, verificando-se que um certo bom projecto, que não se encaixa nas prioridades da região centro, será financiado pelo orçamento do estado? Parece que a região de  Lisboa tem investigação científica como prioridade mas não recebe dinheiro europeu. Então como vai ser financiado um projecto dessa região? Terá orçamento do estado certo? E então as outras regiões? Ficamos com a ideia que Lisboa fica com a maior fatia do orçamento do Estado, agravando a excessiva centralização do país. O país é muito desigual e a "regionalização" das ciências nas comissões de coordenação regionais está longe de resolver o problema . Não existe lá competência para avaliação, por exemplo. E, por vezes, subordina-se a ciência à indústria , porque os encarregados da burocracia nem sequer percebem o que é e como funciona  a ciência e que o impacto dela na indústria pode não ser imediato.

Os formulários do Portugal 2020 são um inferno. Dizem-me que o "Balcão2020" é uma grande trapalhada e é preciso uma grande coragem para entrar naquilo. Eu uso a minha coragem para outras coisas e evito.

Toda esta trapalhada parece ser um problema herdado (o anterior governo não soube negociar o acordo de parceria com a Europa) mas o actual governo já teve mais do que tempo para resolver

a herança. E não a resolveu.

Sem comentários:

O BRASIL JUNTA-SE AOS PAÍSES QUE PROÍBEM OU RESTRINGEM OS TELEMÓVEIS NA SALA DE AULA E NA ESCOLA

A notícia é da Agência Lusa. Encontrei-a no jornal Expresso (ver aqui ). É, felizmente, quase igual a outras que temos registado no De Rerum...